Desde tempos imemoriais os homens têm manifestado ansiedade por saber qual
é a fonte de toda energia, a causa de todos os seres e de toda mudança, a
substância última da qual tudo deriva e que é a causa de si mesmo. A ciência é
mais modesta. Tem consciência dos limites da mente humana e da sua busca de
conhecimento. Procura investigar cada fenômeno até as suas causas. Mas
compreende que esses esforços esbarram inevitavelmente em muros
intransponíveis. Existem fenômenos que não podem ser analisados nem ter sua
origem rastreada até outros fenômenos. Estes são os dados irredutíveis. O progresso da pesquisa científica pode conseguir demonstrar que algo ate então
considerado como um dado básico pode ser subdividido em componentes. Mas
haverá sempre alguns fenômenos irredutíveis, indivisíveis, algum dado irredutível.
O monismo ensina que existe apenas uma substância básica; o dualismo diz que
existem duas; o pluralismo, que existem muitas. Não tem sentido discutir tais
questões. São meras disputas metafísicas insolúveis. O presente estado do nosso
conhecimento não nos proporciona os meios de resolvê-las com uma explicação
que um homem razoável considerasse satisfatória.
O monismo materialista afirma que vontades e pensamentos humanos são o
produto do funcionamento dos órgãos, das células do cérebro e dos nervos. O
pensamento, a vontade e a ação são produzidos apenas por processos materiais
que um dia serão completamente explicados pela investigação no campo da física
ou da química. Essa também é uma hipótese metafísica, embora seus adeptos a
considerem como uma verdade científica inegável e inabalável.
Várias doutrinas têm sido formuladas para explicar a relação entre corpo e mente.
São meras conjecturas sem qualquer referência a fatos reais. Tudo o que se pode
afirmar com certeza é que existem relações entre processos mentais e fisiológicos.
Quanto à natureza e ao funcionamento desta conexão, sabemos muito pouco, se é
que sabemos alguma coisa.
Julgamentos concretos de valor e ações humanas definidas não são passíveis de
maiores análises. Podemos honestamente supor ou acreditar que sejam
inteiramente dependentes de (ou condicionados por) suas causas. Mas, uma vez
que não sabemos como fatos exteriores – físicos ou fisiológicos – produzem na
mente humana pensamentos e vontades definidas que resultam em atos concretos,
temos de enfrentar um insuperável dualismo metodológico. No estado atual de
nosso conhecimento, os postulados fundamentais do positivismo, do monismo e do
panfisicalismo são meros postulados metafísicos, desprovidos de qualquer base
científica, sem sentido e sem utilidade na pesquisa científica. A razão e a
experiência nos mostram dois mundos diferentes: o mundo exterior dos fenômenos
físicos, químicos e fisiológicos e o mundo interior do pensamento, do sentimento,
do julgamento de valor e da ação propositada. Até onde sabemos hoje, nenhuma
ponte liga esses dois mundos. Idênticos eventos exteriores resultam, às vezes, em
respostas humanas diferentes, enquanto que eventos exteriores diferentes
produzem, às vezes, a mesma resposta humana. Não sabemos por quê.
Em face desta realidade, não podemos deixar de apontar a falta de bom senso
dos postulados essenciais do monismo e do materialismo. Podemos acreditar ou
não que as ciências naturais conseguirão um dia explicar a produção de ideias
definidas, julgamentos de valor e ações, da mesma maneira como explicam a
produção de um composto químico: o resultado necessário e inevitável de certa
combinação de elementos. Até que chegue esse dia, somos obrigados a concordar com o dualismo metodológico.
Ação humana é um dos instrumentos que promovem mudança. É um elemento de
atividade e transformação cósmica. Portanto, é um tema legítimo de investigação
científica. Como – pelo menos nas condições atuais – não pode ser rastreada até
suas origens, tem de ser considerada como um dado irredutível e como tal deve ser
estudada.
É verdade que as mudanças produzidas pela ação humana são insignificantes
quando comparadas com a ação das poderosas forças cósmicas. Do ponto de vista
da eternidade e do universo infinito, o homem é um grão infinitesimal. Mas, para o
homem, a ação humana e suas vicissitudes são a coisa real. Ação é a essência de
sua natureza e de sua existência, seu meio de preservar a vida e de se elevar
acima do nível de animais e plantas. Por mais perecível e evanescente que todo
esforço humano possa ser, para o homem e para sua ciência é de fundamental
importância.
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A ação humana- Ludwig Von Mises
RandomMenos Marx, por favor. Aproveite a leitura, em breve mais bons livros. Os capítulos do livro tem tópicos muito grandes, por isso dei um capítulo à cada um. Só para os capítulos não ficarem muito grandes, com os tópicos inclusos. Notas de rodapé est...