Campos de Algodão

EQM

            Foi realmente muito difícil para Carlos no início, principalmente nos primeiros meses.Ele não comia direito, não dormia direito,e seu desempenho no trabalho já andava de tal sorte comprometido que o Sr. Verdugo sugeriu umas férias.

               - Carlos, você teve uma perda inestimável, e ainda tem que se preocupar com seus filhos, então é compreensível que você precise de um descanso. Ninguém pode aguentar tudo, o tempo todo.Tire alguns dias, faça uma viagem com as crianças...Tenho certeza que na volta estará revigorado, e terá condições de encarar seu trabalho melhor.

              - Não preciso de férias Elias.Olhar o mar ou ouvir o canto das gaivotas, não me fará esquecê-la, nem tampouco a trará de volta.Ela se foi, tal qual meu pai.Tenho que aceitar isso, e quanto mais eu mantiver minha mente ocupada melhor será.

              - De nada adianta você ocupar sua mente com pensamentos divididos,fragmentados,entre sua vida pessoal e sua vida profissional.Tem o contrato com os japoneses , a obra do edifício Pérola ...Preciso de você inteiro para essas tarefas.Agora, Deus sabe que será preciso mais do que duas ou três semanas para você se recuperar integralmente e seguir em frente, porém deve ser suficiente para que se restabeleça um pouco.Olhe pra você Carlos: Um homem jovem, com filhos maravilhosos, e um futuro pela frente... Prostrado , barba por fazer, o cabelo por cortar.Isso se reflete em seu desempenho.Sabe que lhe quero bem tanto quanto a um filho, mas você esta se prejudicando, e prejudicando a empresa.Existem outros funcionários, eles se espelham em você.O futuro deles, o seu futuro, o futuro da empresa, depende que seu líder esteja em condições de liderar.

          Carlos pensou por um instante.Sr Verdugo continuou.

               - Não estou te pedindo pra parar,homem!Estou sugerindo que tire uma folga, para depois retomar com força total!Te parece algo tão difícil assim?
Carlos continuava sem falar nada.Pensava, apertava os nós dos dedos, o olhar baixo.Nem a sombra do homem que era.

         Por fim falou:

                - Está bem Elias.Tirarei 15 dias está bom assim?Vou aproveitar e fazer algumas modificações em casa, quem sabe ir até Caraguatatuba ver se está tudo em ordem na casa de praia...

                - Assim é que se fala.
          A verdade, é que Carlos falou aquilo por falar, ele não tinha a menor intenção de ir a Caraguatatuba.Ja pensou? Rever locais onde ele e Amanda namoraram? Recordar os bons  momentos vividos,as risadas, o por do sol na varanda... Algumas das roupas de praia dela deviam estar no armário ainda.Por outro lado poderia ser bom para as crianças,pensou.Carolina não iria se lembrar de nada, pois a ultima vez que foi a Caraguá era muito pequena, então não iria recordar.Os meninos, teriam alguma saudade no inicio, mas decerto logo que fossem a praia esqueceriam todo o resto.Sim, talvez não fosse uma ideia tão ruim assim.Ficou decidido, faria a tal viagem!Ligou para Virginia, e perguntou se ela poderia acompanhar,mas Virginia não podia parar tantos dias no trabalho, então Carlos Roberto resolveu chamar a babá para acompanhar.Não poderia cuidar das crianças sozinho, mesmo porque não estava com cabeça pra cuidar nem dele mesmo,e embora tivesse  caseiros que ficavam direto no imóvel,os mesmos ficariam perdidos tendo que cuidar daquela criançada.
Tudo combinado, as crianças aceitaram bem a idéia, e resolveram sair no dia seguinte à tarde.Carlos resolveu passar menos do que os quinze dias imaginados, para que os meninos não perdessem muitas aulas na escola.De sexta feira a tarde, até quarta da semana seguinte já estava de bom tamanho, pensou ele.
          Na sexta a tarde, após pegar os garotos na escola, já estava tudo preparado, e lá foram eles .Chegaram antes do anoitecer, Carlos sugeriu uma pizza , ideia que foi muito bem aceita por todos.Ele foi a seu quarto, reviu sua cama.Nos armários, varias roupas de Amanda.Vieram-lhe lembranças a memória, os sorrisos dela , a velha canga que ela adorava usar comprada em Miami.As paredes, os cheiros, tudo trazia a Carlos lembranças amargas, de tempos tão doces.Resolveu dar tudo a Zilda, a babá. A noite foi caindo de mansinho, o vento soprando suave naqueles dias de outubro, e Carlos sentou-se a varanda, sem sono.Zilda veio a seu encontro.