Passado Selvagem

Grosseria

Horas, horas, e mais horas. Sempre em claro. A madrugada começava e terminava, e os olhos só se fechavam por frações de segundos para piscar. Era esse a rotina que Daniel começava a se acostumar nos últimos dias que se seguiram. Fazia algum tempo que ele não sabia o que era virar a noite, mesmo já tendo passado por isso muitas vezes tendo uma criança pequena.

De qualquer forma, estava compenetrado nessa operação. Tentar rastrear os passos de alguns dos lacaios do Alemão para conseguir invadir a rede dessa quadrilha. Não era fácil, custava tempo. E principalmente cansaço. Já um balzaquiano, não era mais um garoto brincando de hackear. Não tinha mais a disposição de outrora. O peso do tempo, mais as responsabilidades que surgiram eram implacáveis.

Não tinha mais disposição durante o dia. Quando tinha que cuidar da loja e tocar sua vida normal, o cansaço era evidente, mas tinha que disfarçar. Manter uma vida dupla nunca foi o seu forte, pois quando era hacker ele sempre se escondia. Como um fantasma. E neste momento, ele tinha que driblar os anos "enferrujado", e não transparecer tudo o que estava fazendo.

Todavia, de certa forma, reconhecia que ficar acordado de madrugada fazia bem para ele. Era nesse período que ele agia no passado. Onde ele botava a cara à tapa, ao seu modo, e mostrava toda a sua força. Era quando ele deixava de ser o Daniel para ser o Ladino. Por isso, tentava resgatar um pouco aquele do passado para prosseguir com a busca. Só assim conseguiria.

E em meio a tudo isso, continuava lá. Em seu quarto, sozinho. Sem luzes acesas, a tela do notebook era a sua única iluminação. O computador estava na mesinha, e Daniel estava sentado em frente à ele. Desde que conseguiu invadir o Wi-Fi de um dos suspeitos, rastreou cada passo do homem na internet. Cada conversa, cada site.

Não estava obtendo muitos resultados, ou informações tão importantes. No computador do homem, nada além das frivolidades e sites pornográficos acessados diariamente. Felizmente conseguiu entrar no celular dele graças ao acesso na rede. Monitorava todas as mensagens, ligações e uso dos aplicativos. E conseguia resultados mais concretos.

Mesmo nas altas horas, ele continuou lá. Pois sabia que o seguido estava acordado e na ativa. Sempre na calada da noite, tão típico. Tanto que naquele exato momento, ele acompanhava uma conversa muito suspeita dele com outra pessoa através de um aplicativo de mensagens. Justamente aquele que as pessoas comuns acham estarem seguras usando.

E por conta dessa falsa segurança, a conversa rolou livremente. Eles mandavam mensagens com certos códigos. Mas dava para Daniel entender o motivo do diálogo. O mesmo desejo de se encontrarem, as mesmas falas que Ajax conseguiu obter no grampo que fez dias atrás. A necessidade ainda existia.

Mas parecia que essa necessidade logo chegaria ao fim. O outro homem na conversa já estava marcando um momento para eles se encontrarem. Ao que tudo indicava, ele tinha uma informação para dar. Parecia ser do Alemão, só poderia ser pois a conversa falava sobre um "patrão". A partir daí, Daniel fixou seus olhos na tela e não quis perder nenhum momento daquela conversa.

Mesmo tentando ser vago, o homem dava mais detalhes, a pedido do parceiro. Pelo desenrolar, supunha-se que eles estavam marcando um encontro para dar alguma informação sobre Alemão. Provavelmente aquele homem estava desistindo de ficar na penumbra, e finalmente se saberia de seu paradeiro e de suas ações.

Finalmente estavam chegando no ponto que Daniel queria. Eles começaram a falar sobre o dia e o local em que iriam se encontrar. Seria dois dias após. A partir daí, o papo começou a ficar mais incompreensível. Eles falavam em seus códigos. Diziam para se encontrar no "beco" deles. Mas onde seria esse beco? Tratava-se realmente de um beco?

Para Daniel, não importava muito. Pois não precisava saber de imediato onde e o que seria esse beco. Estava na cola de um dos criminosos, tomava conta da rede, do computador e do celular. E através desse último que ele conseguiria rastrear todos os caminhos que ele for. Isso era fácil, não tinha tantos problemas.