- Que vergonha. Que lastima. Que lamentável. Que grande tragédia. – Maria Laura repetia enquanto bebia seu chá das dez horas. Marina tentava não ouvir o que a mãe dizia enquanto colocava toda sua atenção no livro em suas mãos, um romance em que o autor narrava um amor impossível que aconteceria no futuro, dentro de cem anos, nesta época o mundo estava um caos, era o início do fim dos tempos. Marina revirava cada página fascinada, enquanto pensava: Como seria o futuro?
- Mais chá Senhora? – Perguntou Josefa a criada mais antiga da casa.
- Sim obrigada. – Agradeceu e voltou a falar com a filha. – De hoje em diante você não será mais vista com Valeria Luize. – Finalmente havia conseguido a atenção de Marina, ela pôs o livro sob a mesa no centro da sala e sentou-se próxima da mãe.
- Por que mamãe? Ela não fez nada que não mereça perdão.
- Hoje todos estão na cidade a chamando de “Dama do cocho”
- São uns ignorantes que não conhecem o amor.
- Amor é algo construído com o tempo minha querida.
- E por que ela e o pobre homem não poderiam ter construído algo?
- Algo que é construído da noite para o dia não firme.
- Se o amor é verdadeiro a construção não pode ser falsa.
- Do lugar de filha naquela família será promovida a criada, esposa do cocheiro. É lamentável!
- Mamãe pare com sua mania de se intrometer na vida dos outros.
- Eu me intrometendo? Já não basta a vergonha que me fizestes passar saindo de meu lado e indo amparar tua amiga.
- Eu não a abandonaria.
- Você precisa selar pela sua reputação, ainda mais agora que dançou três vezes com o filho do conde.
Marina levou as mãos à cabeça, havia esquecido que Sebastian almoçaria naquela casa hoje e pior que isto que teriam uma conversa, que conversaria com sua mãe.
- Mamãe eu esqueci-me de que...
- Senhora Maria Laura. – Entrou Joana na sala gritando, ela também era criada naquela casa, filha de Josefa, servia a Marina já que era apenas cinco anos mais velha que está.
- Já repeti milhões de vezes que não tolero criados gritando pela minha casa.
- Desculpe, mas é que o filho do conde está chegando, já estão as nossas portas.
- Oh céus! Marina você sabia que ele viria?
- Sim.
- E não me avisou a troco de que raios?
- Eu fiquei preocupada com Valeria, e mais o duelo do pai dela e do moço, eu acabei esquecendo.
- Enfim, vou recebê-lo. Mudem o cardápio do almoço, esqueçam a sopa, assem o porco que seria feito no jantar, façam também uma deliciosa salada de cenouras, preparem um bolo para a sobremesa e façam um refresco de limões com laranjas. Quanto a você Marina, vá para seu quarto e coloque seu melhor vestido.
-Eu já estou bem arrumada mamãe. Gosto muito desde vestido bege.
- Pois vá logo e coloque aquele azul turquesa, lembre-se de seu pai. – Sorriu, aquele vestido lhe lembrava a cor preferida do pai, e fazia de certa maneira sentir que ele estava próximo dela, ela queria estar próxima dele naquele momento. Consentindo foi para seu quarto se trocar.
- Deseja mudar o penteado senhorita? – perguntou Joana.
- Gosto deste.
Vestiu o vestido cor de turquesa, que na cintura possuía uma faixa branca, as costas eram bastante abertas e as mangas eram apenas um bordado com linha transparente. Olhou-se no espelho de seu quarto, aquele que foi de sua avó e agora era dela e sentiu um aperto forte no peito. Tentou ignorar a sensação e desceu até a sala de estar.
- Minha menina é uma verdadeira dama, da às ordens as criadas de maneira esplêndida, parece uma verdadeira dona de casa.
- Sua menina é uma moça adorável. O que ela faz no tempo livre?
- Ah caro Senhor Lerand, ela vive na biblioteca, desde criança ela adora ler. O moço que ter a honra de se casar com ela deverá ter uma grande quantidade de livro para fazer feliz minha doce menina. – Sebastian sorriu satisfeito, isto não era um problema para ele.
- É uma moça muito bonita e inteligente pelo o que a senhora diz.
- Oh ela é muito mais que isso. Todas as tardes ela me faz companhia no chá da tarde e depois passeia pelo jardim. Ah e ela mesma borda seus vestidos, é claro que eu faço questão de que ela compre alguns do ateliê, mas nem estes superam o tom doce de seus bordados.
- Com licença! – Saudou Marina ao chegar. – Mamãe! Senhor Lerand.
- Senhorita Marina é um prazer revê-la. – Marina sorriu e indicou o sofá para que ele voltasse a se sentar, caminhou até a mãe e sentou-se próxima dela, precisava manter as boas maneiras. – Sua mãe estava me falando das boas qualidades que a senhorita possui.
- Minha mãe com certeza deve ter exagerado.
- Tão humilde! – Maria Laura exclamou satisfeita com a filha.
- Vejo que esta é uma rara qualidade hoje em dia, e a senhorita possui.
- Fico grata por sua gentileza. – A menina corou.
- Por que não me conta um pouco mais sobre as qualidades de sua filha Senhora Maria Laura?
- Oh é um prazer, - abanou-se com o leque - Minha filha toca piano como ninguém, supera até a mim, também possui uma voz magnífica e canta extremamente bem.
- Seria um prazer vê-la tocar.
- Podemos subir para a sala de música e Marina pode cantar para nos alegrar. – Sugeriu a mãe da jovem enquanto já imaginava o casamento da filha com aquele belo homem.
- Se a senhorita Marina não se importar, eu adoraria.
- Oh de maneira alguma. Ela se sentira feliz em tocar.
- Você se importa senhorita Marina? – Olhou em seus olhos tentando desvendar suas intenções, é claro que estava hipnotizado por sua beleza e desejava a ter para si imediatamente.
- Não, eu não me importo. – Falou ainda envergonhada e começando a tremer, mas como poderia não tocar para o futuro conde? Sua mãe lhe mataria. E ela precisava garantir um bom casamento, Sebastian parecia ser um bom homem.
- Ótimo! – Sorriu convencido de que havia ganhado aquela guerra que era Marina Flamelle.
Subiram para a sala de música e Marina tocou uma bela canção. Sebastian a observava, Ela era o tipo de mulher que um conde deveria ter, era bela, elegante, tinha boas maneiras, uma boa família, uma reputação impecável e a contrário das demais jovens ela não aparentava ser uma companhia entediante.
- Bravo! – Aplaudiu após o termino da canção. Marina sorriu exibindo as covinhas.
- Espero que tenha sido de seu agrado.
- Foi a mais bela canção que já ouvi.
- Fico honrada.
- Agora se me permite deixe que eu mostre meus talentos musicais. – Marina levantou-se e Sebastian se posicionou ao piano, tocou uma canção inglesa que Marina já havia ouvido uma ou duas vezes no teatro da cidade. Após a canção acabar ele se levantou sob aplausos e elogios – principalmente de Maria Laura. – então disse: - Acho que formamos uma bela dupla.
Marina não deve tempo de responder, Maria Laura estava prestes a emocionar-se já que tudo indicava que naquele instante sua filha seria pedida em casamento. Mas Joana a criada, filha da governanta bate à porta e recebe um frio olhar de Maria Laura por ter interrompido algo importante.
- Com licença. – Ela faz uma reverencia. – O almoço já está a mesa.
Maria Laura estava prestes a enxotar Joana da sala de música, furiosa pôr a criada ter quebrado o clima afetuoso que preenchia o recinto, onde Sebastian estava prestes a declarar suas intenções para com sua filha, mas então lembrou-se do cardápio daquela segunda feira. – A entrada seria abobora, seguido por frango ao molho com batatas e por fim sobremesa de doce de leite.
Oras isso não era cardápio que se apresentasse para um conde, santos do céu, um conde em sua casa, um conde fazendo a corte a sua filha e um cardápio inaceitável desses. Era o fim do mundo!
- Joana me acompanhe por favor. – Voltou os olhos para Sebastian e Marina. – Me deem um minuto de licença.
Retirou-se do local com a criada, pararam no corredor longe o suficiente para não serem ouvidas, mas próxima o suficiente para que Marina e Sebastian não estivessem próximos o bastante para certas intimidades.
- O que é o cardápio deste almoço? – Perguntou temendo já saber a resposta.
- Minha mãe mudou o cardápio de última hora assim que o senhor Sebastian chegou para fazer a corte a senhorita Marina.
Maria Laura suspirou aliviada.
- Muito bem, sua mãe não me decepcionou desta vez.
- Ela nunca desagrada.
- Só quando escuta atrás da porta. – Maria Laura falou friamente, Joana abaixou os olhos. – Agora menina, me conte o que será servido.
- A entrada será ervilhas com frango ao molho e batatas, o prato principal será o assado bovino e para a sobremesa mantemos o doce de leite que será servido com morangos e cerejas.
- Excelente! Agora vá.
Maria Laura voltou para a sala de música desculpando-se por deixar os dois sozinhos por tanto tempo, depois todos desceram e sentaram à mesa eretos, saborearam a refeição com grande prazer, falando pouco demonstrando modos corretos, Sebastian e Marina trocavam olhares de jovens cheios de sonhos e anseios. Até mesmo os criados estavam certos de que em breve um casamento aconteceria naquela casa.
Dante estava sentado na pequena mesa da cozinha de seu apartamento. Havia comido dois cachorros quentes no lugar do almoço, era domingo e ele não acordaria cedo para cozinhar, também não iria se dar ao luxo de ir até um restaurante e ter a má sorte de encontrar pessoas que iriam querer bater um bom papo. Estava sem paciência para isto.
Sentado à mesa tinha em mãos o colar com uma perola de turquesa, o colar achado por ele na cena do crime. Por que ainda não o tinha entregado ao resto da equipe? Não sabia, mas queria aquilo só para ele.
Pegou o celular e entrou no facebook, trinta notificações, que tédio. Pesquisou por Marina Flamelle, mas não encontrou ninguém. Quem seria essa dondoca ante social que possuía um colar valioso, mas não tinha a droga de um facebook? Entrou no instagram, Twitter e nada de achar essa tal de Marina Flamelle.
Pensou, pensou e pensou ainda mais.
Skinner era o último Flamelle vivo, não possuía filhos e nem parentes vivos. Essa tal de Marina Flamelle só poderia ser uma ex esposa que possuía o colar dos tempos em que eram casados e por isso possuía o sobrenome Flamelle.
Dante foi até sua mochila de trabalho e pegou a fixa do histórico de Skinner, olhou atentamente, nenhum casamento, nenhum divórcio.
Tentou convencer-se de que o colar fora o pedido de casamento de um noivado rompido pouco depois. Devia de ser isso, e se o colar estava na cena do crime devia ser do assassino. E Dante acreditava que nenhum assassino – pelo menos nenhum com um cérebro – teria uma rede social facilitando que a polícia o encontrasse.
Mas ainda assim alguma coisa na história não batia, alguma coisa não estava certa.
Decidiu que iria encontrá-la e sentiu que isso realmente iria acontecer. Afinal de contas sua vida baseava-se em prender assassinos e prenderia está mulher misteriosa seria apenas mais uma.
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O espelho de Skinner
Mystery / ThrillerO detetive Dante Côrtes, um homem frio e cético do século XXI jamais imaginou que investigar um caso - aquele caso - mudaria sua vida, seu destino e seu passado. Seu objetivo naquele instante era encontrar o assassino de Skinner Flamelle o cientis...