ghostin - bônus¹

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tw: aborda um tema sensível.

Ares.

anos depois...

Estou sentado no parapeito de um prédio. Estou fumando um cigarro, enquanto observo o dia cinza de Londres. Todos os dias parecem os mesmos agora que estamos no inverno. Eu até gosto.

Hoje é uma data complicada pra mim. Fazem três anos desde a morte da Abby. Eu tenho contado cada dia, como se ela ainda fosse voltar. Eu sei que ela não vai. Já aceitei isso. Mas também não foi um processo rápido, eu levei meses pra aceitar. Muita terapia e muitos maços de cigarros.

Eu também demorei para compreender que aquilo era o melhor para ela. Demorei para raciocinar que tudo o que ela passaria se estivesse viva, não a faria bem. Nos primeiros meses eu chorei e lutei contra tudo o que as pessoas diziam sobre ela. Eu quis morrer com ela. Três meses foram de total dor e sofrimento. Eu não podia aceitar que ela havia partido.

Eu não podia pedir por um amigo melhor que Ryan. Ele esteve ao meu lado e me salvou, como todas as vezes, quando eu me perdia nas bebidas. Ele já me pegou parado em uma janela, ele já me impediu de encher a banheira, de usar uma faca para cortar um simples pão e uma vez me impediu de fazer minha própria barba. De repente, eu me tornei uma criança outra vez. Qualquer pequena coisinha se tornava perigosa na minha mão. Ele foi a pessoa que serviu para me dar um choque de realidade. Ele gritou comigo naqueles dias em que eu queria ser surdo. Ele me disse que ela nunca mais voltaria e que eu não podia parar minha vida por ela. Que eu não poderia agir como um suicida por ela. Ele tinha razão.

Se Abby estivesse viva, ela não iria querer o meu bem? Ela não iria querer que eu seguisse em frente? Bem, foi exatamente o que eu fiz. No ano em que ela morreu, na noite de Natal, eu conheci Tori Wood. Nós dois estávamos passando por momentos difíceis e nada melhor do que a dor para juntar a vida de duas pessoas. Com o tempo, nós dois fomos alimentando um amor que nem sabíamos que existia e quando aconteceu... Ah, quando aconteceu! Foi uma das melhores coisas que senti depois da Abby.

Eu não amei Tori desde o primeiro segundo em que a vi. Eu aprendi a amá-la e ela também. Acho que se tornou confortável. Ela sabia que eu estava ali pra ela, da mesma forma que eu sabia que ela estava ali pra mim. Eu não sei quando nós decidimos que íamos casar e vir viver em Londres, mas eu acho que meio que aconteceu.

No dia do meu casamento, nada tirava a imagem da Abby no rosto de Tori. Era pra ser ela ali. Aliás, eu prefiro pensar que ela não partiu totalmente. Uma parte de mim ainda alimenta sua imagem com lembranças e pequenos gestos que me marcaram.

Eu posso jurar que, as vezes, consigo vê-la andar pela casa, me observar, sorrir para mim, e as vezes até me tocar. Mas por que ela faria isso? Bom, ela não faria. Ela está morta.

Quando a Abby morreu, além do meu sofrimento, as pessoas viraram para mim e me questionaram o que eu iria fazer naquele momento. Alguém tinha que responder aquela pergunta, eu era incapaz de repondê-la, então eles se deram o trabalho de fazer isso. Traçaram a merda da minha vida inteira e eu, como um idiota, vivi cada pedaço estudado e criado por eles. Eu me calei diante de todos e escolhi viver da melhor maneira possível. Já estava tudo planejado mesmo, por que eu me daria o trabalho de replanejar toda a minha vida?

Eu não gostava de chorar na frente de outras pessoas. Aliás, você já reparou que quando você está chorando em público as pessoas te observam sem um resquício de preocupação? Do contrário, há um sentimento facilmente confundido com preocupação. Curiosidade. Todos pareciam curiosos sobre o meu choro, mesmo depois de explicar que eu amava uma pessoa e eu mesmo a matei. Era como se o meu amor por ela fosse questionável e estivesse em pauta. Não estava.

𝗥𝗘𝗔𝗗 𝗠𝗬 𝗟𝗜𝗣𝗦.  Onde histórias criam vida. Descubra agora