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Amelia

Acabada de chegar aos laboratórios cumprimento Charlie e ele manda-me sentar numa cadeira. Começa a observar-me, faz um movimento com uma luz sobre os meus olhos e verifica a minha pressão arterial.

-Desde quando é que tens habilidades médicas? – perguntei.

-Tenho aprendido umas coisas com o Jackson nos últimos dois anos, desde que te aconteceu tu sabes o quê…

-Fica-te bem – disse, mudando de assunto. Não quero falar sobre aquilo outra vez.

-O quê?

-A preocupação, o ar de médico – dei uma leva risada.

-Ainda bem que não me viste na noite em que te ajudei mais o Jackson.

-Porquê? – perguntei receosa, não queria falar sobre o assunto.

-Estava a tremer, parecia uma criança de cinco anos com medo do bicho papão - ri-me com o que ele disse.

-Nem as crianças de cinco anos já têm medo do bicho papão – respondi, soltando uma gargalhada.

-Eu ainda tenho medo do bicho papão – ele disse puxando um banco e sentando-se à minha frente.

-Então ainda não cresceste!

-Quer dizer depende do bicho papão.

- Não me digas que há vários tipos de bicho papão?

-Para mim há muitos – disse, num tom de brincadeira – naquela noite, o meu bicho papão era haver a possibilidade de te perder – concluiu, com uma expressão mais séria.

- Não acredito que estou a falar disto contigo – dei uma leve gargalhada. Já não me sinto tão desconfortável em falar com ele sobre essa noite, apesar da sua última citação me ter feito corar levemente. Ele notou e vejo brotar um leve e doce sorriso na sua cara.

-Bem, pareces-me perfeitamente saudável – ele diz, mudando de assunto.

-A sério? Tens a certeza? Não que esteja a duvidar das tuas capacidades de médico – brinquei, rindo-me – mas e o que eu tenho ouvido? As vozes? Será dos comprimidos?

-Eu duvido, não das minhas capacidades médicas, mas sim do problema ser da medicação. De qualquer forma podemos receitar-te outro tipo de comprimidos e vemos como te dás. Também podíamos realizar uma ressonância magnética e ver o caso mais profundamente, mas não vejo a necessidade de te fazer passar por mais processos médicos.

-Então não sei o que poderá ser – suspirei – Ah! Trouxe o diário que encontrei esta manhã no meu momento menos lúcido – disse, enquanto retirava o diário da minha mala, juntamente com o meu diário. Coloquei-os no meu colo e mostrei ao Charlie.

-São dois! – Charlie exclamou.

-Sim, mas um deles é meu… e estás a ver? – disse apontando para a flor desenhada – são iguais, sem tirar nem pôr. Eu sou a única pessoa que conheço que tem a mania de desenhar esta flor!

-Estranho… - disse, observando cuidadosamente os diários – já leste?

- Não, ia fazê-lo hoje… mas não sei, isto está meio que me a assustar… - respondi, receosa do que aquele diário podia conter, não estava com um bom pressentimento.

-Olha quem tem um bicho papão agora – Charlie soltou uma leve gargalhada quando o disse - tenho uma ideia!

-Conta!

- Eu ultrapassei o meu bicho papão, que era perder-te e não perdi. Está ultrapassado! – mais uma vez, corei sem o querer – e tu estiveste sempre lá comigo, indefesa, mas estavas lá, a lutar. Então agora vou estar contigo para ultrapassares o teu bicho papão, se quiseres, claro. Que me dizes em lermos o diário juntos?

-Eu leio bastante rápido - avisei-o.

-Eu aguento!

-E não vou esperar por ti - avisei-o, novamente, na brincadeira.

-Mesmo assim, não te deixo - derreti-me com as suas palavras.

Acenei com a cabeça, afirmativamente, guardei o meu diário na mala e estava prestes a abrir o diário desconhecido até que fui interrompida pela mão de Charlie.

-O que foi? – perguntei.

-Primeiro quero mostrar-te uma coisa.

Charlie

Peguei na mão da Amelia após aquilo que disse, com muita mas muita coragem!

Encaminhei-nos até ao terraço, que ficava no topo dos laboratórios, pelo elevador. Nunca lhe soltei a mão e ela nunca a largou. Senti o meu coração acelerado.
Chegámos ao terraço, havia um mini jardim, com rosas vermelhas e as luzes iluminavam o espaço. Olhei para Amelia e a sua expressão era indecifrável. Eu, simplesmente, preciso de soltar esta mulher! Desliguei todas as luzes daquele espaço e um céu estrelado se descobriu. Dei graças a Deus o céu estar estrelado naquela noite. Voltei a olhar para Amelia e os seus olhos brilhavam, fazendo um bonito conjunto com o seu sorriso. As suas bochechas estavam rosadas. Apesar da escuridão consegui reparar em cada pormenor da sua expressão.

Ela começou a andar em frente, puxando-me, sem soltar a minha mão e sem parar de olhar para o céu.

-Obrigada - ouvi-a dizer, num suspiro de prazer e de felicidade.

Sorri e apenas ficámos ali a olhar para as estrelas.

Com Amor, AmeliaOnde histórias criam vida. Descubra agora