Capítulo 5.

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Brooke conferia o jornal na página de aluguéis, sentada numa pracinha charmosa. Suas pernas descansavam sobre a bagagem. O sol nascera recatado, transformando os flocos de neve em gotículas, que logo em seguida evaporavam, anunciando o fim da rigorosa estação. Foi numa dessas que um "engomadinho" exalando prepotência, escorregara e se não fosse suficientemente esperto ao se equilibrar teria caído de nariz ao chão. A latina riu dele. Ele foi sua diversão naquela manhã. Ela tinha que admitir seus excelentes reflexos. Já se podiam notar as sementinhas nas cerejeiras, ansiosas por desabrocharem. Ficou feliz por ter escapado das nevascas enquanto estava presa. Não se dava muito bem com as baixas temperaturas do clima. Ficar isolada por causa do volume da neve, lhe sufocava. Ela nasceu para usufruir intensamente de tudo que proporcionasse sensação de liberdade. Tom sempre lhe dissera que seu sangue era quente e seu espírito se adaptava perfeitamente ao calor. Ele tinha razão. Sempre quisera conhecer o Brasil. Já ouvira falar do Rio de Janeiro e já se encantara pela cidade antes mesmo de ter ido lá. Diziam que aquecia até no inverno. Arriscaria um samba para o turismo não passar em branco. Não via a hora do verão chegar. Sua estação predileta, depois da primavera, pois com ela vinham as chuvas. Se recordou das vezes em que ela e Francis competiam sob elas. Era engraçado como seus corpos encharcados deslizavam na quadra do orfanato. Não se importavam com o fato de ficarem ralados ao executarem as manobras do break. A dança lhes resgatou da solidão e da revolta por terem sido enxotados naquele casarão assombroso aos cuidados daquelas mulheres ranzinzas, que mais pareciam demônios do que freiras, desde que nasceram. Por isso gostava de crianças, a fragilidade delas lhe comovia. Teve que amadurecer muito cedo. Talvez as pessoas achassem que foi um alívio quando eles completaram dezoito anos, mas não, eles não conseguiram aguentar tanto tempo. Com doze fugiram, e moraram por longos meses na rua, dormindo debaixo dos viadutos, vasculhando o lixo dos granfinos em busca do que comer antes que o desespero corroesse seus estômagos. Por vezes se arrependiam e acreditavam que deveriam ter suportado mais, só para não passar por aquilo. Pelo menos no orfanato suas necessidades básicas eram devidamente supridas. Foi aí que eles aprenderam a nunca desistir. Mas Brooke quebrara a promessa. Desistira da única coisa boa que tinha em sua vida; a dança. Eles foram obrigados a aprenderem a se virarem. Primeiro, foram os pequenos furtos nas feiras livres e nos mercados, depois assaltos, até que foram descobertos por Tom. Ele os tiraram da rua, lhes deram casa, alimento, roupa, uma vida de qualidade, mas foi aí que perceberam que ninguém dava nada sem a intenção de receber algo a altura em troca. Logo, estavam servindo de "mula" e vendendo drogas nas raves e baladas. Depois vieram as armas, os carros, as mulheres, as boates, o dinheiro fácil. E quando haviam si dado conta já era tarde demais pra voltar atrás. O que Brooke não podia perdoar, era a forma desumana que Tom lhe abandonara quando foi pega com alguns quilos de cocaína. Foi custoso para o advogado contratado pelo Estado convencer o juiz que ela era apenas uma usuária, o que era mentira, pois nunca havia sequer experimentado. Alguns meses de tratamento para vencer a falsa dependência num hospital psiquiátrico, e mais alguns para quitar sua dívida com a justiça por um roubo a mão armada a uma joalheria, que só então foi descoberto. Infelizmente um serviço voluntário não foi suficiente devido a sua extensa ficha suja. Ela penou ao ter que fingir ser uma viciada. Pois caso contrário se fosse acusada de traficante passaria toda sua juventude na cadeia. Fora descartada por Tom. E a lealdade cega de Francis a ele lhe irritava.

Arfou. Os apartamentos extrapolavam o limite de seu orçamento, e os quartinhos mais acessíveis a sua renda ficavam do outro lado da cidade.

A japonesa surgiu em sua bicicleta, e depois de estacioná-la em um poste retirou dois cappuccinos da cesta, oferecendo um a ela, e se sentando ao seu lado.

- Então? Conseguiu alguma coisa? - Misaki investigou.

Brooke deu um gole, e um profundo trago no cigarro, depois respondeu sorrindo:

Almas Dançando ( LESBIAN)Onde histórias criam vida. Descubra agora