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Chamo-me Amelia e, por favor, o "e" pronuncia-se "i". Hoje é o meu primeiro dia de estágio e estou nervosa! Uma nota sobre mim: eu fico nervosa para tudo.


Este estágio vai realizar-se na clínica Quinnoa. Nem perguntem, eu também não sei quem foi a alma de Deus que inventou este nome! Mas, continuando, esta clínica tem como pacientes crianças com cancro e que se encontram em fase terminal. Porquê estagiar aqui? Primeiro, porque é o programa da minha escola e tive que escolher um sítio para estagiar. Segundo, porque eu sempre quis trabalhar com este tipo de crianças e dar-lhes apoio. Deve ser um trabalho pesado, mas elas precisam de alguém que esteja lá para elas. Com este estágio vou estar mais próxima da área com que no futuro espero trabalhar: a descoberta da cura para o cancro. E... também adoro crianças e quero muito apoiá-las!


Estou, neste momento, a ser guiada, por uma enfermeira, ao quarto de uma paciente. Chama-se Sidney, tem seis anos e foi diagnosticada com leucemia com dois anos de idade.


-Vou deixá-las a sós. Basicamente, o que tens que fazer é verificar se está tudo bem com ela, ver se ela se sente bem e ser simpática - disse a enfermeira, antes de abrir a porta - sê amiga dela - acrescentou com um sorriso.


Abri a porta e à medida que ia entrando, uma menina magrinha, de olhos claros, ia ficando no meu campo de visão. Estava sentada em cima de um tapete cor-de-rosa, a brincar com uma casa de bonecas. Tirei a bata e pendurei-a num cabide. Aquela menina não queria uma médica ao pé dela, tinha a certeza.


De repente, ela vira-se, olha para mim, espantada, e recebe-me com um grande sorriso.


-Olá - disse, levantando-se rapidamente - sou a Sidney, tu vais ser minha amiga?


-Hey - respondi - eu chamo-me Amelia. Sim, claro que vou ser tua amiga, se tu quiseres - acrescentei, com um sorriso.


-Queres brincar comigo as bonecas? É muito mais divertido com mais gente! Estou farta de estar aqui sozinha, neste quarto! As enfermeiras nunca me deixam sair! - disse com uma carinha triste.


-Mas elas são tuas amigas, certo?- perguntei, enquanto me sentava ao pé dela e pegava numa boneca para brincar com ela e fazer-lhe a vontade. Enquanto me sentava reparei nas flores estampadas no lenço que cobria a sua cabeça. Um sentimento de tristeza invadiu-me.


-Sim, são muito simpáticas e eu gosto delas! Mas não me deixam sair! Não entendo porquê. Eu já sei que estou aqui e que nunca mais vou sair por causa da minha doença... podiam deixar-me ir lá para fora e brincar no parque um bocadinho.


Eu fiquei chocada com o que acabara de ouvir! Uma criança com a noção daquilo que lhe iria acontecer e a dizê-lo tão naturalmente. Fiquei triste e sem saber o que dizer.


- Então queres me explicar como se brinca? - perguntei com um sorriso e com a boneca na mão.


-Tu não sabes como se brinca às bonecas? - ela deu uma leve risasda.


Eu apenas me ri com ela e comecei a brincar, indo pôr a minha boneca a fazer o almoço numa mini cozinha da casa de bonecas.


Passado meia hora, precisava de ver a pulsação da Sidney e verificar se estava tudo bem com ela. Mas gostava de fazê-lo de uma maneira diferente para ela se divertir a fazer algo sério.


-Querida, posso pedir-te um favor? - perguntei.


-Sim - ela disse, continuando a brincar com a boneca dela.


-Eu preciso de te ver agora, mas só vai demorar uns minutos, pode ser?


-Sim, já estou habituada - disse, levantando-se e deitou-se, de seguida, na cama dela.


-Podes fechar os olhos? - perguntei.


-Porquê? Vais dar-me uma pica? É não é? Eu não gosto de picas! -disse preocupada.


- Não, claro que não -eu respondi - olha, eu ainda sou uma estudante. Ainda não sei dar picas aos meninos pequeninos, por isso enquanto eu estiver aqui contigo não te preocupes que não há nada de picas. Prometo!


-Pronto esta bem, eu confio em ti - disse e fechou os olhos.


Comecei por ver a sua pulsaçao e após o trabalho chato estar feito levantei-lhe os braços. Sem ela estar à espera comecei a fazer-lhe muitas cócegas.


-Pára, pára - dizia ela, enquanto se ria muito.


-Bem, o meu trabalho por hoje está terminado, Sidney.


-Ohh não te vais embora pois não?


-Bem já está na minha hora, mas volto amanhã - disse, com um sorriso.


-Voltas? Boa!! Gosto muito de ti! Amanhã podíamos ver um filme!


-Parece-me bem, que filmes gostavas de ver?


-Bem, já vi todos os que estão na biblioteca lá de baixo. Aqueles de princesas, sabes? As enfermeiras já mos mostraram todos!! Quem me dera que existissem mais filmes de princesas.


-Bem, eu tenho a certeza que existem mais! Vou ver o que tenho em minha casa, sim?


-Que fixe! Obrigada, Amelia - agradeceu dando-me um beijinho na bochecha e um abraço.


-Até amanhã, Sidney - disse, vesti a bata novamente e saí do quarto.


Enquanto ia andando pelo corredor, emocionada pela experiencia que acabara de ter, passei de rompante pela enfermeira que me levou até ao quarto da Sidney. Parei-a, pois queria falar com ela.


-Desculpe, posso dar-lhe uma palavrinha?


-Claro, gostaste de estar com a Sidney? Ela é muito querida! É uma pena que ela e todas as crianças que aqui estão estejam a passar por uma situaçao destas - acrescentou, com uma cara triste.


-É verdade. A Sidney parece ter muito a noção das coisas como elas são e queixou-se um bocadinho de não poder brincar na rua com os outros. Porque é que ela não vai com as outras crianças? Visto que se encontram nesta situaçao... infelizmente.


-Nós temos um horário em que as crianças vão brincar meia hora , por vezes aqui no centro de jogos e brinquedos ou então no parque lá de fora, quando o tempo está melhorzinho, mas com a Sidney é diferente. Ela está aqui, porque realmente esta clínica tem muito boas condições e os pais o assim quiseram. Mas a menina continua a fazer alguns tratamentos experimentais. Os pais não desistem dela e, semanalmente, recebemos médicos e enfermeiros especializados no tratamento dela. Não a deixamos ir brincar lá para fora, por causa do seu sistema imunitário. Os pais têm esperança que ela melhore com estes tratamentos e não querem correr riscos. Agora tenho que ir, tenho que ir ver um menino. Agradecemos por cá estares e ajudares com estas crianças, muito obrigada - saiu do pé de mim, apressada, enquanto eu fiquei com o pensamento de quem seriam os pais de Sidney para terem tanto poder.


Fiquei contente por ainda haver esperança para a linda menina que acabara de conhecer e que os seus pais estavam a lutar por isso. Só gostava que ninguém tivesse que passar pela dor destes pequeninos ou pela dor de um pai que sabe que está prestes a perder um filho.


Fui andando até a uma paragem de autocarros esperar por um que chegasse para me levar a casa, um pequeno apartamento que divido com uma colega de faculdade. Olhei para o relógio e já eram quase horas de jantar. Amanhã irá ser um grande dia. Vou começar a estagiar nos laboratórios Scintillam, também. E adivinhem! Estou nervosa...


Com Amor, AmeliaOnde histórias criam vida. Descubra agora