Capítulo 85

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Ao fim do que parece uma eternidade, ouço o som metálico da bala caindo na bandeja. Meredith conseguiu removê-la e solto um suspiro aliviada.

— Está quase acabando, Emily — Matt avisa. — Só precisamos suturar.

Ele vai ficar bem.

Repito mentalmente até os dois terminarem.

— Você tem certeza que quer...

— Tenho certeza, Meredith — interrompo-a.

Quanto mais cedo começarmos, mais cedo terminamos.

— Está bem. — Ela dá um suspiro longo. — Matt, eu vou precisar de apoio aqui. — A médica começa a tirar as gazes de cima da ferida fazendo uma onda de dor passar por mim, mas tento não demonstrar. Isso não é nada com o que sei que virá a seguir. — Você pode distraí-la? — pergunta para Matt que me olha com os olhos cheios de culpa.

— Acho que nada poderia me distrair. — Minhas mãos estão agarrando com força a beirada da maca. Nada vai me fazer parar de pensar na dor que sei que vou sentir.

— Quero todos lá fora, menos você, Vitor!

A ordem do Matt é rapidamente acatada.

— Segure a perna dela — Meredith diz para o soldado que se aproxima de mim enquanto a sala se esvazia rapidamente. — Tente deixá-la imóvel — ela pede para o Soldado.

Ele concorda com a cabeça, e a única certeza que eu tenho é de que Vitor vai precisar se esforçar para isso.

— Você consegue, Mere! — Matt fala baixinho para a médica, e não posso julgar a hesitação dela.

Sei que não iria gostar de ter que fazer isso com alguém.

Sinto os dedos delicados da Meredith ao redor do ferimento.

Eu consigo.

Repito para mim mesma, enquanto ouço um pedido de desculpa da médica. Mas quando sinto o fio entrando não consigo segurar um grito de dor.

— Emily, olha para mim! — Matt me chama, mas eu só consigo me sentir apavorada com o que sei que vem a seguir.

É só o primeiro ponto, e sei que vou ter que levar pelo menos uns sete.

Droga!

Sinto o fio entrando no outro lado da ferida. Aperto os dentes com força, mas, mesmo tentando, não consigo controlar outro grito.

— Faça o que tem que fazer — Matt diz para a médica que hesita mais uma vez. — Emily, preciso que você se esforce e se concentre em mim. Apenas pergunte o que quiser saber, vou falar tudo o que sei para você!

Olho para Matt e tento fazer o que ele pede. Mas não sei por onde começar. Os pensamentos surgem confusos.

E então me lembro de quando tudo começou a dar errado esta noite.

— O que foi aquela explosão?

Mais outro grito sai no final.

— Nós a causamos — Matt responde. — Precisávamos de uma distração para podermos fugir.

Respiro fundo enquanto Mere prepara o fio para mais um ponto. As mãos do Vitor se apertam firmes à volta do meu tornozelo.

— Por que precisamos fugir? — Minha voz sai por entre os dentes enquanto tenho vontade de pedir para Meredith parar. — Eu estava no meio da missão mais importante.

Tento puxar a perna, mas Vitor não deixa.

— Porque o Kyle descobriu tudo e ameaçou expor você e os outros Resistentes. — Dou mais um grito. — Como você estava no Palácio Real, não tive alternativa a não ser ligar para o Nathaniel, contar os planos do Kyle e pedir para saírem de lá e me encontrarem. Seria muito fácil prenderem você lá.

Lembro-me do Nathaniel dizendo que tinha que me manter em segurança, mas nada faz sentido.

— Ele sabia que eu sou uma Resistente?

— Claro que não — Matt responde. — Não contei tudo para ele por telefone. Mas você não está fazendo as perguntas certas — ele comenta, enquanto aperto a mão dele com toda força que consigo antes de mais um ponto. — Você sabe que algumas coisas do que viu hoje não fazem sentido.

Contorço-me, lágrimas de dor escorrem no meu rosto.

— Você sabe que não era para ter sido tão fácil rendermos o Nathaniel.

Dou outro grito, mas mais controlado enquanto tento entender o que Matt está tentando me dizer.

Fecho os olhos e vejo Nathaniel saindo do carro com a arma. Vejo-o dando as costas para Matt. Por que ele fez isso? Sei que Nathaniel tem treinamento e coragem suficiente para enfrentar todos aqueles Soldados, mas ele simplesmente não fez nada. Nem quando o Kyle chegou. Ele poderia ter aproveitado para lutar contra a gente. Ele poderia ter ordenado os Soldados para prenderem o Matt.

São soldados dele.

Então meus pensamentos voltam no tempo desorganizados.

Desde que Nathaniel se tornou Comandante da Guarda Real já não há tantas execuções. Ele fez de tudo para que o Lucas e eu parássemos de chamar atenção. Ele não deixou que matassem aqueles civis após a explosão na Muralha. Ele enfrentou o próprio pai essa noite.

Quanto mais penso, mais percebo o quanto fui tão cega esse tempo todo.

Então o último pensamento surge.

Eu o traí da pior forma possível e mesmo assim ele não pensou duas vezes antes de se jogar na frente de um tiro para me salvar.

Sinto mais uma vez o fio de sutura entrando na minha pele, mas apenas fecho os olhos com força e já não grito.

— Você não é o líder da Resistência — afirmo, sem coragem de fazer a pergunta que sei que Matt está esperando.

— Não — ele confirma. — A Resistência tem dois líderes. — Fico em silêncio, as lágrimas escorrendo no meu rosto e não são por causa do último ponto. — Um deles é o Gabriel.

— E o outro? — pergunto, mesmo já sabendo o que vou ouvir. — Quem é o outro líder da Resistência?

— Nathan.

Eu tinha tanta certeza que sabia exatamente quem você era
Mas você era algo além do que jamais imaginei
Nos seus braços, estou sã e salva
Você virou o meu mundo de cabeça pra baixo
Mas todo o inferno que passamos teve um propósito
Juntos somos caos e isso é perfeito
(I Didn't Know | Sofia Carson)


A Resistência | À Beira do Caos (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora