Capítulo VIII

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Calma meu amor... Calma meu amor... Calma meu amor... Calma... Meu... Amor... Amor... Meu... Calma...

Esta frase martela repetidamente na minha mente enquanto continuo observando Nicol ainda trocando carinhos com este sujeito desconhecido para mim. Sabe quando você quer desviar o olhar de uma cena mas ao mesmo tempo não consegue? Pois é. É exatamente assim que estou agora. Eles só podem ser casados e o menino responsável pelo seu próprio acidente é filho deles. Não há outra justificação, não que eu faça ideia no momento. Sequer consigo raciocinar direito. Parece que fui dopada só que de raiva.

- Você nem me deixou explicar pelo telefone! Foi logo desligando na minha cara! - ele reclama afastando-a de si educadamente mais firme e menos emocionado. É errado eu confessar que isso me deixa aliviada? Que eu não quero que ninguém a toque dessa forma? A não ser eu... Por Deus, o que está acontecendo comigo? Onde está a Lilith Rebel de que eu me lembrava ser? Isso de paixão não deveria ser considerada uma doença mental, uma demência com direito a tratamento?

- O que você queria? Jonas e atropelamento na mesma linha! Oras! Fiquei preocupada! Larguei meu almoço pela metade e vim correndo pra cá... Isso quando finalmente consegui sentar pra comer alguma coisa!

- Ainda bem que você me deu tempo de falar o endereço... - ele meneia a cabeça negativamente com um ar de reprovação. - Maninha... Impulsiva como sempre! Você não tem jeito!

Como? Eu ouvi maninha? É isso mesmo? Eles são irmãos e não casados? Espera... Se eles forem como Brenda e Ravier ainda há uma chance. Arg, o que estou pensando?! Alguém me salve dos meus próprios pensamentos... Paro de debater comigo mesma e volto a prestar atenção nos dois e em tudo que eles dizem.

- Jonas é como um pedaço do meu ser. Você sabe! Tudo que diz respeito a ele mexe comigo - Nicol rebate revirando os olhos. Hum, ainda existe a possibilidade dela ser mesmo mãe do garoto pela forma de se referir a ele, só espero que não seja com o próprio irmão. Esses tempos estão muito modernos pro meu gosto.

- Eu sei. Mas não aconteceu nada grave com ele. Então por favor para de fazer escândalo! Deve ter perturbado o hospital inteiro atrás de notícias dele não é? Também bateu na atendente porque ela não quis te deixar vê-lo? - ele bufa e só agora noto que tem a mesma cor de olhos de Nicol que se trata de uma leve tonalidade de folha seca.

- Não precisei de tanto - ela força um sorriso. - Na recepção me dirigiram direto pra cá - minha chefe explica e finalmente seus olhos passeiam aleatoriamente pelo ambiente e percebe minha presença, levando em conta a direção do seu foco central. Esbugalha os olhos não sei se por causa da minha presença inesperada ou do fato de eu estar escutando a discussão pessoal com muita atenção e interesse.

- Lilith? Mas-mas o que está fazendo aqui? - ela olha de mim para o irmão visivelmente confusa e ansiosa por explicações.

- Era isso que eu estava tentando te dizer - Pharrell arfa - Foi a Detetive do seu setor que atropelou nosso sobrinho!

Sobrinho? Ufa. Um suspiro escapa de dentro de mim e continua lá para que ninguém note meu estado. Agora estou me sentindo mal por ter julgado Nicol precipitadamente. Dou com os ombros mentalmente. Esse é o preço de não confiar em ninguém. Você sempre espera pelo pior das pessoas.

- Nossa. Que coincidência! - ela leva a mão a boca muito surpresa e diria até que envergonhada. Talvez por não desejar que eu saiba de sua vida fora do Dp.

- Pois é! - o irmão bate a mão na testa e depois esfrega as têmporas. - A propósito, - me olha - meu nome é Pharrell Evans como você já ouviu. Sou irmão da sua querida Chefe - seu querida é sarcástico destruindo a ideia de família de comercial de margarina que tive agora pouco. Qual família não tem seus problemas e divergências não é mesmo? A ideia é que o amor e o respeito incondicional prevaleçam. Duas coisinhas raras estas que nunca tive a sorte de ter na minha. Normalmente quando se fala de pessoas tenho a sensação de que ninguém vale o prato que come.

Sorrio suavemente pois conheço bem o temperamento de Evans apesar do pouquíssimo tempo de convivência, principalmente pelo fato de sermos bastante parecidas nesse quesito.

- E a propósito, não fui eu que atropelei o sobrinho de vocês, foi ele que literalmente entrou na frente do meu carro. Os pais dele não o ensinaram a andar no trânsito? - sou irônica porém ninguém ri, pelo contrário, os dois ficam sérios e eu sinto por não ter sido engraçada.

- Os dois estão mortos... - é Pharrell quem responde secamente e eu escuto uma risadinha maldosa isenta de som do policial e da paramédica que também ainda estão aqui como se quisessem dizer que eu vacilei feio com meu comentário amargo. Coço a nuca meio sem jeito. Não imaginava que ele fosse órfão de pais. No melhor dos casos é bom ficar de boca fechada mesmo e observar mais até que se saiba o que dizer. Ambos profissionais disfarçam e se despedem argumentando que já que tudo está aparentemente resolvido que irão voltar para seus trabalhos. Os três assentimos e Nicol ainda mais aliviada porque não parece gostar de ter sua privacidade invadida, até nisso ela se assemelha à mim. Não sei se peço desculpas para ela e o irmão mas antes que eu encontre uma resposta, Pharrel se manifesta novamente me tirando do meu constrangimento e desviando o foco da tensa conversa para contemporizar: - Bom, segundo a recepcionista ele já foi atendido e está no quarto. Podemos vê-lo a hora que quisermos.

- Pode ir Pharrel. Vou conversar com o médico que o atendeu primeiro - Nicol avisa deixando claro que só vai ficar satisfeita depois que fizer o que disse.

O irmão dela sorri sem graça alguma e se despede de mim com um aceno de cabeça sem me dirigir a palavra outra vez. Faço o mesmo.

Assim que ele se afasta definitivamente, ela se aproxima de mim e me fita com uma expressão séria:

- O destino parece que faz questão de cruzar seu caminho com o meu...

- Olha, você descobriu o mundo! - brinco e ela sorri.

- Seu senso de humor é péssimo - retruca com um meneio.

- Está dizendo que prefere me ver de mau humor? - zombo.

- Não... Você tem razão quando disse que tenho sorte de te ter na minha vida... - confessa me fitando profundamente e eu estremeço.

- Desculpa. Eu não queria ferir seu sobrinho.

- Não precisa se desculpar. Tenho certeza que você não teve culpa!

- Como pode ter tanta certeza? - me surpreendo.

- Uma que você segue as leis a risca, e dois que eu conheço o meu próprio sangue.

- Então está admitindo que seu sobrinho é um garoto problemático?

- Longa história que não te interessa. Aliás, o que está fazendo aqui? Seu horário de almoço acabou faz tempo - ordena ríspida me pegando desprevenida. Onde foi parar a simpatia dessa mulher? - Trate de analisar as fichas enquanto eu resolvo umas questões particulares, certo? - enfatiza com um tom autoritário.

Me limito a apenas concordar com uma balançada de cabeça.

Ela dá costas e se vai andando apressadamente pelos corredores largos de paredes pintadas de branco e cinza fazendo o barulho de seus saltos ecoarem pelo espaço devido ao atrito com o piso se misturando aos outros sons de um pronto-socorro.

Ok. Nada de saber mais sobre a vida pessoal de Nicol. Nada de ler a carta de Duarte até o horário do meu expediente acabar mais tarde. Pelo menos ela não é casada. Não que eu saiba por enquanto. Dou com os ombros e caminho em direção a saída rindo de mim mesma por alimentar uma paixão impossível.

Armas, Rosas e... Você! ( LESBIAN) Onde histórias criam vida. Descubra agora