Capítulo 19

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Desliguei o telefone e enfiei um casaco no corpo.

— Onde a Emili foi, Helena? – Dora já colocava o roupão e as pantufas.

Engoli em seco, precisava correr.

— Buscar comida. Ela me ligou agora pedindo ajuda para trazer os pacotes. – fiz sinal mostrando a chave do apartamento em minhas mãos.

— Ah, eu estou tão cansada. Jantem vocês mesmo, eu vou me deitar, se vocês não se importarem... – ela sorriu e apertou o roupão ao corpo enquanto tinha arrepios de frio.

— Fique tranquila mãe. Descanse bem. Eu volto em dez minutos.

A adrenalina percorria todo meu corpo. Eu estava com medo, tremendo de medo, e rezava em voz baixa para que nada ocorresse com Emili.

Enquanto fechava a porta, Dora me sorriu.

— Volte cedo, Helena. Nosso voo é amanhã às quatro da manhã. 

E fechei a porta.

Tanta coisa pesou no meu coração com aquelas palavras, mas eu as ignorei e corri.

Me lembrava claramente de ter corrido da mesma maneira quando Emili tinha ido ao pub na terça, e com a força do hábito, nem encarei o porteiro, como fizera aquela noite.

Voei para fora do prédio entrando na noite escura e fria daquela quinta feira.

"Por favor, Senhor, proteja aquela menina inocente."

Corri o mais rápido que podia, meus tênis fazendo um barulho esganiçado da borracha batendo na calçada.

Quando avistei um corpo pálido cambaleando, não consegui mais pensar em nada.

— Sua idiota, não me preocupe mais assim... – abracei a tão forte com medo que ela pudesse fugir de novo. E percebi que eu derrubava lágrimas. O desespero ainda estava correndo em cada uma das minhas veias.

Acho que era ali que havíamos nos perdoado.

Ela não me soltou e vi que se soltasse, despencaria no chão.

— O que fizeram com você? O que aconteceu? – chacoalhei seus ombros esperando sua resposta que não saía. Devagar, ela puxou a manga da grande jaqueta, que parecia não ser dela, e me mostrou seu braço.

Deixei mais lágrimas caírem.

Seu braço estava banhado de sangue, estilhaços de vidro brilhavam no meio dos imensos cortes, não sabia a profundidade de seus ferimentos, mas a julgar pela quantidade de sangue, não pareciam ser pequenos. Olhei para seu rosto, pequenos cortes também maculavam suas bochechas pálidas e havia vermelhidões por todo seu pescoço e ombros. Sua figura estava coberta por um vermelho escarlate. Ela parecia uma obra de arte abstrata com tonalidades fortes de vermelho e roxo.

O mesmo sangue escorria de seu tornozelo, traçava o caminho que ela percorrera pela calçada. Eu não me surpreenderia se quem fez isso seguisse seu rastro.

— Emili, o que...? 

— Ele bateu o carro... Ele estava me sufocando... – ela se abraçou de novo em mim. – O vidro voou...

— Não se esforce. Vamos, vamos, eu vou te levar para o hospital.

— Helena, eu... – quando ela ameaçou cair, sustentei-a com um abraço de lado.

— Está tudo bem, não precisa me contar agora. Vamos embora daqui.

— Dora... Ela não pode saber – ela continuou com dificuldade.

Coordenadas de um CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora