"A Liberdade que Limita" | Stéfani P. Paludo

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Certa vez, lancei no grupo do Facebook a minha preocupação em relação aos escritores amadores se debruçarem mais no argumento do livro, na ideia central, do que na construção da história em si. Muitos buscam um conceito mirabolante, diferente de tudo que já foi feito, como se isso fosse possível, e pouco se dedicam à construção da narrativa, ao desenvolvimento dos personagens. Conseguem com isso sinopses impactantes, mas livros frágeis, que não se sustentam.

Pelos poucos parágrafos que li, não imagino que isso tenha acontecido com o livro "A Liberdade Que Limita".

Stéfani criou um belo conceito de distopia. Em seu mundo, as mulheres tornaram-se o topo da cadeia hierárquica, vivendo numa sociedade avançada, teoricamente feliz, estabelecida a partir da dominância sobre os homens escravizados por elas.

Por si só, essa ideia me chamou atenção, e fiquei ainda mais interessado nela ao perceber que Stéfani sabia sim como construir um cenário coerente com o contexto por ela própria estabelecido.

Gostava muito de Minerva, mas às vezes ela lhe irritava. Pra Minerva tudo sempre estava perfeito. Ela ficava em casa com suas namoradas, bebendo, transando, ou então, saía com elas para alguma festa. E a vida dela se resumia apenas a isso. Enquanto Luzia usava sua existência para as artes em geral, a amiga apenas vivia para as amantes. Desde que trouxe as duas garotas para morar com ela, mudou muito. Não dava mais atenção nenhuma para Luzia e se trancava no quarto por horas com as outras duas.

Vejam como a reflexão ciumenta de Luzia desenha bem a sociedade para a gente, como eu venho insistindo, sem que a narradora explique ao leitor didaticamente.

Entendemos pelo parágrafo que, ao menos as mais jovens, não têm a obrigação de trabalhar, podendo usufruir do dia sem qualquer tipo de responsabilidade engessada. Obviamente, este excesso de direitos gerará pessoas muitas vezes superficiais, que se preocupam com o puro e simples prazer. E o mais interessante é como essa intensidade física nas relações amorosas dessa sociedade será, a posteriori, confundida com o amor sincero.

Será que Minerva e as outras meninas com quem dividia o apartplug sentiriam uma atração ou uma paixão por ela? Poderia ser mais uma no relacionamento, se elas assim quisessem. De três pessoas passariam a ser quatro. Poderiam formar pares, e variar.

Não! Não eram assim que as coisas funcionavam! Minerva, Karen e Valéria estavam juntas porque se amavam e se sentiam bem estando as três juntas. Luzia jamais entenderia isso.

Longe de mim dizer que apenas relações monogâmicas podem desfrutar do amor (como bem disse Lulu Santos, considero justa toda forma de amor ;)), mas é inegável que, numa sociedade onde não há limites para as relações, é natural que o excesso de possibilidades, principalmente entre os jovens, gere inicialmente alguma confusão entre a paixão e o amor verdadeiro.

O mais interessante é que a escritora não só constrói uma distopia criativa como também subverte o gênero. Apresentando uma clássica protagonista insatisfeita com o sistema, mas que, aqui, não luta por liberdade e sim contra o excesso dela.

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