Beijei Andrey (piloto)

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Me analisava.

Andávamos em passos e tropeços, bêbados como se fôssemos velhos amigos, bêbados como se fôssemos grandes conhecidos. Chegamos ao assoalho de minha casa, onde uma luz fraca estava acessas, moscas e pequenas mariposas rodeavam a luz, em busca de aquecimento na noite fria de inverno.
Ambos de nós, eu e Andrey usávamos blusões e gorros, estava frio o suficiente para vermos as gotículas de ar se condensar ao sair de nossas bocas.
Paramos frente a frente na porta. Nos encaramos rindo, ele estava com as mãos no meu ombro, e naquele instante, algo tão rápido ocorreu. Andrey me beijou, e eu deixei. Sempre sabemos quando vamos ser beijados. Então eu deixei.
Ele apenas pressionou seus lábios ao meu, como um beijo de despedida e antes que aquilo piorasse em minha mente escutei minha própria voz dizer: Sabrina.
O empurrei sutilmente e entrei em minha casa.

Me analiso no espelho.
Eu me sinto confuso.
Tenho a aparecia um pouco jocosa, e também patética. Sou alto, tenho os cabelos curtos e castanhos claros, quase louro, maxilar quadrado como o de meu pai, um nariz de batata refinado, sou meio parrudo, as orelhas são um tanto à mostra, não são grande também não são pequenas, uma delas , — a esquerda —, inclusive é meio deformada, não gosto dessa. Minha pele está corada, do banho quente; espelho embaçado, mas consigo ver através deles os meus olhos murchos e azuis acizentado.

Eu pareço um pateta. E sou. Tenho o raciocínio meio retardado, não que eu seja um. Mas sou o típico cara lerdo. O bonitão burro do colégio, a lesma do exército, o lerdo do escritório, o marido que quebra ao invés de ajudar, o pai desastrado e retardado.

Sinto que o efeito do álcool está passando, já foram-se 40 minutos desde que cheguei.

Mãos macias e delicadas me cercam, sobem em meu peitoral, ela me abraça sutilmente por trás e o rosto dela aparece na lateral do meu braço. Ela é tão pequena e delicada, que mal alcança meus ombros sem antes estar na ponta dos pés. Ela da um sorriso.

— O que meu ursinho está pensando?

— Pensei que estivesse voltado a dormir — Falei nos olhando pelo reflexo do espelho

— É, eu cochilei o esperando. — houve um silêncio, ambos nos olhamos no reflexo — Como foi a inauguração?

— F-foi-foi legal. Bebi um pouco.

— Deu para perceber, derrubou o abajur da sala... — ela riu

Eu ri. Foi assim que ela despertou assustada.

— Vou te dar um desconto, você é desastrado mesmo não bêbado — sussurrou ela

Me virei a olhando.  Eu a tinha em minhas mãos, me apoio sobre a bancada de mármore de pia, quase me sentando em cima, estiquei as pernas ficando a altura dela, lhe puxei para perto. Sentia-a em minhas mãos grossas o tecido macio da camisola de cetim cor branca espuma.

A olhei, os olhos castanhos que tanto amava, os cabelos escuros que eu adorava. Ela era morena, e minha morena favorita.
Lhe dei um beijo. Mas Andrey me vem à cabeça e como se aquilo provocasse uma repulsa eu distancio sutilmente, sem que ela percebesse.
Não sinto nada. É estranho agora.

— Vamos nos deitar querido....

Sabrina, segurou meu rosto, me olhou nos olhos. Senti suas mãos pequena de dedos finos e delicados tocar-me a pele. No início eu me sentia um monstro por ser maior que ela, ela tem apenas um metro e meio, e eu exatos um metro e noventa e oito. E eu sempre fui meio grandão, parrudão, eu tinha 120 quilos bem distribuídos, apenas de pura massa muscular. Houve uma época em que tive depressão e cheguei a pesar 130 com uma barriga extremamente flácida e saliente, e depois da depressão passei a fazer academia. A psicóloga falou que me faria bem, me fez bem, me sinto bem. Eu era grandão, braços e ombros largos, pelos que me percorriam o peitoral e a silhueta. Eu sempre, — tirando os anos de depressão —, cuidei de mim, do meu corpo. Enfim, essa história não é sobre o meu tamanho, ou sobre meu jeito patético, minha lerdeza ou o que me tornei e sou. E sim sobre o que eu acho ter descoberto...

Gay, minha mulher tem um amigo gay, o nome dele é Andrey. Nunca fui amigo dele, nem o conheço. Não que eu tenha algum preconceito. Talvez eu me sinta apenas ameaçado.
No início, quando nos mudamos para cá, há mais ou menos quinze anos atrás (o período que estou casado com Sabrina). E o vi em minha cozinha eu surtei de ciúmes quando ele foi embora.

Andrey era alto, talvez um e noventa. Ele era bem... digamos másculo. Foi difícil engolir que ele era gay e nosso novo vizinho.  Eu fiquei estarrecido quando ele mesmo disse ser gay, ele não era o tipo gay, ele era do tipo gay não gay.

Desculpa. Na minha concepção de vida gay era qualquer homem que desmunhecassem, que fosse frouxo, que andasse feito mulher. E não alguém com masculinidade aflorada. Creio que sou heteronormativo, como disse Sabrina uma vez por eu desconfiar de Andrey. Não sei ao certo o que essa palavra significa.

Eu só não conhecia essas coisas. Nunca tive amigos viados. Na verdade eu os queria longe. Pois o que eles falariam? De jogos? Mulheres? Carros? Não, gays não curtem essas paradas. Pelo menos era o que eu achava até conhecer Andrey. Apesar dele gesticular e as vezes fazer vozinha de viado, eu nunca iria ver como tal nem se ele colocasse uma saia. Assumo como eu, que em época de trote colegial os garotos vestiam-se de meninas, e eu por exemplo também, e ainda mantinha minha sexualidade intacta.

Na época em que o conheci Andrey tinha um bigode, agora ele tem uma barba bem cuidada, ele não era forte, mas cuidava de si também, eu o via sair para correr durante as manhãs, e mudei de academia quando notei fazer no mesmo lugar que ele. Andrey gostava de jogos de futebol, cervejas, e de carros, só não de mulher. Então dava para manter papo com ele sem me sentir um estranho.

Antes de me acostumar com ele tive diversos surtos de ciúme, e preconceito como mudar de academia ou não entrar nos mesmos locais que ele. Uma vez pensei que ele poderia estar fingindo para comer minha mulher debaixo de meu nariz. Escutei uma história parecida no bar.

Então eu o conheço a quinze anos, e as coisas mudaram até então. Deixei de lado a implicância. E hoje o beijei, mesmo bebado eu iria me lembrar.
Houve uma inauguração de uma bar de um colega meu, Laura estava com cólica o que fez com Sabrina ficasse em casa com ela, Laura tem apenas três anos. Eu fui, e encontrei Andrey lá, não nos falamos, mas voltamos juntos para a casa.

Agora estou deitado. Pensando no que fiz, no que aconteceu. Merda.
Beijei Andrey.

Antes que AmanheçaOnde histórias criam vida. Descubra agora