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          Cathy Reyes estava atendendo a alguns problemas na recepção do hospital quando uma ambulância parou cantando os pneus debaixo da marquise do hospital, as sirenes de outra logo atrás. Largando tudo, a mulher soltou os papéis na mesa e correu para encontrar o motorista do veículo enquanto segurava a porta para a maca passar.

— O quê aconteceu?

— Colisão frontal entre dois carros, um deles estava correndo a mais de cem quilômetros por hora, três adolescentes feridos dois em estado grave. - O motorista disse sem fôlego enquanto a primeira vítima era apressada pelas portas.

          Os cabelos platinados cobertos de sangue e a face, mesmo que desfigurada, Cathy seria capaz de reconhecer em qualquer lugar. Como não reconhecer a menina que tinha praticamente morado na sua casa por um verão inteiro? Se Ellen estava aqui... O coração da mulher acelerou e suas pernas fraquejaram, mente voando direto para a pior situação possível.

          E se minha filha morrer?

         Eu não posso perder outra pessoa.

         Não, não, não, não.

         A crise interna da mulher foi interrompida por socorristas gritando ordens e correndo com duas macas para dentro da sala de emergência. Seu modo "enfermeira focada" tomou conta, o pager que lhe avisaria caso houvesse complicações com Elise preso à cintura da sua calça de uniforme. A mulher parecia ter encontrado uma paz interior e seu estado de saúde tinha miraculosamente se estabilizado dando à Cathy liberdade para focar no problema na sua frente.

— Qual é a situação? – A mulher se sentiu aliviada ao perceber que nenhuma das vítimas era sua filha.

         O menino na cama tinha a cabeça enfaixada e tanto sangue nas roupas que era difícil saber onde exatamente acabava tecido e começava pele, pele essa que parecia ter um tom bronzeado saudável mas agora empalidecia devido à perda de sangue. Se tivesse prestado atenção, a mulher teria percebido quem era a pessoa na sua frente ao invés disso ela prosseguiu com os procedimentos de rotina.

— Chame o Doutor Teale. - Ela disse para uma das colegas. - E levem ele para a área de isolamento, os ferimentos precisam ser esterilizados rápido.

         Naquele momento, foi como se três linhas do tempo se separassem naquele pequeno espaço. A primeira seguia o corpo sem vida de Ellen Mariana Danvers até o necrotério, onde seria limpa e arrumada para aguardar reconhecimento. O carro em que ela estava, na velocidade em que andava, zerou as chances de sobrevivência da menina. Assim que a colisão aconteceu, ela bateu no lado do motorista e capotou duas vezes antes de parar quase uma quadra depois, a frente do veículo transformada em um purê de metal. Em seus últimos momentos, tudo no que ela conseguiu pensar foram duas palavras: Sinto muito.

         Quando Lee chegou desesperado no hospital atrás de sua filha, não havia que contivesse o homem. Ele se livrou de Philippa, que tinha ido para seu apartamento, e correu até a sala em que sua filha tinha fechado os olhos pela última vez. Assim que viu ela, pele branca como uma folha de papel, deixando os muitos ferimentos em seu corpo em evidência, o homem chorou. Um homem feito, de quase cinquenta anos, soluçou como uma criança separada à força de sua mãe. Ele pensou em todas as coisas que não tinha dito, todos os eu te amos subentendidos nos gritos cada vez que tinham que se mudar novamente. Ele pensou em como ele a segurou depois de sua briga com Lana e em como nunca mais poderia fazer isso.

— Essa é sua filha, senhor Danvers? – O legista perguntou, do outro lado da janela transparente.

         O homem respirou fundo para se recompor e respondeu.

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