Mais um dia finalmente havia chegado a Le’Roque. A cidade lentamente ia despertando para mais um daqueles dias frios de invernos. Os primeiros a darem um bom dia ao frio congelante eram os animais pequenos que acordavam com os primeiros raios de luz, apesar de não haver sol forte, eles ainda assim acordavam com o Astro Rei.
Na casa de João e Madeleine de Castro as coisas estavam normais, ela acabara de acordar em mais dia nublado e frio de inverno. Celine de Castro que tinha apenas seis anos de idade ia para a escola como todas as outras crianças na parte da manhã. Porém não tinha tantos amigos, coitada. Todos tinham medo da filha dos Castros, afinal de contas ela nascerá no mesmo dia em que as brumas de névoa estavam sobre a cidade, uh… nossa fazia tanta diferença… Na verdade fazia sim.
Ela mesma não se fazia igual aos outros. Com seis anos já era a menina mais inteligente de toda a escola e bonita também. Quer dizer, vamos voltar alguns anos atrás.
Celine finamente nascera. Foi uma coisa e tanto, todos os moradores juravam que Madeleine de Castro era como uma árvore seca que nunca teria um filho, mas ela teve… teve uma menina linda de olhos verdes como os do pai e os cabelos castanhos.
Os moradores de Le’Roque vinham aos poucos dar as boas vindas a pequena menina, muitos poucos mesmo. Quase ninguém ousava se aproximar da menina que parecia um anjo, mas que nascera numa noite não muito favorável, talvez não favorável para eles, mas para ela era a noite perfeita para vir a esse mundo. Não podia haver noite mais favorável para Celine de Castro chegar ao mundo.
Ela era especial não restava duvidas aos Castros, pois com sete meses já andava e já falava de tudo.
— Ora, pois, que isso era coisa do diabo — claro que todos já acharam estranho que tão nova fizesse tal ato.
A vizinha de Madeleine, Heloise Lemos foi a primeira a visitar a criança e mais umas duas ou três mulheres do pequeno vilarejo tiveram a coragem e a audácia de visitar a recém-nascida Celine de Castro, claro que a curiosidade também falava mais alto.
Poucas semanas depois e o vilarejo inteiro de Le’Roque já soltavam a quatro ventos:
— Celine de Castro nascera com chifres na testa.
Outros iam mais longe:
— A pequena filha do Diabo… nascera também com um rabo e um couro vermelho, sua mãe a alimenta com sangue toda sexta-feira a meia noite — comentavam as pessoas.
Umas delas até jurava ter visto Celine e a mãe dançando ao redor de uma fogueira e seu pai João cantava numa língua estranha e demoníaca. Oh povo fofoqueiro.
Quando tais atos absurdos chegaram aos ouvidos de Madeleine de Castro e seu marido João, eles trataram logo de passear com a pequena Celine para provar aos moradores que sendo filha do diabo ou não, ela era perfeita.
Os pais de Celine sabiam que a menina era especial, mas não a ponto de causar tanto estardalhaço pela cidade. Mal nascera e já era alvo desse povo que não tinha nada mais para fazer.
Logo todos se aquietaram e os meses passaram voando, meses só não, anos também.
Três anos mais tarde e Celine já falava mais que a própria boca, fazia amizade com todo mundo, mas ninguém realmente fazia amizade com ela, no entanto Celine não estava nem aí, gostava mesmo era de ficar sozinha na floresta dos fundos de sua casa brincando com seu gato preto… sim… gato preto, este o qual não deixou de ser apontado como um presente infernal.
A cidade estava avançando aos poucos, antes tudo era levado de carroça, somente alguns dos mais apessoados tinham um carro na garagem, o fogão já não era mais a lenha, tinha geladeira em todas as casa. Afinal já era pleno século XX, mas a cidade gostava de manter seus costumes e levar a vida de uma pequena cidade. Uma cidade pequena, mas bem evoluída.
Com cinco anos Celine já andava por todos os lados com algumas meninas que até agiam como crianças, mas no fundo tinham era medo de Celine, afinal quantas garotas com tão pouca idade teria coragem de passar a mão em um lobo selvagem e este sequer tentar engolir ela inteira? Pois Celine o fez, numa de suas caminhadas até a beira da floresta com algumas “amigas” entre aspas porque não eram realmente amigas dela. Então um lobo enorme apareceu rosnando para as meninas que claramente gritaram escandalosas com o medo consumindo suas almas, mas no que o lobo correu na direção delas com mais quatro lobos vindos do arredor das meninas, Celine imóvel apenas observou o enorme lobo que ela sabia ser o líder e esperou. Os lobos apenas cercavam as meninas na espera da ordem do líder que parou de chofre com os olhos pregados em Celine e baixou as orelhas.
— Que coisa mais linda — disse Celine e andou até o lobo, onde passou sem medo a mão no focinho do lobo e sorriu. — Você é muito gentil, obrigado por parar antes de nos comer, prometo que na próxima você pode levar todas elas, mas hoje não.
As meninas estavam brancas como osso diante da aproximação dos lobos que passou no meio delas e seguiram o caminho junto com seu líder.
Desde então Celine não teve mais a oportunidade de sair com nenhuma das meninas. A cidade inteira soube do acontecido, mas quem acreditaria que crianças seriam poupadas da morte por uma matilha de lobos? Ninguém. Então começaram a duvidar de que as meninas só estavam inventando algo para a cidade cair de culpas novamente em quem era inocente.
Na casa dos Castros Celine sempre contava tudo ao pai e a mãe que riam sabendo de toda a verdade e não se importavam, pois sabiam que Celine sempre seria protegida pelas forças da natureza.
A noite passou a primavera chegou trazendo lindas flores a cidade que reluzia em cores lindas, especialmente na casa dos Castros, havia todo tipo de flor enfeitando o lindo jardim de Madeleine, principalmente o hibisco que Celine amava, este fechava toda a frente da casa dos Castro, formando um belo portal na entrada principal.
Celine já estava com sete anos de idade e ia para a escola na companhia do pai de carro que em seguida ia para seu trabalho.
— Comporte-se, meu anjo — dizia João de Castro ao parar em frente ao portão da escola primaria de Le’Roque.
Já Celine abriu um escancarado e belo sorriso para seu pai.
— Sempre, papai.
Com um beijo em sua fronte, João de Castro seguia seu caminho deixando a filha na escola.
Muitas crianças lindas entravam nesse mesmo horário, inclusive a filha do prefeito, Mary a filha dos Newman que era a preferida de todos. Linda de olhos azuis, cabelos louros e lisos.
— Nossa como é linda a filha dos Newman — dizia todo o povo daquela cidade inóspita.
Povinho mais puxa saco. Eles não tinham nada mais para fazer, afinal só adulavam a menina, pois o senhor Newman era o prefeito dali. Ou seja, apesar da beleza incontestável de Mary Newman, o resto era só um bando de interesseiros buscando cargos e privilégios diante do homem mais poderoso de Le’Roque.
Madeleine de Castro estava no Jardim quando sua filha chegou saltitante adentrando pelo caminho de pedras cinza. Um caminho que o Senhor Castro fez especialmente para ela que sempre chegava correndo.
E Claro que Madeleine lhe recebeu de braços abertos com um lindo sorriso no rosto.
— Meu anjo — ela dizia. — Foi bem na aula de hoje? — Perguntou Madeleine a Celine assim que se sentaram nos bancos do Jardim impecável e lindo dos Castro.
Celine colocava a bolsa sobre um dos bancos e sorria de olhos arregalados.
— Sim mamãe — respondia contente a menina. — Hoje nós abrimos um sapo —, mas ela repensou. — Quero dizer… eu abri. Fiquei com dó do bichinho, mas ele já estava morto. Os outros tiveram nojo e medo. Mary até desmaiou — e Celine riu-se sozinha logo acompanhada de sua mãe.
A pequena Celine era assim. Não tinha medo, não tinha nojo, não era metida a besta como muitas meninas que desde nova já eram do tipo nariz em pé. Daí já vinha os comentários:
— Garotinha abominável — ia dizendo a mãe de Mary Newman.
— É sim, mamãe. E todos riram de mim… sapos? Mortos e abertos me dão nojo.
— Eu sei querida, não ligue para isso, essa demoniazinha de uma figa que fique com esses sapos nojentos — falou a Senhora Newman quando de repente a empregada adentrou o salão de sua casa gritando horrores.
— Demônios, demônios por todos os lados — e desmaiou.
O Senhor e a Senhora Newman correram acudir a mulher desfalecida no chão que aos poucos recobrava a consciência.
— Quintal… Demônios… Pulando — ela falava coisas sem nexo.
O Senhor Newman foi ver do que se tratava e em seu jardim não havia onde pisar. Havia sapos por todos os lados pulando em direção a casa numa coordenação perfeita, mas que em pouco tempo se viraram todos de barriga para cima e um corte profundo surgiu em suas barrigas expondo suas vísceras manchadas de sangue.
Realmente pareciam demônios de tantos sapos.
Na casa de Celine de Castro a mãe olhava a filha e logo dizia.
— Não devias de fazer isso. Assim não terás amigos.
E Celine apenas abria seu sorrisinho e dizia.
— Quem precisava dessa gente que não liga pra nada além deles mesmos?
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Um mergulho em outro mundo
Mystery / ThrillerCeline de Castro não é uma garota normal, óbvio. Mas ela tem que ser tão diferente assim? Precisa mesmo que todo mundo a aponte como a filha do Diabo? Talvez, mas a bem da verdade ela não liga pra isso. Celine de Castro vive... e apenas vive como b...