Herói de Tróia

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Alguem sopra minha boca diversas vezes, puxando a água acumulada dentro de mim, e a colocando pra fora. Ouço um falatório ao longe, mas não me preocupo em abrir os olhos, só quero o colo da minha mãe.

Kihyun?

Ele está bem?

— Eu vou levar ele pro hospital.

— Eu vou junto!

— Você vai ficar, não quero mais prejuízos envolvendo seu nome

— Mas a culpa não foi minha! Taeyong está chapado…

— Mas aconteceu na sua festa. Isso não vem ao caso, pelo menos não agora.

Sou erguido nos braços do ser humano que me trouxe para a realidade e levado para outro lugar

Por favor, me diz que está bem… — murmura, eu gostaria de dizer que estou bem, estou acordado e que sou grato a quem me ajudou. Mas minha cabeça dói com algumas pontadas e arde, as palavras parecem soltas, assim como meu cérebro. Isso me faz resmungar, mas também sinto frio

Vai ficar tudo bem, Kihyunnie... Você vai ficar bem logo...

                            •×•

Morri?

Não, ainda estou respirando e tenho dores no corpo. Definitivamente estou vivo. Abro os olhos para confirmar minha certeza, vejo o quarto hospitalar arrumado, e uma figura bem conhecida entra pela porta

— Kihyun!

— Eu tô vivo… — resmungo

— Mas você quase me matou de preocupação. Me desculpe ter deixado você sozinho

— Tudo bem, Min. — suspiro — Você sabe o que houve exatamente? Está tudo tão confuso…

— Os meninos estavam bêbados e Taeyong resolveu te incluir na babaquice deles e te levou pra piscina… Changkyun te trouxe pra cá e me ligou…

— Não é possível. Ele não estava na festa, Min

— Ele estava do lado de fora, mas só viu quando o Jackson pulou na piscina com você. Foi ele quem te tirou da piscina e te trouxe. Como você se sente? Está com alguma dor?

— Estou com dor no corpo, queria levantar dessa cama

— Você está em observação por hoje, bateu com a cabeça no chão da piscina e foi uma pancada forte

— Só me acontecem coisas boas, que incrível.

Depois de sair desse hospital, eu nunca mais reclamo do tédio que é ficar sozinho em casa. Mas o que mais me incomoda, nem é o tédio, é o fato de Changkyun ter, basicamente, me salvado da morte. De trocentas pessoas, a única que impediu o meu óbito, é a que eu mais rezei em não ver. E eu sei que, o que aqueles garotos fizeram foi crime, mas não vou denunciar. Eu estava no lugar errado e na hora errada.

Não vejo a sombra do meu "herói" nos três dias em que fiquei no hospital, mas Minhyuk me contou que ele procurava por noticias minha, e só quando soube da minha alta, parou de perturbar o Lee.

Levei um puta exporro da minha mãe, mas no final, fui paparicado até a noite, pouco antes de dormir, com um Minhyuk preocupado ao meu lado.

— Vai agradecer ele, né?

— Eu não.

— Kihyun, o garoto te salvou!

— Eu não pedi para ser salvo

— Juro que as vezes eu mesmo sinto vontade de te esganar

— Só fica na vontade. Boa noite, Minnie.

— Boa noite, Kihyunnie.

Me ajeito bem próximo a ele, e o abraço pela cintura…

                               •×•

Desperto sozinho, sem ajuda do despertador, assim como Minhyuk, que me olha confuso ainda

— O que houve?

— Eu não sei… Que dia é hoje?

— Quinta, eu acho…

— Tenho direito à uma falta

— Tem não, hoje tem trabalho valendo nota em Socioliga e português… — boceja trazendo lágrimas á seus olhos.

Me levanto mesmo sem querer, e vou em busca do meu uniforme, posso tomar banho quando eu voltar. Em um momento onde eu não tenha preguiça, sono ou mal humor. Apenas vontade de existir.

Coloco a mochila no ombro e saio de casa com o Lee, como sempre, ambos preso dentro do próprio silêncio. Até chegarmos à escola e recebermos a atenção de todos, algo totalmente desnecessário e desagradável. Minhyuk me puxa pra sala e busca alguma cadeira dos fundos pra gente ficar.

— Como sobreviver a essa escola sem surtar?  Google pesquisar.

— Ops, você está sem conexão com a internet no momento. Conecte-se a uma rede, e tente novamente no final do ano. — Minhyuk imita a voz da Assistente virtual

— Até lá, já me mataram…

— E graças ao Changkyun, ninguém vai conseguir te matar nem tão cedo. Nem você mesmo. — diz em alta e boa sonoridade vocal, resultando em uma quentura facial em minha pessoa. Eu sei que o Lim está presente em classe, e sem a menor dúvida, ele escutou a indireta, assim como a classe inteira, e alguns até riem baixo.

Em pleno século 21, e o pessoal acha graça de suícidio. É vergonhoso viver em um mundo onde, um assunto grave é visto como algo banal. Banal o suficiente para ter casos de cantores famosos partir, e abafarem o caso, arquivando o acontecido e o trancando em sete chaves. Eu não sei qual é a palavra que se encaixa no nível desse absurdo, mas me deixa perplexo.

A sala se torna o mais absoluto silêncio com a chegada do professor de história, mas muda com a entrada do lecionador de matemática, e mantem o falatório em biologia.

— Cuidado pra não morrer dessa vez, tampinha. — o moleque avisa antes de sair da sala para o refeitório

— E você quase me crucificou ontem quando eu disse que não iria agradecer ele

— Independente do idiota que Chang seja, ele foi humano em te ajudar, ao contrário dos outros que só assistiram. — Minhyuk argumenta me deixando sem uma resposta. Eu sinceramente gostaria de não entrar no único lugar que reune todos os alunos dessa rede de ensino, sem nenhum tipo de privacidade para aqueles que não querem contato com outros idiotas como Changkyun. Mas ficar no corredor não é uma opção, nem pra mim, menos ainda pro Minhyuk, que está tentando evitar Hyunwoo e Jooheon desde a noite da tal festa.

— Podemos pegar algo para comer e ficar na escada — murmura, com o braço enlaçado no meu

— Por mim tudo bem. — dou de ombros. Minhyuk está quieto hoje, e entendo seu silêncio, não está fácil pra ele.

Caminho com ele até a barraca de gordices e compro um bolo de cenoura com calda de chocolate.

Socorro! Socorro! Me soltaaaaa!!! — Changkyun escandaliza no meio de um silêncio anormal que de repente se forma no refeitório e, após, as risadas. Me sinto sem chão de tanta vergonha. Ele não tem o direito de fazer isso comigo.

Oh não! Taeyong, seu malvado! Bruub — faz som de afogamento. Minhyuk me puxa para fora do refeitório, logo que sinto minhas pernas oscilar. Me sento no primeiro degrau, ao lado de Minhyuk

— Você está bem? — pergunta, nos olhamos ao mesmo tempo, e posso sentir meus olhos marejados, assim com os de Minhyuk. Não, Min, eu estou péssimo! E não é preciso dizer em palavras para desabar em lágrimas no colo dele, assim como ele faz…

                                  Continua…

You Think - ChangKiOnde histórias criam vida. Descubra agora