Prólogo.

523 53 36
                                    

A chuva cai torrencialmente, escorrendo em pequenos veios pela janela. Vejo a figura obscura através da cortina de água, pelas memórias recentes de Drogo, enquanto enxuga os cabelos e veste uma camiseta seca.

Uma garota jovem, molhada da cabeça aos pés, caminha em direção à mansão.

- Apenas outra Coitadinha, Nicolae. Deve bater para pedir ajuda.

Olho para ele, com cautela.

- E é seguro deixá-la entrar?

Drogo me direciona um olhar sarcástico.

- Isso é uma pergunta séria, Nicolae? Não tenho certeza de que seja seguro para ela!

- Você tem certeza de que não é ninguém disfarçado? Lorie pressentiu sua presença e ela não costuma rastrear humanos...

Ouço uma batida delicada na porta. Drogo balança a cabeça com um sorriso irônico.

- Se você estiver muito desconfiado de meu julgamento, posso revistar a moça. Será um prazer...

Reviro os olhos, mas deixo escapar um sorriso. Depois de quase meio século de convivência, uma relação de respeito se estabeleceu entre nós, embora Drogo nem sempre seja fácil de lidar.

Mas sua intenção geralmente é boa. Sei que ele almeja ajudá-la.

Ele complementa sua resposta, dando de ombros, como uma trégua pela malcriação anterior.

-  Eu a observei por algum tempo, tentando desatolar o carro. Há algo de estranho nela, não sei explicar... Mas a moça não é perigosa, Nicolae! Veja por si mesmo, se quiser...

Assinto, não completamente convencido. As batidas tornam-se mais insistentes.

Que perigo poderia representar uma garota assustada e com frio para seres como nós?

Olho para meu irmão, um pouco envergonhado por minha hesitação em oferecer ajuda.

- Vou apenas me certificar de que Lorie está... tranquila. Abra a porta para a jovem e a acomode, por favor.

Vamos ver se a garota passa por meu crivo...

Enquanto Drogo desce as escadas, me dirijo ao quarto de Lorie. Sua expressão, serena e vulnerável, me mostra que ela está completamente adormecida, parecendo quase desaparecer sob os panos da cama.

Às vezes me esqueço de que ela é tão pequena...

Acaricio seus cabelos pálidos. Por algum motivo, nossa irmã não funciona como o resto de nós. Seu pequeno corpo tem um sede menor, mas uma necessidade de repouso quase humana.

Sem a expressão de quem carrega a eternidade nos olhos, Lorie parece uma criança comum e quase tenho inveja de minha irmã por conseguir encurtar seus dias com sonhos. Mas essa sensação passa rapidamente.

Fecho cuidadosamente a porta de seu quarto e ouço Drogo chamar meu nome. Ele sobe as escadas e passa por mim com um ar cênico, enquanto mentaliza as roupas molhadas da jovem, desenhando suas curvas.

Sei o que ele está fazendo...

Dou um soco em seu braço pela brincadeira de mau gosto, e ele ri.

Desço as escadas enquanto a observo e por um momento, percebo como o olhar distraído de Drogo não a fez justiça. Seus traços são delicados, com maçãs do rosto definidas, pintadas por algumas sardas descuidadas. Ela parece bastante tímida, com um ar desastrado adorável com suas roupas sujas de lama.

Um vento sorrateiro da brecha da porta me traz seu cheiro morno e sinto minha garganta queimar de sede, o que me surpreende.

Tento desviar o olhar da visibilidade perturbadora que tenho do contorno de seus seios pela blusa de malha colada ao seu corpo, e a sensação de sede se confunde com algo mais. Bloqueio o fluxo de meus pensamentos.

Drogo, você me paga.

Mas sei que estou sendo hipócrita.

Quando seus grandes olhos verdes âmbar se cruzam com os meus, vejo seu rosto corar, e seu olhar me desestabiliza.

Estou acostumado a garotas se impressionarem com nossa aparência. Somos feitos para sermos atrativos.

Mas há algo mais em seus olhos. Algo familiar, que me assusta e me intriga.

E quando tento entender seus pensamentos, algo ainda mais surpreendente acontece.

Definitivamente não é apenas outra coitadinha. - penso, enquanto me aproximo, armado de meu melhor sorriso, dessa estranha que uma noite chuvosa colocou em nossa porta.

O imortal - Is it Love?Onde histórias criam vida. Descubra agora