capitulo 2 - O colar de Marina

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Chegamos aos 2k e conforme o prometido segue o capitulo 2.
Boa leitura  ❤

Capítulo 2 - Ó minha filha, meu bem precioso.

    Valéria ainda chorava abraçada ao colar que um dia ficava próximo do coração de Marina, tinha a impressão de que ele ainda batia em algum lugar. Pelo menos gostava de pensar isso. A morte de Marina pesava em suas costas, ela havia trago a má sorte a sua amiga, melhor amiga, e agora ela estava morta.
Ainda estava perdida em pensamentos quando ao longe ouviu gritos desesperados. Seguidos do barulho de sapatos alto no que sobrará do chão do casarão.
            - Minha filhaaa! Minha doce filha! Marinaaaaa!
       Ela reconheceria a voz do diabo em qualquer lugar do universo, mesmo que daqui duzentos anos ela ainda se lembraria dos gritos agoniantes e desesperados de Maria Laura.
- Marinaa! Filhaaa! Marina.
Os passos se aproximaram de forma veloz. Os gritos de Maria Laura refletiam um coração despedaçado, como o da pior mãe que perderá a melhor filha. Por detrás de todos seus crimes e defeitos Maria Laura amava Marina, seria capaz de morrer de bom grado no lugar de sua doce filha. Lembrava-se do dia que sua filha havia nascido, o pequeno embrulho rosa colocado em seus braços e naquele instante havia compreendido o que era o amor que tanto ouviu falar. Marina era sua menininha, ela a tinha educado, ensinado a cantar, tocar piano, bordar, ela havia a arranjado um bom marido, a levado até o altar, se despedido dela após a recepção de casamento e agora não queria acreditar que sua amada filha estava morta.
Valéria escondeu no vestido o colar antes que Maria Laura o exigisse como seu e ela fosse acusada de ladra.
- onde ela está? - perguntou Maria Laura. - Não encontro Marina.
   - Sinto muito. - Foi o que Valeria conseguiu responder.
Maria Laura ajoelhou-se em prantos, agarrou lentamente o véu que Marina usou em seu casamento - ao menos o que sobrou dele - levou o véu a seu peito e o abraçando chorou mais, soluçou, gritou, berrou, lamentou e por fim levantou-se ainda aos prantos para pôr a culpa em alguém.
  - Você não sente muito, você não sente nada. - Falou o mais alto que pode dirigindo-se a Valéria. Seu olhar emanava uma raiva que não parecia ser deste mundo, desgrenhada e com o vestido sujo dos resíduos deixados pelo incêndio Maria Laura mais parecia a personificação da desgraça.
- Ela era minha amiga.
            - Ela era minha filha. Sua inveja a tirou de mim.
- Eu jamais desejei a morte de Marina, eu a amava. - Se mais alguém estivesse presente na cena veria nos olhos de Valéria o quão verdadeiras suas palavras eram. Mas ninguém mais estava ela.
- Mas desejou o Sebastian. - Valéria engoliu em seco e encolheu os ombros. Aquilo era verdade.
     Maria Laura continuou falando:
    - Por que minha menina se foi e ele não? Por que Sebastian não morreu no lugar de minha Marina? Não é justo, não é justo. Minha filha devia estar viva, devia ser a condessa viúva e não a defunta. - Maria Laura chorou ainda mais ao falar. - Nem tenho seu corpo para enterrar, pior do que perder um filho é perder um filho e não ter um túmulo para visitar e levar flores. Nem isso minha Marina terá. Minha filha não merecia, não merecia.
  Valéria deu-se por conta que de não estava pensando em Sebastian. Como ele estava? Será que os médicos conseguiram estabilizar sua situação. Ele não estava muito queimado, ela mesma havia constado isso, mas temia que houvesse inalado muita fumaça. Já não bastava ter perdido Sebastian para Marina em um casamento - que Deus a perdoasse - não o perderia para a morte.
- Se eu pudesse teria morrido no lugar dela. - Valéria por fim falou sem erguer os olhos.
     - Devia ter sido.
     Maria Laura gritou com todas as forças que tinha:
    - Maldição! - E com toda raiva de seu peito empurrou no chão o grande espelho de Marina, ao cair o espelho quebrou-se por completo, o pouco vidro que restava saltou longe quase atingindo Valéria e a parte envernizada de madeira quebrou-se em dois pedaços.
- Sua raiva não pode a trazer de volta.
Maria Laura lhe lançou o olhar mais cruel que a moça viu em toda sua vida. Aproximou-se de Valéria a passos lentos. Olhou-a no fundo dos olhos, Valéria não teve medo, mas a encarou com uma coragem que não sabia possuir.
- Mas a sua inveja foi capaz de matá-la. Toda vila sabe que Marina se casou com o homem que você desejava para si.
A Jovem permaneceu com a cabeça erguida – embora seu coração estivesse jogado ao chão em pedaços – naquele instante o ar ficou ainda mais pesado do que estava segundos antes, elas não pareceram ouvir o grande barulho de pessoas que agora se aglomeravam na volta da casa falando sobre o suposto valor da reforma, também não ouviram o barulho do minuano que começava a soprar e nem o cantar dos pássaros, tão pouco pareceram perceber que pessoas entraram na casa.
- Apesar de todos os meus medos, orgulhos e ambições, apesar do peso de todas as mortes que carrego no peito eu não sou culpada da morte de Marina, ela era minha amiga, eu a amava e morreria por ela. Não vou permitir que me insulte com suas mentiras, não você Maria Laura.
- Eu sou uma baronesa, uma nobre e você quem é? Ninguém menos do que a dama do cocho.
- Alguém que tem mais amor no coração do que você. – Maria Laura tentou dar uma risada sarcástica, mas não foi capaz, a morte da filha lhe doía demais.
- Essa é a questão, sua sina é tão ruim que você mata as pessoas somente por ama-las. Veja só, seu pai, o cocheiro Bento, agora minha Marina e em breve Sebastian.
- Você é uma mentirosa. – Valéria gritou.
- São fatos, veja sua vida, você causa dor por onde passa, eu disse para Marina que devia se afastar de você, eu disse. – E Maria Laura voltou a chorar.
Talvez fosse mesmo melhor se afastar de Sebastian, deixa-lo viver, jamais pôr os olhos nele outra vez.
Ela estava decidida, não aguentaria mais tanta dor e desrespeito, ela que de nobre foi rechaçada a moça mal falada, a dama do cocho. Ela que havia aguentado tanta humilhação e perderá tudo o que tinha – o pai, seus dois amores, a amiga e o bom nome - daria um passo a mais rumo ao abismo. Pegaria alguns vestidos, venderia suas joias e partiria dali, sozinha pelo mundo, talvez pegasse um navio rumo a Inglaterra, a vida lá deveria ser melhor, talvez conseguisse um emprego em alguma pensão. Lá ela poderia recomeçar, mas jurou que não se apaixonaria, que não se aproximaria de ninguém, porém ela só iria embora depois de ter certeza de que Sebastian estava vivo e bem. Depois disso poderia partir em paz independente de em quantos pedaços seu coração estivesse partido.
Os passos se intensificaram, Maria Laura ajeitou a postura, estaria ereta e chorando como uma mãe desolada deveria estar. Valéria continuou no chão, a cabeça baixa, não importava-se que a vissem assim, era o modo como ela estava, como se sentia, não se daria o trabalho de molestar sua dor para causar boa impressão.
- Ai está você minha cara noiva. Eu a procurei por toda parte. – A pobre menina chorou desolada, e desta vez não chorava por Marina, tão pouco por Sebastian. Chorava pois odiava aquele homem. Senhor Meireles, um velho viúvo que servia a polícia local. E seu noivo.
O velho voltou os olhos para Maria Laura, em tantos anos trabalhando naquele ramo ainda não sabia ao certo o que dizer a uma mãe que perderá o filho. Retirou o grande chapéu preto e o segurou rumo ao peito.
- Senhora Maria Laura, eu sinto muito. Eu a senhorita Valéria estaremos ao seu dispor no que pusermos ser uteis.
“Fale por você e não por mim “Valéria pensou em dizer, mas se calou. Não teve coragem para fazer uma simples controvérsia, teria coragem de largar tudo e atravessar o oceano para tentar uma nova vida? Esperava que sim. Tentou-se convencer de que aquele não era o momento oportuno para fazer contestações, respeitaria a dor de maria Laura.
- O senhor sempre esteve presente nos momentos fúnebres, meu esposo, agora minha filha. – Ela pranteou, pela primeira vez sentia de verdade a dor da morte, o luto invadindo lhe o peito, ardendo seu coração conforme acreditava ter ardido a filha naquelas chamas. Não havia chorado a morte de seu marido, na verdade havia chorado, mas suas lagrimas não eram verdadeiras, ela mesma havia mandado mata-lo, mas Marina, Marina era sua filha, seu bebê. Ela sentia tanto, queria poder ter sido uma mãe melhor, o único motivo que agora tinha para viver era para vingar sua filha.
- Não é uma coisa da qual eu me honre.
- É claro que não.
Houve um silencio crucial.
Valéria Pensava em Sebastian.
Maria Laura pensava em como matar o responsável por aquele incêndio.
E o senhor Meireles pensava em seu casamento com Valéria, não queria que a casa pegasse fogo antes de consumarem o casamento, e nem depois disso.
- Teve notícias de Sebastian? – Perguntou Valéria. Os olhos do homem pareceram prestes a causar um novo incêndio. Ele teria mais um motivo para se preocupar, Sebastian estava viúvo e Valéria o amava, não queria perder a bonita noiva, que os céus o perdoassem, desejou que Sebastian morresse.
- Está vivo, graças a senhorita que bravamente o colocou em uma carruagem. Heroico de sua parte.
- Não fiz mais que minha obrigação.
- Minha cara noiva, deverias retornar para casa, tomar um chá e apreciar o colo de sua mãe, ele deve estar preocupado com você.
Ela odiava chá (tinha vergonha de admitir isso e por vezes tomava chá para não parecer deselegante, mas ela odiava chá) odiava o fato de sempre querer agradar a todos e sua mãe a odiava, não teria se dado ao trabalho de preocupar-se com ela.
- Não, vou continuar aqui.
- Não devia.
- Mas vou. – Ela o afrontou, de fato a dor tornava as pessoas mais fortes, ela havia o contrariado.
- Eu quero que vá para casa, este lugar não é seguro.
- Não desabou até agora, tenho certeza que ficarei bem.
O velho começou a mastigar algo que não estava comendo, de certo não estava agradado da postura da moça. Maria Laura interviu na situação:
- Não amole a moça.
- Senhora ela é minha noiva.
- Estou ciente disso. Toda sociedade está ciente disso. O senhor não pode a impedir de sentir o luto, deixe que ela chore seu pranto em paz.
- É claro que sim.
- Obrigada. – Valéria sussurrou.
Mais uma vez o silencio reinou. Os três estavam parados, o ar estava parado e seus corações mais calmos. Um oficial adentrou a passos largos o recinto.
- Meireles. Você esqueceu de seus compromissos homem? Se a memória lhe falta deveria se aposentar.
Meireles deu um salto e se virou em direção ao oficial.
- É claro que não, aqui estou eu.
O homem retirou o chapéu e saldou as mulheres.
- Senhora Maria Laura, Senhorita valeria, sinto muito por suas perdas. Lamento interromper este momento doloroso de maneira tão bruta.
As damas consentiram com a cabeça, não havia o que ser dito. O homem continuou falando:
- Meireles você deveria trazer a senhora Flamelle para ouvir a testemunha, foi para isso que você subiu até aqui.
- Sim foi isso que vim fazer, mas respeito o tempo e o luto das mulheres, sou um cavalheiro.
Maria Laura sobressaltou. Queria esganar Meireles por demorar tanto a dizer isso, queria ouvir a testemunha, queria fazer algo para trazer Marina de volta.
- Há uma testemunha?
- Sim senhora, a senhora deve ouvir o que a testemunha tem a dizer.
Maria Laura endireitou os ombros, assumiu a postura de baronesa e começou a caminhar.
- Claro que sim.
Os homens saíram caminhando e ela os seguiu. Antes de sair do quarto virou-se para Valéria e disse:
- Se eu fosse você não perderia mais tempo, corre para Sebastian antes que seja tarde demais.
E sem pensar duas vezes obedeceu, seu coração se aqueceu e ela saiu correndo enquanto Maria Laura sorria com o canto da boca.

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