Alguém Está Fingindo Ser Minha Esposa

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Às vezes, eu pego Susan sorrindo pra mim sem qualquer motivo. Isso já aconteceu mais de uma vez. Estamos assistindo TV, apenas nós dois, como sempre. E então, percebo pelo canto dos meus olhos que ela está olhando pra mim e não pra TV. A cabeça virada a 90 graus em minha direção, um sorriso congelado em seu rosto, que só consigo ver pela minha visão periférica, alguma cosia surreal em sua expressão. Quando me viro para olha-la, seus olhos estão na TV novamente. Eu perguntei sobre isso na primeira vez que notei, ela negou. Fiquei com medo de parecer louco se falasse sobre isso mais uma vez, então nunca mais perguntei.

Mas havia outras coisas também. Susan tinha uma irmã gêmea, que morreu no nascimento. Ela nunca fala sobre isso. Na semana passada, eu apaguei as luzes e fechei meus olhos. Susan já estava dormindo. Eu acordei no meio da noite e encontrei o seu lado da cama vazio. Me virei e ela tinha aquele mesmo sorriso, ao lado da cama, me assistindo.

- Querida, o que você tá fazendo? 

Nada.

- Querida?

Apenas o sorriso.

Ela voltou para a cama e se enviou debaixo das cobertas como se nada tivesse acontecido. 

- Há quanto tempo você estava em pé ali? - eu perguntei, e ela não respondeu. Mas o seu lado da cama estava frio, e o carpete ainda tinha a marca de seus pés no lugar onde estava antes.

Porém não foi agora que essa loucura começou. Por um longo tempo, tenho tentado me convencer que é tudo coisa da minha cabeça, mas não é. Ela não é a Susan. Eu comecei a fazer esses pequenos "testes", assim eu poderia ter certeza. Eu colocava filmes que já tínhamos assistidos na TV, apenas pra ver se ela falaria alguma coisa; comecei a contar histórias que eu já tinha contado. Ela sorria, nunca comentou nada. Eu perguntei pra ela descaradamente na última vez. Eu cheguei em casa e ela estava comendo peixe, e a Susan nunca come peixe, a Susan odeia peixe. 

- Salmão? - eu perguntei.

- De lata - ela respondeu.

Eu sentei na sua frente e ela sorriu. Eu tava conversando com o diretor Dawson sobre a Sara, hoje. 

- Sara? 

- Sim, a nossa filha Sara - eu disse. 

Ela riu.

- Certo. E o que ele disse? 

- Susan, o nome da nossa filha é Camille. 

Ela parou o garfo na metade do caminho para a boca e levantou os olhos para mim. Lentamente, colocou o garfo de volta no prato.

- Quem é você? - perguntei.

- Eu tô indo pra cama - ela disse, levantando.

Eu dormi no quarto de visita naquela noite, com a porta trancada. Fugi no dia seguinte, levei Camille comigo. Passamos a noite em um hotel barato. 

- Onde a mamãe tá? - Camille perguntou, enquanto eu a colocava na cama. 

- Eu não sei, querida. Mas se você ouvir algum barulho, qualquer coisa mesmo, você me acorda, ok?

- Ok.

Naquela noite, sonhei com uma mulher que parecia com Susan, uma mulher que queria a vida de sua irmã, a vida que ela nunca teve. Camille me acordou de manhã, ela esta a comendo um cupcake.

- Filha, você pegou isso no frigobar? 

- Não a mamãe que me deu.

Eu congelei. 

- A mamãe esteve aqui?

Camille confirmou.

- Sim, ela tava bem ali, perto da cama. Ela ficou ali por um bom tempo. 

- E por que você não me acordou, Camille?

- Eu ia, mas aí a mamãe fez assim. - Camille colocou os dedos sobre os lábios e fez "psiu". 

Olhei para baixo. O carpete estava fundando no lugar em que Camille disse que Susan estivera.

- Tá tudo bem, papai. Ela estava sorrindo. 

Na noite seguinte, nós estávamos quase fora da cidade, numa pousada perto da fronteira. Eu desliguei as luzes, coloquei Camille na cama e esperei, sentado em uma poltrona, em silêncio. Eu sabia que ela viria. 

Estava um silêncio mortal e eu estava quase caindo no sono, quando ouvi as dobradiças rangendo. Eu abri meus olhos e esperei. Era como se a porta estivesse em câmera lenta. Ela entrou. Nenhum barulho além do ranger da porta. Andou até a cama de Camille, aquele sorriso estava em seu rosto. Eu me levantei, fiquei atrás dela, ela não podia me ver. Seus olhos estavam fixos em Camille. 

- Levante, querida. Nós estamos indo pra casa - ela sussurrou. 

Ela não olhou pra trás. Ela nunca sequer viu a faca que eu enfiei nela. 

O advogado depois em disse que não me foi concedido a redução de pena, e que eu terei que esperar o julgamento em uma instituição mental.

- Síndrome de Capgras - ele disse. - É uma síndrome que causa erros na identificação, não muito diferente de Fregoli. Uma desordem com a qual a pessoa tem a certeza de que um amigo, cônjuge, pai ou algum outro membro da família foi substituído por um impostor de aparência idêntica. 

Eu falei pra ele que estava tentando proteger a minha filha, eu disse que aquela mulher não era a Susan. Ainda assim os jornais diziam: "Engenheiro sequestra filha e mata esposa". Não era a Susan, eu disse pra ele de novo, e de novo, e de novo. Ele disse que eu receberia de 25 anos à perpétua, mas que talvez pudéssemos apelar para insanidade. 

Eles me trancaram na última noite, minha primeira noite na instituição mental. Camille está com o serviço social, me disseram. Meu quarto é coberto de material almofadado, da parede até o teto. Uma cela acolchoada, é como eles chamam, pra que eu não possa me machucar. Me deram algumas pílulas pra que eu dormisse rápido. 

Alguma coisa me acordou minutos antes de amanhecer. No momento em que abri meus olhos, tudo estava silencioso. Fui até a porta e espiei pela pequena janela. O corredor estava deserto. Olhei para trás. Perto da minha cama, o chão almofadado estava fundado no formato de dois pés. 

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