DIA 38

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O Violador gostava de me espancar antes de me violar, mas desta vez não me tocou na cara. Vão venderme a outros e querem que esteja bonita. Mas isso não o impediu de me pontapear, esmurrar e de me esbofetear em todos as outras partes do corpo. Quando finalmente saiu de dentro de mim, disse, ‘Queres a tua filha viva ou morta? Atreve-te outra vez, que lhe corto o pescoço’. Depois olhou de soslaio para mim, enquanto mostrava os dentes sujos. ‘Acho que também a vou violar antes de a matar’. Sou uma arruaceira, disseram eles. Não precisam dos problemas. A Angelina disse-me depois que
tinham pensado em matar-me, mas que valho mais viva. Por agora. Parecia estar a gostar de me dizer que a Liliana estava agora a viver com a Natália. Disse que os orfanatos são pobres e que, se puderem ver-se livres de uma criança, é o que farão. Antes de sair, a Angelina trancou-me no quarto e, como castigo, tirou-me algumas coisas que fui
colecionando enquanto aqui estive. Não me importa que tenha levado as minhas revistas ou as cartas de jogar que a Sasha me deu. Só consigo pensar na Liliana com a Natália. O que é que a Natália lhe anda a contar sobre mim? Disse à Liliana que já não gosto dela? Que já não a quero? Será que vai vender a minha querida bebé aos traficantes? Será que a vai alimentar e mantê-la aconchegada? Penso sobre o que o Violador me disse. Será que ele irá cumprir as ameaças contra a Liliana? Não suporto todos os pensamentos e receios que gritam na minha cabeça. Eu aguento a tortura exterior, mas a tortura interior é muito, mas muito pior. Quero matá-los a todos. Tenho fantasias sobre como fazê-lo. Dar-lhe um tiro seria bom demais.
Quero magoá-los e causar-lhes agonia. Uma faca, talvez, ou uma barra de ferro – algo que os faça sofrer da forma como me fazem sofrer a mim e às outras raparigas. Mas não há nada que possa fazer. O ano passado, a Liliana queria que lhe comprasse um relógio. Viu o meu e ficou obcecada com ele,
como só uma criança consegue ficar. “Porque é que tu o usas?”; “Para que é que serve?”; “As horas são iguais em todo o mundo?”; “Quem é que decide as horas?” Fazia-me perguntas de forma ininterrupta até que a deixei usá-lo. Os relógios são inúteis aqui. Não preciso de relógio para ficar sentada à espera e ver os segundos a
passar, dando a sensação de que passou uma vida inteira. Não preciso de um relógio para saber que agora me vai levar um tempo infinito a ganhar a confiança dos meus novos proprietários. E, sem a confiança deles, nem me atrevo a sonhar em regressar para a Liliana. Eles irão estar de olho em todos os meus passos. Por isso porto-me bem e vou fazê-los pensar que sou a melhor escrava sexual que já tiveram. E um dia terei outra oportunidade. Tenho que acreditar nisso, senão enlouqueço.

TRAFICADA : Sibel Hodge  (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora