Desejos e Obrigações

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Mal nasce o dia e o som do telefone de Nicolae vibrando em suas vestes me tira da nuvem de encantamento.  

- Peter? Aconteceu alguma coisa?... Ok, estou a caminho!

A expressão alegre que estampava seu rosto é rapidamente substituída por um olhar aflito. Nicolae suspira, enquanto termina de abotoar sua camisa. Antes que ele desligue, eu já estou sentada, a espera de uma explicação. 

- Desculpe, Victória! Preciso voltar para a mansão. Problemas com a Lorie...

Ele não parece nada feliz. Um calafrio percorre minha espinha. Algo muito ruim está acontecendo com a pequena vampira para deixar Nicolae nesse estado. 

-  Ela... Ela está bem? 

-  Vai ficar, não se preocupe! Já passamos por isso antes!

- Não há nada que eu possa fazer para ajudar? 

Nicolae se aproxima, segurando meu rosto com delicadeza.

-  Você já fez mais do que imagina! 

Após um beijo rápido, sigo Nicolae apressadamente em direção ao carro, nem um pouco convencida por suas palavras vagas. Nossos dedos continuam entrelaçados enquanto dirigimos até minha casa, mas isso não ameniza a tensão que nos domina. 

Quando chegamos na porta de meu prédio, ele cola os seus lábios nos meus.

- Saiba que somente algo muito importante me tiraria do seu lado nesse momento... 

Não tenho certeza se estou diante de um pedido de desculpas ou de um lamento, mas isso não me tranquiliza nem um pouco... O que está acontecendo com Lorie? 

Apesar das confissões de Nicolae me tornarem as particularidades de sua transformação bem conhecidas, ele não me revelou nada sobre os irmãos.

Entro no chuveiro, deixando a água quente cair sobre minhas costas. A noite anterior foi de tantas formas intensa, que preciso de um tempo, deitada em minha cama. 

Primeiro, os conselhos sombrios da cigana Iohana me vem a recordação, fazendo eco com as últimas palavras de minha mãe.

"Você carrega a luz dos Veidas mas é o sangue inocente derramado pelos Zingari que guia seu destino. Abrace as sombras que estão dentro de você. Elas são parte do que você é. E você somente cumprirá seu destino quando aceitá-las "

Não compreendo tudo o que ela me disse. Mas apesar disso, suas palavras fazem algum sentido para mim.

Quando criança, sempre houve uma parte de mim que eu chamava de "a outra Victória". Em minhas primeiras lembranças, eu sonhava com um mundo em constante destruição, abrindo suas portas e me convidando a entrar. Eu convivia, com suas criaturas, que pareciam me conhecer. 

Quando contei para minha mãe, ela pareceu muito assustada.

"Você nunca, nunca deve entrar lá! Você ouviu? Se a porta se abrir, você deve fechá-la! Há coisas más, muito más do outro lado! A garota do outro lado é perigosa! Você deve esquecê-la, para o seu próprio bem!"

Aprendi, com o tempo, a esconder a outra Victória, mas por muitos anos, eu senti falta dela. Era como se algo de livre e intenso em mim houvesse se perdido quando comecei a temê-la como se fosse suja e indigna. E foi assim que em minha vida, deixei a outra Victória adormecida, soterrada pelas minhas obrigações.

Eu a havia delegado ao passado e eu acreditei que ela nunca havia existido, senão em minha imaginação de criança.

Os estudos me tornaram ainda mais pragmática sobre essas memórias. Como eu poderia acreditar em algo que eu não era capaz de explicar pelas leis desse mundo?

O imortal - Is it Love?Onde histórias criam vida. Descubra agora