H6N3

Apagões

Os dias não têm sido fáceis. Estou tendo constantes apagões. E toda vez que eu acordo estou sempre em um lugar diferente. Rad disse que me carrega pelas ruas e bosques para que Meg e Mike não nos encontre. Mas sinceramente, se realmente o quisessem, nada os impediria.

Estamos caminhando por uma estrada que desconheço. Rad disse que estamos indo para um lugar com pessoas que podem me ajudar com essa coisa de ter apagões. Ele disse que ouviu boatos sobre um grupo de mutantes que recolhiam outros mutantes para mostrar um caminho novo e alternativo. Isso me cheirou a lorotas de filmes de apocalipse. Onde sempre existe um lugar seguro e legal para onde os mocinhos podem ir.

Mas para onde mais eu iria? É sobre ter esperança. Ou sobre não ter alternativas. Ainda não decidi.

Os apagões duram cada vez mais tempo. Não é como se eu estivesse dormindo quando acontecem. É como se eu estivesse morta. Será que isso tem alguma coisa a ver com as lembranças que absorvi de Will? Começou depois de sua morte. Não deve ser coincidência.

Rad disse que eu até ronco depois que desmaio. E os desmaios sempre acontecem em situações ruins. Como quando fomos atacados por mais homens de preto. Estávamos completamente cercados. E depois disso eu só me lembro de acordar dentro de uma barraca amarela com um frio de matar. Quando finalmente despertei do sono profundo, vi Rad com uns sete bons galhos na mão, se preparando para acampar.

— Achei que nunca mais fosse acordar — ele disse. — Vamos, me ajude a acender o fogo.

— Eu não sei acender fogo com galhos. Acabaram os fósforos? — perguntei, confusa. E ele pareceu pensativo.

— Ah. Você não sabe fazer fogo. Que vergonha — ele falou como se estivesse tentando gravar aquilo.

— Não precisei aprender, o mundo está cheio de isqueiros e caixinhas de fósforo. Mas como diabos estamos vivos? Como acabou com todos aqueles caras?

— Como? Bom, foi simples. Eu sou incrível e atirei em todos eles.

— Não é rápido o suficiente para atirar em todos. E sabe Deus quais eram as habilidades deles. Seja sincero. Pode admitir. Você abriu espaço e fugiu.

— Acho que nunca vamos saber — ele sorriu e o seu rosto se iluminou pela faísca que criara.

O outro apagão foi durante uma conversa. Falávamos sobre o passado. Às vezes parece haver séculos entre o antes e o agora. Parece uma vida passada. Um sonho. Um fruto da imaginação que alguém comeu até o caroço e não restou nada para ser guardado.

Rad falou sobre como ele era bom nos esportes, nas disciplinas, com as garotas e com a família. Eu não acreditei muito. Mas se for verdade, só deixa tudo ainda pior. Eu não era boa em quase nada. Queria mesmo era ser artista. Mas sinto falta da minha família. Falta suficiente para sentir o coração apertar e ficar do tamanho de uma ameixa seca. Falei sobre Meg para ele.

— Ela não era assim. Nem um pouco assim. Tudo bem que Meg sempre foi atrevida, e não respeitava autoridades e ninguém conseguia controlar suas vontades, e nossa, como isso me irritava. Mas ela tinha algo bom por dentro, em algum lugar. Às vezes ela era doce. E era estranho porque "não é do feitio de Meg". Mas agora... Agora ela o obedece como um cão adestrado. E não parece haver nada bom dentro dela.

— Eu imagino como deve ser. Perder alguém, quero dizer.

— Sim. Você também perdeu pessoas. Sua família, não foi? — fiz cara de condolência.

— É. Perdi — disse e levantou do tronco.

Mais tarde, dentro da barraca amarela, eu rolei do meu lado do chão até ele perguntar o que era.

— Está com algum problema?

— Eu sinto falta dela. Queria ela de volta. Acho que... mesmo sem ser ela.

— Quer ser encontrada por eles? É isso? Quer voltar para Mike?

— Eu não sei — disse acuada pela voz firme e ameaçadora de Rad.

E então eu apaguei. De novo.

Quando acordei, não queria mais Mike ou Meg. Só queria acabar com os apagões. E foi assim que Rad me convenceu a seguí-lo. Foi assim que fui parar na estrada desconhecida a caminho do lugar desconhecido. Demoramos alguns dias de caminhada, mas estávamos bem alimentados, hidratados e descansados. Então tudo bem.

— Chegamos — Rad disse.