"Idílica Misantropia" | Ariel Kara Maschera

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Mal começo essa resenha e já farei um mea-culpa: eu não curto prólogos em que não há ação, onde a história é contextualizada por meio de uma narração em off (tipo um voice-over usado no cinema), que alguns chamam de prólogo expositivo

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Mal começo essa resenha e já farei um mea-culpa: eu não curto prólogos em que não há ação, onde a história é contextualizada por meio de uma narração em off (tipo um voice-over usado no cinema), que alguns chamam de prólogo expositivo.

Enquanto leio esse tipo de prólogo, sinto-me como numa sala de aula, recebendo instruções para a jornada que está por vir. E, ainda que admita que muitas vezes seja importante essa preparação e até mesmo interessante, prefiro ser jogado na história "verdadeira" de uma vez, como se lançado em alto mar.

Se for em meio à tempestade, então, melhor ainda.

Mas não nego que Ariel, o escritor de Idílica Misantropia, conduz bem seu prólogo, construindo a temperatura de sua história com sentenças absolutamente marcantes.

Sim, é verdade que todos nó somos capazes de nos perder nas nossas ilusões, mesmo os mais convictos. Mas, por acaso algum de vocês já perdeu o próprio reflexo no espelho da vida? Já sentiram vozes a todo tempo dizendo o que você devia ou não fazer?

"Mas, por acaso algum de vocês já perdeu o próprio reflexo no espelho da vida?" é uma frase tão poderosa que ela ficará marcada em nossa mente por toda a história, como uma flechada certeira, a estabelecer de uma só vez o clima do livro.

E se há algo que eu espero de um prólogo é que ele seja preciso. Não podem sobrar arestas, redundâncias. Quando se conta uma história prévia para o leitor, o escritor deve ser extremamente criterioso em escolher o que será contado e, principalmente, em como será contado.

Com sua loucura, a França se via em um grande perigo. O governo estava fraco, os motins eram frequentes, o país era alvo fácil para os Ingleses, mas Charles cavava buracos no jardim sem motivações lógicas e andava nu pelo palácio enquanto a pobreza assolava as suas terras.

Esse parágrafo é um ótimo exemplo do que quero dizer. Há uma infinidade de imagens que Ariel poderia evocar para mostrar ao leitor a loucura do exótico Rei da França, mas o escritor usa apenas duas:

Chales cavando buracos no jardim e andando nu pelo palácio.

Duas flechadas no alvo. Como representar melhor sua loucura? Com tão pouco, conseguimos imaginar o caos que estava não só a monarquia francesa, mas o próprio país.

Ao virar-se assustada, se deparou com uma figura bastante exótica para a época, um homem belo de cabelos escuros vestido com um manto branco e sandálias de couro, uma figura bastante familiar.

...

Seus cabelos eram longos e ondulados. A barba era cheia e o seu manto era vermelho e branco. Ajoelhou-se ao lado da pequena Jeanne. Ele tinha cheiro de jasmim.

Aqui, as flechas não são tão certeiras, na minha opinião. Há uma clara redundância na descrição do personagem e até mesmo um deslize em relação às cores do manto que ele usa, além de uma confusão incômoda no uso da palavra "exótica".

Exótico seria um julgamento do narrador? De qualquer forma, 'exótico" não evoca imagem alguma na mente do leitor. Ou, quando evoca, o faz de forma muito abstrata. Melhor seria se Ariel conduzisse um pouco melhor a imaginação do leitor, oferecendo a ele algum adjetivo que servisse como alicerce para ele construir o personagem em sua mente.

Bem, mas vamos para a ação de uma vez? Rs

É simples mas funcional a forma como Ariel descreve a indumentária do Lord Aeon.

... enquanto o cavaleiro de armadura brilhante adentrava o palácio real.

..., no momento em que os seus passos pesados ecoavam pela arquitetura do local devido ao som metálico que emanavam de suas grevas.

Ele se aproximou do cardeal ao lado do rei e se ajoelhou diante deste, de cabeça baixa, retirando o seu elmo ornamentado, cravejado de joias, revelando os seus longos cabelos louros quase que dourados que caíram sobre os seus ombros cobrindo o seu peito.

Perceba como Ariel fragmenta a descrição física do personagem, aproveitando as oportunidades oferecidas pela ação para desenvolver a aparência física de Lord Aeon. Estratégia que se destaca quando o Lord oferece uma reverência ao Cardeal, já que o escritor utiliza o momento para desenhar para o leitor seu elmo cravejado de joias e seus cabelos loiros.

O seu corpo musculoso que evidenciava o seu constante treinamento também parecia ter sido esculpido por artistas gregos.

Aqui, há um ponto interessante. Como o narrador me parece onisciente, não só revelando os pensamentos de personagens coadjuvantes, como fazendo alusões ao "futuro" da história, o destaque em relação ao corpo musculoso de Aeon não me parece um equívoco, mas acho estranha essa evocação quando sei que o personagem está em cena completamente escondido dentro de uma armadura metálica. Principalmente se considerarmos que o personagem não é necessariamente conhecido pelos outros no salão.

As moças do local não conseguiam desviar o olhar do homem por um segundo sequer, quando não estavam admiradas com os seus olhos, desejavam morder os seus lábios grossos e roseados contornados pelo seu maxilar robusto.

Já, aqui, há uma sequência de pensamento que começa na admiração dos olhos de Lord Aeon e termina no desejo de mordê-lo nos lábios. Um fluxo que me dá uma sensação de tempo transcorrido. Imagino, então, que fizesse mais sentido que esse parágrafo surgisse num momento posterior da cena, onde o jantar já estivesse em curso, e não imediatamente com a chegada do belo cavalheiro. Gera uma certa estranheza temporal.

Poderíamos considerar também que narrador não esteja falando apenas das mulheres no recinto, mas sim de todas que já conheceram Lord Aeon. "quando não estavam admiradas com os seus olhos, desejavam morder os seus lábios grossos" seria então a reação natural de todas as mulheres que já tiveram alguma proximidade com o personagem. Mais um indício da onisciência do narrador. Porém, caso seja essa a intenção, seria então mais apropriado deixá-la um pouco mais clara para o leitor.

Todos esses são detalhes da narrativa e não da história, ou seja, questões presentes na FORMA de se contar uma história. Resolvi trazê-los porque percebo que em muitos livros no Wattpad há pequenas incoerências na narrativa, difíceis de serem percebidas, que acabam por enfraquecer o livro em si. Escolhas feitas "inconscientemente" que muitas vezes não são a melhor maneira de se comunicar uma ideia ao leitor. O que não é o caso em Idílica Misantropia, que, apesar de alguns errinhos, possuiu uma história e uma narrativa cativantes.

Na verdade, e aqui vai uma segunda admissão, este é um livro que merecia uma resenha mais completa, que fizesse justiça à sua ótima qualidade. Imagino que Ariel tenha feito um belo trabalho de pesquisa, algo que infelizmente é raro na nossa querida plataforma.

Deixo aqui meus parabéns ao escritor e o pedido de desculpas por ter sido tão específico em meus pontos.

...

Bem, mais uma resenha fechada. Essa foi mais simples, com temas "menores", mas que eu acho que pode a abrir os olhos de muitos amigos.

Agradeço a todos que votaram, comentariam, debateram e me ajudaram a divulgar o projeto. Um abraço apertado em todos vocês.

Vamos à perguntinha do capítulo.

- Vejo que muitos estão em busca de leitores beta para seus livros. Então, porque não trocarmos leituras beta? Quem está disponível para "betar" um livro de um amigo do grupo? Quem quer ter um livro "betado" por alguém?

Seria uma boa experiência para nosso futuro grupo no Whatsapp que prometo um dia fazer. (rs)

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