#28

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Se tem algo que eu não gostaria que ocorresse é que eu me tornasse apenas uma diversão para um homem. Gosto de Henri, gosto mesmo... mas mesmo assim, esses pensamentos invadem minha mente de forma bruta.
Volto a realidade, com algumas batidas na porta.

- senhora...? - uma empregada abre a porta assim que eu autorizo a sua entrada.

- sim...? - respondo sem parar de pentear o meu cabelo, a observando pelo reflexo do espelho.

- o alfa mandou que tirássemos as medidas do seu vestido - ela diz entrando no quarto, junto com mais quatro mulheres de meia idade.

- mas que vestido? - coloco a escova de cabelos na penteadeira e me viro para elas.

- do seu aniversário, senhora! - uma mulher responde animada, tirando de uma grande bolsa alguns tecidos.

- quando será a festa? - arregalo os olhos.

- daqui a três dias - uma delas responde.

- certo...- suspiro fundo, sentindo milhares de borboletas na minha barriga.

(...)

Depois de quase quatro horas de alfinetes aqui, medidas lá, e tecidos por todo o quarto, finalmente elas terminaram, e levaram o vestido para a confecção. Qualquer outra menina ficaria estonteante com essa rotina, mas é certo que os livros de história só contam as partes legais. Festas, bons partidos, vestidos feitos sob medida especialmente para você... se for pensar assim, é realmente legal ser irmã do alfa. Mas o que eu queria, de verdade, é liberdade...
Sair pela floresta sem guardas atrás, ir ao vilarejo...

Tudo que é bom nessa vida, cobra caro mais na frente...

- Safira...? - Heitor diz entrando no quarto assim que as costureiras saem.

- diga...- respondo sentando na cama.

- você quer uma festa? - ele pergunta.

- como assim? - indago sem entender.

- isso é um pouco de pressão minha e do Daniel, mas e você? Você quer uma festa de aniversário? - ele pergunta.

- por que isso agora? - pergunto.

- porque essa seria a pergunta que o nosso pai te faria, se estivesse vivo...- ele responde olhando em meus olhos.

O olhar de Heitor sempre foi muito expressivo, papai dizia que essa característica ele puxou de nossa mãe. Parece que ele consegue detectar tudo que está se passando em nosso interior.

- não vejo problema em uma festa...- digo olhando para o chão - ...mas eu quero sair...

- "sair"? - ele ergue uma das sobrancelhas.

- sim... eu quero sair! - explico cruzando os braços.

- você pode sair! - ele ri.

- eu quero sair sem guardas na minha cola - reviro os olhos.

- mas pra onde você quer ir...? - ele suspira cansado.

- quero ir pro mundo dos humanos - digo com medo de seu olhar.

Um silêncio paira no ar, até as gargalhadas de Heitor quebrarem o clima.

- do que está rindo, idiota? - dou um soco em seu braço.

- você está completamente louca! - ele diz se recompondo.

- na verdade, nunca estive tão lúcida! - levando da cama - não podem me manter presa nesse castelo até os meus trinta anos! - argumento.

- ok, manteremos até os cinquenta se você preferir - ele zomba.

- Heitor...- suplico.

- está bem, verei isso depois - ele levanta.

- veja com carinho - digo o acompanhando até a porta.

(...)

Depois que Heitor saiu do quarto, procuro no meio das minhas roupas algo que seja confortável para as aulas de luta que viriam.
Como não encontrei nada, peço a ajuda da Dinah.

(...)

Sem perceber o tempo passar, sou avisada de que meus irmãos (novamente) não poderem jantar comigo. Então vou para o meu quarto e percebo que já tinha algo para comer lá.
Após a janta, me preparo para dormir.
Em frente a penteadeira, vejo quando as portas da varanda se abrem com força e o vento as fazem bater sem parar na parede. Levanto com pressa e as fecho, logo as luzes do quarto começam a falhar.

- mas que droga...- murmuro sentindo um arrepio percorrer por todo o meu corpo.

- não pode ficar aqui, senhorita! - uma voz de criança soa ao pé do meu ouvido.

Sinto meu coração pular.

- quem é você? - pergunto com a voz falha.

- está correndo um grande perigo, senhorita! - o vulto branco passa no meio do quarto.

- que perigo...? - pergunto olhando para todos os cantos.

- a guerra irá aonde você ir! - a voz sussurra em algum lugar do quarto.

O vulto era rápido como um raio, estava sempre se movimentando.

- mas temos um exército grande! - falo rezando mentalmente para as luzes não se apagarem.

- "... os filhos da lua, e os filhos da escuridão irão guerrear..." - a voz diz.

- a profecia! - digo reconhecendo o que o vulto acaba de falar.

- eu irei lutar? - ouso perguntar.

- não, senhora... - o vulto para no meio do quarto.

- o que devo temer? - pergunto.

- deve temer a si mesma - o vulto sai pela porta da varanda, as abrindo novamente.

Corro e as fecho de novo. Olho em volta e vejo que o quarto estava cheio de neve, por causa do vento forte.

O que acabou de acontecer?...

Saio do quarto as pressas, e entro na sala do trono. Daniel e Heitor estavam em uma reunião, e pareciam bem compenetrados. Mas logo todos os olhares se voltam para mim.

Devo lembrar que estou com uma camisola.

- saiam! - Heitor ordena.

Logo a sala fica vazia em questão de segundos.

- o que pensa que está fazendo? - Daniel vem até mim, mas o seu olhar muda para preocupação.

- está pálida! - Heitor toca em minha testa - está doente?

Eles me colocam sentada em uma poltrona, e depois de alguns minutos, eu consigo explicar o que acabara de acontecer.

- o que seria esse vulto? - Daniel pergunta.

- ela foi visitada pela vidente - Heitor fala com um certo medo.

- por que essa cara? - pergunto sentindo as batidas do meu coração ficarem mais rápidas.

- ela vai voltar - Daniel olha pra Heitor, como se eles já esperassem por isso.

Dois mundosOnde histórias criam vida. Descubra agora