"Não Me TOC" | Maria Eduarda Duarte

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Escolher um protagonista é praticamente definir a história que se vai contar. E por mais que uma história seja nada mais que um recorte da vida de um personagem, o escritor tem obrigação de conhecer seu protagonista com profundidade.

Conhecê-lo com profundidade não se restringe apenas a conhecer seu passado, mas, principalmente, compreender como essa trajetória afetou o personagem e como ele tende a reagir às diferentes situações.

Não bastam as fichas com as características físicas e emocionais de nossos personagens. Muitas vezes só conseguimos de fato entendê-los na metade do livro, depois de alguns conflitos, que os forçam a se revelar para a gente.

E, quanto mais distante é a realidade dos nossos protagonistas da nossa, mais difícil é para decifrá-los.

Não sei se a Maria Eduarda, escritora de Não Me TOC, sofre ou já sofreu de algum transtorno psicológico, mas, sem dúvida, Adams, seu protagonista, foi um grande desafio para ser construído.

Obviamente, quando pretendemos criar um personagem tão particular, devemos nos aprofundar na pesquisa, pois será ela a nos responder como uma pessoa é afetada pela doença, em como o doente desenvolve suas relações e em como ele enfrenta suas adversidades. Mas, ainda que façamos a melhor pesquisa, existirão questões que o escritor só conseguirá alcançar por meio da sua sensibilidade e criatividade.

Um indivíduo é resultado de um acúmulo de particularidades que, em sua maioria, são resultantes da associação de suas experiências em vida e da forma como sua mente as interpreta. Daí a complexidade do ser, que o escritor tem de buscar quando constrói um personagem, por mais simples que ele seja.

Por isso, desde já, parabenizo a Eduarda por conseguir apresentar seu protagonista com suas inúmeras camadas, fazendo com que o leitor compreenda não só como a doença o afeta, mas, principalmente, como ele responde à própria doença.

Colocou um sorriso falso e tocou no máximo de coisas possíveis quando a porta se abriu, em sua mente, os números iam passando – um, dois, três, quatro, cinco (...), nove, dez. Precisava contar mais, precisava respirar mais. Um, toque no vaso. Dois, na mesa. Três, nas paredes. Quatro, sorria – mostre os dentes um pouco sujos de comida para fingir que não está querendo vomitar. Cinco, não use luvas. Seis, deixe a blusa malpassada para fingir desleixo. Sete, faça o mesmo com a calça. Oito, aperte a mão. Nove, aceite comida. Des, seja o que for, não pire.

Como não compartilho da mesma doença do protagonista, eu, num primeiro momento, não consigo entender o porquê de Adams tocar em tudo. Imagino que ele esteja listando mentalmente todas as suas tarefas com o objetivo de se manter controlado, por conta da "boa convivência social", mas eu, como leitor, ainda não sei o que levou o protagonista a seguir essa "estratégia". E é exatamente a curiosidade em compreender melhor essa mente tão diferente da minha, que me faz seguir na história.

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