Capítulo 11 - Hunter

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Hunter estava visivelmente mais magro, sua face abatida trazia profundas olheiras como se não dormisse a semanas, os pulsos e calcanhares estavam arroxeados  devido às correntes e algo na forma em que a olhava fez com que Sophie sentisse medo e seus olhos também ficaram negros.

— Estefan é mesmo muito incompetente. — O garoto preso disse com uma voz rouca. — Acredita que estou aqui pois ele me quer longe de você?

— Se ele quer isso deve ter um ótimo motivo, vamos sair daqui, Sophie.

— Não seja patético. — Hunter riu em meio a uma crise de tosse. — Você vai me soltar, loirinha?

— Isso vai depender do que você tem para me contar.

Os três se entreolharam durante algum tempo, até que o enjaulado suspirou, fechou os olhos, e quando os abriu já não eram mais negros, ele umidesceu os lábios antes de voltar a falar.

— O que você quer saber? Conto qualquer coisa para sair desse lugar e dar uma boa surra em Estefan.

— Quero saber sobre meus pais. — ela pediu esperançosa.

— Então melhor sentarem. — Ele indicou o canto da sala com a cabeça. — Tem um banquinho ali, Estefan costuma usar quando vem me deixar atualizado e tentar me convencer a não fazer exatamente o que você está pedindo. A propósito, sinto muito por sua mãe. — As últimas palavras foram para Luke que sentiu um forte aperto no peito.

— Prefiro ficar de pé. — Sophie cruzou os braços. — Pode começar.

— Como quiser, mas vou logo avisando, minha história é um pouco longa.

— Não quero saber sua história, quero saber sobre meus pais. — A garota se irritou.

— Sua mãe aparece algumas vezes na minha história, vai querer ouvir ou não?

— Certo. — Sophie puxou o banco e se sentou, enquanto Luke sentava no último degrau da escada.

— Vocês conhecem a história do dilúvio? — Ele deu um riso debochado enquanto perguntava, os outros dois confirmaram com a cabeça. — O caso é que não foi da forma que contaram a vocês, a água só veio para lavar todo o sangue que foi derramado.

— Como assim? — Luke perguntou.

— Quando se arrependeu da criação, Deus mandou que seus caídos exterminassem toda a raça humana.

“Acontece que alguns caídos ficaram horrorizados com o que tinham que fazer, meus pais estavam entre esses. Eles usaram uma família que ainda seguia a autoridade divina, a de Noé, para convencer a Deus de que a humanidade ainda podia servir a Ele.

Nessa altura, a Terra já estava banhada de sangue mundano, restavam apenas algumas poucas famílias, meus pais me contaram que o dilúvio foram as lágrimas do todo poderoso, minha opinião é que foi uma limpeza mesmo, mas isso não importa. Contei a história, pois foi por esse motivo que meus pais passaram a viver como mortais, eles não aguentariam outra ordem como aquela.

O livre arbítrio era algo que até então não conheciam, no começo apenas se isolaram, ficavam observando de longe a vida dos humanos, mas não dá para fazer isso sem querer ser igual a eles, sentir o que eles sentem.

Passaram a imitar seus costumes, assim descobriram o amor, só não imaginavam que com isso eu nasceria e a maldição que tanto odiavam passaria para quem eles mais amaram enquanto existiram.”

— Sinto muito. — Sophie o interrompeu percebendo que Hunter parecia abalado.

— Tudo bem. — Ele a olhou com estranheza como se não esperasse tal atitude dela. — Continuando, meus pais ficaram apavorados quando nasci, era algo completamente novo. Eles não sabiam se eu era mortal, e para completar a notícia de meu nascimento causou um desconforto entre os caídos.

"Logo eles perceberam que não possuíam mais seus dons celestiais, o que era um problemão já que Lucifer não queria que eu crescesse. Por algum motivo Deus julgou que eu deveria ser preservado então ele incumbiu de me proteger um anjo que já havia simpatizado com os humanos.

Raziel, um serafim, a mais amada por Deus, primeira a recusar Lucifer, sua mãe. Ela não ficou por muito tempo, era sempre muito requisitada, então quando foi embora eu ainda era apenas um bebê, é engraçado eu hoje saber que ela entrou na minha vida tão cedo.

Cresci cercado de caídos que chamavam meus pais de traidores, me odiavam e eram obrigados a me proteger, foi uma bela infância a minha.

Meus pais não sabiam ainda qual era meu destido, mas uma coisa é certa, eles foram os primeiros caídos a descobrirem ao amor mundano, e eles me amaram como nenhum humano seria capaz. Eles me contavam histórias de como era viver no plano celestial e de como eu iria pra lá caso fosse um homem segundo os desígnios de Deus, da para imaginar como ficaram desapontados ao saber que o filho amado deles era amaldiçoado.

Nunca havia visto meu pai blasfemar, mas quando ele percebeu que eu havia parado de envelhecer praguejou contra Deus durante dias inteiros, enquanto minha mãe perdeu todo o brilho que tinha, se tornou chorosa e amarga.

Na época eu não entendi muito bem o que significava, achei que Ele havia me escolhido, fui estúpido. Meus pais me treinaram da maneira que podiam, não eram muito bons nessa parte, e ainda adolescente eu já era mais forte que eles, já que os poderes de ambos passaram pra mim.

Os caídos aproveitaram a oportunidade para descontarem a raiva que sentiam, mas eu me tornei mais forte que cada um deles, eram patentes baixas, e apesar de meus pais também serem, eu somava os poderes dos dois, isso os deixou ainda mais revoltados, mas não podiam fazer nada. Eu achei que assim Ele me notaria, meu pai ansiava por isso, já que meu destino era ser amaldiçoado queria que fosse servindo ao todo poderoso, já que Lucifer era uma escolha pior, mas isso não aconteceu.

Mesmo quando Deus ainda falava diretamente com os caídos, nunca veio até mim. Meus pais morreram rejeitados por um Deus que sempre serviram, e eu fui em busca de meu próprio caminho.

Marcas em Sangue   [Em Revisão]Onde histórias criam vida. Descubra agora