XXV - Hospício

10.2K 1K 63
                                    

As pessoas dizem que antes de morrer, vemos um filme, com os melhores momentos da nossa vida. Era tudo mentira.

Antes de morrer, tudo que eu vi foram meus erros. As vezes que eu deveria ter valorizado mais minha mãe, quando criança. As chances que eu poderia ter aproveitado para me aproximar do meu pai verdadeiro. Todas as situações em que eu abaixei a cabeça para Christopher, quando eu deveria ter brigado. Quando deixei Arthur mudar de continente, para se afastar da nossa família e nunca fiz nada para trazê-lo de volta. E Dom.

Meu maior erro.

Eu deveria ter me casado com ele. Pego o primeiro avião para a Itália e resolvido meus problemas. Eu achava que indo com ele, acabaria presa, como quando eu vivia sob as amarras de Christopher.

Mas Domenico nunca foi igual Christopher.

Eu vi todas essas cenas se desenrolarem no um segundo em que fiquei morta. Antes do choque de um desfibrilador me trazer de volta.

Quando eu recuperei a consciência, pronta para refazer minha vida, era tarde demais. Estava presa em um quarto escuro. Parecia um hospital, mas eu soube que não era, quando Christopher entrou pela porta.

Diferente da última vez que o tinha visto, ele estava ótimo. Nem um resquício do mal estar de antes. Eu tinha caído em mais uma de suas manipulações.

— Nunca, em nenhum dos cenários que eu previ, imaginei que seria tão fácil — ele debochou.

Tentei avançar nele, pronta para machucá-lo, mas meus braços e pernas estavam presos na cama.

— Pode se debater, não vai adiantar. — Ele riu. — Você facilitou muito as coisas para mim, minha querida filha.

— Eu não sou sua filha — cuspi.

— É sim. Principalmente agora, que eu interditei você. Esquizofrenia paranóica é uma doença muito séria. Não tem cura, sabia?

— Você armou para mim! Eu não sou louca!

— Pode até não ser, mas vai ficar, depois de passar o resto da vida aqui. — Ele estava realmente se divertindo com isso.

— Como você fez? — Eu realmente queria saber. — Como você causou meus surtos?

— Drogas. Acontece que se você misturar os tipos certos na bebida de alguém, a pessoa começa a ouvir vozes, fica violenta, tem apagões.

— Você não pode me manter aqui! — eu gritei, desesperada.

— Você confessou, filha.

— O que? — Eu não fazia ideia do que ele estava falando.

— Aquela visita ao seu paizinho moribundo. Você confessou que estava ficando louca. Eu tenho um laudo médico confirmando o diagnóstico e para ajudar, você sofreu um acidente de carro porque teve um apagão. Nunca imaginei que você iria cooperar tanto.

— Por que me trancar aqui? Você quer a empresa, eu te dou. Pode ficar com tudo.

— Eu sei que você acha que estou fazendo só por dinheiro, mas é pelo seu bem. — Ele acariciou meu rosto, como se realmente se preocupasse comigo. — Eu não posso deixar minha filinha se envolver com bandidos, mafiosos. Aqui você vai estar bem protegida.

Seu celular tocou e ele desviou sua atenção de mim.

— Tenho que ir, compromissos me aguardam.

— Por favor! Não me deixe aqui, por favor!

— Fique bem, minha filha. — Ele bateu a porta e me deixou trancada no quarto escuro e gelado.

 — Ele bateu a porta e me deixou trancada no quarto escuro e gelado

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Eu estava no inferno. Tinha morrido e esse era o cenário da minha punição.

O quarto era branco demais. Paredes brancas, móveis brancos, roupas brancas. Tinha uma única janela, que me mostrava a copa de algumas árvores. Nenhuma cidade. Apenas árvores e plantações.

Não fazia nenhuma ideia onde estava, mas sabia que já tinha passado uma semana aqui. O corte na minha barriga já estava quase totalmente cicatrizado e os machucados da batida estavam desaparecendo.

Os funcionários me tratavam bem. Eles traziam comida. Limpavam o quarto. Me davam banhos. Mas nunca conversavam comigo.

E tudo que eu mais queria era que um deles falasse comigo.

As alucinações tinham sumido. Sem mais vozes, sem mais apagões. Eu estava sã, perfeitamente bem. Mesmo assim continuava presa.

Não era justo. Faria qualquer coisa para voltar a minha antiga vida. Voltar para Dom. E Arthur e Lizzie. A saudade estava me corroendo por dentro.

— Você tem visita. — A enfermeira avisou quando entrou no meu quarto em uma manhã. Eu me animei por um segundo antes de perceber que só poderia ser Christopher. — Venha comigo.

— Quem é? Para onde vamos?

A mulher me ignorou. Me guiou por alguns corredores até entrarmos uma sala. Vazia. A não ser por uma mesa, duas cadeiras e um espelho em uma das paredes.

— Sente-se — mandou. Eu obedeci e nem reclamei quando ela amarrou meus pulsos nos braços da cadeira.

A mulher saiu, sem falar mais nada. Não deu uma indicação de quem poderia ser o visitante. Duvidei que fosse Christopher. Ele simplesmente teria ido até o meu quarto.

Lorelai entrou pela porta, contrariando todas as minhas expectativas. Sentou na cadeira a minha frente, do outro lado da mesa.

— Como você está? — Eu não podia acreditar que ela estivesse me perguntando algo assim, quando ela e Christopher eram a razão de eu estar ali. — Eu sinto muito, Kate...

— Como você acha que eu estou? Lorelai, meu pai me trancou aqui, você tem que me ajudar.

— Kate, eu não posso fazer nada.

— É claro que pode! — Eu estava cega de ódio. — Você conhece Holden, sabe que eu estava com ele antes de vir parar aqui. Tudo que você tem que fazer é contar para ele e Holden vai dar um jeito de me tirar daqui.

— Eu não posso, Kate. Tenho medo do que Christopher poderia fazer comigo, se eu o traísse desse jeito.

— Você me deve. Por tudo que você fez para mim e para Arthur. Eu achei que você estivesse arrependida, essa é sua chance de concertar as coisas, Lorelai.

— Eu sinto muito, Kate. — Ela levantou da cadeira e, de costas para o espelho, sem mover a cabeça, olhou para baixo. Eu reparei em um papel, descansando no seu assento. — Espero, do fundo do meu coração, que você fique bem.

Esperei Lorelai sair e estiquei meu pé por baixo da mesa. Forcei minha perna o máximo possível até conseguir tocar as pontas dos dedos no papel. Escondi dentro das minhas roupas, bem a tempo da enfermeira me buscar.

Quando me trancaram novamente no quarto, eu não via a hora de ficar sozinha. Desamassei o papel e encontrei uma carta:

"Querida, Kate. Sinto muito por demorar tanto. Tive que agir com mais calma. Desde que Christopher passou mal, algum tempo antes de você ser internada, ele estava extremamente desconfiado. Dificultando meu trabalho em envenena-lo. Precisei conquistar um pouco mais da confiança dele antes que me deixasse visitá-la.

Eu precisava vir, para reconhecer o local e avisar ao seu estimado, Holden. Ele também não tem sido muito paciente. Se não fosse por Anitchka, estaríamos em guerra no momento que você bateu aquele carro.

Agora, que eu conquistei a confiança de Christopher o suficiente, saiba que em breve, você estará fora deste lugar horrendo.

Não sei quando, nem como. Mas tenha fé.

Espero que um dia possa me perdoar.

Lorelai. "

Eu chorei muito nesse dia. Pela primeira vez desde que fora internada, eram lágrimas de felicidade.

Não podia dizer que perdoava a mulher, mas a respeitava. Precisava de muita coragem para se manter casada com Christopher e ainda o desafiar, como Lorelai estava fazendo, para tentar me salvar. Eu respeitei ela como nunca antes.

No meu sono, nenhuma preocupação me afligiu. Eu pude dormir tranquila aquela noite. Domenico estava vindo até mim.

Pura Luxúria (Completa) - Série Criminosos Irresistíveis - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora