Capítulo XXV

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Nicol Evans

Minhas pernas estão tremendo tanto que mal podem sustentar o restante do meu corpo. Não é medo ou qualquer sentimento parecido, apenas covardia. Não tenho coragem de matar Lilith, nem mesmo para permanecer viva. Não sei o que está acontecendo comigo. Eu deveria escutar meu instinto de sobrevivência mas tudo que consigo sentir por ela é compaixão. É impossível reconhecê-la, esta não é a justiceira por quem me apaixonei ardentemente. Eu só queria entender o que está acontecendo, se tem algum, qual o motivo dela estar me atacando!

Enquanto o material frio da minha arma está apontada para sua testa, seus olhos indiferentes estão fixados aos meus quase cegos pelo pranto sofrido, me desafiando cruelmente.

Minhas mãos oscilam freneticamente.

Deus, ajude-me!

Fecho os olhos e ponho o dedo no gatilho. Volto a hesitar. Abro-os e suspiro fundo, travo a arma e a jogo em cima da cama, ao lado de Lilith. Sei que é um ato imprudente, mas a verdade é que, prefiro que ela me mate do que ao contrário.

— Eu não consigo fazer isto! Eu não posso! — berro com a voz falhando pelo choro excessivo, dando as costas com os olhos embaçados. Escuto um risinho maléfico e no segundo seguinte a pistola sendo destravada, o gatilho apertado e o disparo, que surpreendemente não me atinge, porém um estrondo chama minha atenção e logo depois um urro grotesco de Lilith.

Com o coração aos saltos, me preparando psicologicamente para a visão do mal pressentimento, me viro com difuldade e me deparo com o corpo do meu sobrinho no meio do meu quarto com um ferimento um pouco abaixo do ombro. É minha vez de gritar para extravasar minha dor. Me agacho e coloco sua cabeça em meu colo.

— Não, você não! Você não, Jonas! Todos menos você! Eu, menos você! Oh meu Deus, por que a desgraça se abateu tão devastadoramente sobre nós? — meus olhos fitam uma Lilith chocada com o que acabou de realizar, a fuzilo e munida por uma raiva dilacerante pela revolta e o luto, me levanto e começo a socá-la ao ponto de lhe desfigurar o rosto. Ela reage com fúria e voltamos a nos atacar dentro do cômodo já quase destruído pela briga incessante, e sangue para todo lado. Até que levo um soco brutal no queixo e caio em posição de feto. Não consigo me mexer. Não sei se desmaiei, desfaleci ou morri com a queda. Entretanto, a sensação se mostra estranha porque mesmo que eu não seja capaz de mover meu corpo, minha mente continua ativa e minha memória viaja para minha infância...

Lembro da única vez que minha mãe me levou até a África para rever a mãe dela, ou seja, minha avó. Ela morava numa aldeia precária e apesar de ter apenas uns seis anos na época, espantosamente, me recordo nitidamente de tudo que vi por lá . Ela própria havia vendido minha mãe por uma quantia relativa que dava para sustentar seus outros cinco filhos menores, meus tios, por cerca de dois meses. Não sei como, mas sinto lágrimas molhando meu rosto. Dói me conscientizar dessa fase da minha existência porque agora tomo conhecimento de que a enterrei para evitar sofrimento e a transformei numa boa lembrança. Acreditei por anos a pio que fora minha avó que viera até os EUA visitar minha mãe e elas se davam muito bem. Porém, na realidade, minha mãe nunca a perdoou e naquele dia aconteceu uma discussão acalorada. Minha avó disse que não se arrependia porque na hora do desespero fez pensando unicamente na sobrevivência dos mais jovens e que lamentava que a vida difícil e o apego ao dinheiro a tivesse transformado na mulher que era. Hoje sei que não me cabe julgar a atitude de nenhuma das duas, porque ambas foram vítimas das circunstâncias. Minha mãe humilhou minha avó jogando alguns dólares nela já senhora e com a saúde fragilizada e que foi recusado com orgulho pela minha antepassada. Dona Mafari se achava a dona do mundo só porque tinha a proteção de um chefe de máfia e fora até ali somente para constrangê-la, mostrando-a uma falsa superação e felicidade. Só sei que acabei me perdendo na feira em meio a uma grande multidão e foi minha avó que me encontrou. Eu estava prestes a ser atacada por um nativo endemoniado. O jovem rapaz babava, todo seu corpo estava torto, seus olhos que pareciam castanhos estavam vermelhos e ele falava numa língua desconhecida palavras desconexas.

Armas, Rosas e... Você! ( LESBIAN) Onde histórias criam vida. Descubra agora