Eu sou, definitivamente, muito azarada. Por que a tal da Petra não nos interrompeu uma meia hora depois, quando eu tivesse, pelo menos, conseguido alguns orgasmos?
A minha vida é um eterno jogo de futebol onde a bola só bate na trave, penso, contendo um suspiro.
- Nós não precisamos conversar, Jake. Eu não perguntei se você tinha namorada, então, tecnicamente, você não mentiu para mim. Eu li em algum lugar sobre a Petra, mas não lembrei - explico, evitando olhar nos olhos dele. Abro a porta do carro. - Nós concordamos que o clima acabou, não? Melhor eu ir. Obrigada pela companhia, foi um aniversário um tanto quanto...inusitado.
Pego a minha bolsa e saio, fechando a porta com cuidado (é um Porsche, oras). Ando até o elevador sem olhar para trás, sentindo os meus olhos embaçados pelas lágrimas - que eu não permitiria que caíssem. Jamais.
No meio do caminho, sinto a mão do Jake segurar o meu braço mais uma vez.
- Lynn, me perdoe.
- Pelo quê, Jake? Não há nada a perdoar. Não é como se você tivesse me prometido nada.
- Então, qual é o problema?
- O problema é que a sua namorada ligou enquanto você estava com os meus peitos na boca. Se isso não é suficiente para me fazer sentir uma vagabunda, eu não sei o que é! - sibilo entre os dentes, puta da vida com ele e comigo mesma.
Ele é um canalha e eu fiz papel de idiota. E o pior é que nem tinha transado!
- Eu e a Petra, nós...
- Para, Jake. Você não me deve explicações e o momento passou, de qualquer maneira - eu o interrompo, recomeçando a andar. - Tenha um ótimo dia com a Petra, amanhã. Boa noite.
A porta do elevador abre assim que eu aperto o botão e eu praticamente me jogo para dentro, temendo que ele me dirija um olhar molha calcinha qualquer e eu mude de idéia. No meu quarto, eu tiro a roupa e resolvo tomar um banho frio, enchendo a banheira com a água mais gelada que consigo. Fico lá por um bom tempo, lembrando de cada beijo, de cada toque.
Esta será uma longa noite. Feliz aniversário para mim.
***
Acordo após uma noite péssima, dividida entre pensar no Jake e sonhar com ele. A minha cara está horrível e a minha vontade de sair do quarto é nenhuma, mas tenho que me arrumar e tomar café da manhã porque planejo aproveitar o dia para conhecer Stratford-Upon-Avon, cidade onde Shakespeare viveu.
Peço algumas informações na recepção do hotel e agendo um transfer por telefone. O motorista promete chegar em meia hora e eu decido esperá-lo no lobby, sentando em uma poltrona um pouco mais afastada. Enfio o rosto em um jornal para não ser vista se Jake passar por aqui com a namorada - que, alguns minutos depois, sai com uma mala de mão e pega um táxi. Sozinha.
Tenho que admitir duas coisas: a primeira é que a modelo é tão linda que nem parece ser de verdade, com aqueles cabelos loiros e olhos muito azuis, e a segunda é que vê-la deixou a minha autoestima seriamente abalada. Por mais que eu pense, não consigo entender por que diabos Jake quis ficar comigo, que sou tão comum, enquanto namora uma mulher como a Petra.
O transfer não atrasa nem um minuto (bendita pontualidade britânica!). Fico em silêncio durante as duas horas que separam Londres de Stratford, olhando para a estrada; Petra e Jake não saem da minha cabeça um minuto sequer. Quando o motorista finalmente estaciona em frente à casa natal de Shakespeare eu saio do carro, compro o ingresso e entro na casa, ouvindo as explicações detalhadas dos guias meio alheia à tudo. Decido, então, fazer o percurso das outras casas do autor a pé, já que a temperatura está bastante razoável (onze graus). Preciso me movimentar.
O dia cinza combina perfeitamente com o meu humor, e eu ando pelas margens do Rio Avon torcendo para que o meu casaco dê conta do recado. Visito rapidamente a Nash's House, que era a casa da filha mais velha de Shakespeare, e me dirijo até a New Place, onde ele havia falecido em 1616. Tiro algumas fotos dos jardins maravilhosos, sem muita empolgação; Jake ainda está na minha cabeça. Não há como pensar em Shakespeare sem lembrar dele recitando para mim.
Almoço peixe e fritas em um pub, seguindo para a minha última parada: a igreja onde o poeta está enterrado. São quase três da tarde e, como eu vou embora amanhã, tenho que arrumar as malas e dormir cedo. Mando uma mensagem para o motorista, avisando que estarei pronta para voltar em uma hora.
A igreja está vazia. Paro diante da lápide e faço o sinal da cruz, tentando entender o que está escrito lá. O inglês é um pouco arcaico, mas eu sei que é uma maldição. Shakespeare tinha pavor que alguém mexesse nos seus restos mortais.
- Livra-te, meu caro amigo, pelo amor de Jesus, de remexer na poeira enterrada...não, encerrada... - tento traduzir, cerrando os olhos para enxergar melhor as letras. Ouço passos atrás de mim.
- É encerrada mesmo - uma voz conhecida fala, às minhas costas. - De remexer na poeira encerrada aqui. Bendito seja o que evitar estas pedras, e maldito o que incomodar meus ossos.
Viro devagar e dou de cara com o sorriso zombeteiro do Jake.
- O que você está fazendo aqui, Jake?
- Oi para você também, Lynn - ele retruca, ainda com o sorriso zombeteiro no rosto. - Eu vim ver você, obviamente.
- E como você sabia que eu estaria aqui?
- O recepcionista foi muito amável comigo e disse que você estava procurando informações sobre Stratford-Upon-Avon mais cedo.
Os olhos dele, tão escuros, procuram os meus, e eu entendo, finalmente: eu estou fudida. Muito fudida. Porque, com ou sem Petra, eu não vou conseguir mais me manter afastada dele.
- Então, você está pronta para voltar a Londres?
- Sim, o transfer deve estar chegando em meia hora - respondo, com uma olhada para o meu relógio de pulso.
- Cancele. Volte comigo.
- Nós vamos jantar?
- Eu vou ser absolutamente sincero, se você me permitir - ele fala, pegando na minha mão e me levando para fora da igreja. - Eu não quero jantar, quero terminar o que começamos ontem no meu carro. E, desta vez, não haverá interrupção nenhuma, porque eu terminei com a Petra.
-
Tá passadãn? Se sim, vou dizer que eu também tô!
Até o próximo capítulo! Um beijo, Dani.
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Inevitável (COMPLETO - SEM REVISÃO)
RomantizmRecém divorciada, Aline acredita que, se o amor existe, nunca a encontrou. Acima do peso e com quase 36 anos, ela entra em um avião e vai para Londres passar o aniversário sozinha, porque adora Shakespeare, Jane Austen...e um certo ator britânico de...