Capítulo 31

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2017

Quem pretendia sair da igreja não conseguiu. Eles estavam presos àquela história, queriam saber o final, enquanto Ketlen continuava a reclamar com Fernanda:

– Minha vida é uma chatice!

– Sua mãe te obriga a ser cristã, Ket?

– Ela diz que meu lugar é aqui. Fala que Deus tem um plano em minha vida. Não quero isso pra mim! Quero sair, namorar, ganhar o mundo, viver intensamente. Não sou um cão para ficar numa coleira!

– Onde ela está?

– Sentada, veja! – Ketlen apontou para um dos bancos.

– E por que você não fala com ela, ao invés de ficar fingindo que gosta?

– Eu tento, mas ela foge!

– Que horrível!

– Mas de hoje ela não escapa! Não vejo a hora de terminar esse culto chato!

– Ih... Pelo jeito vai demorar!

– Por quê?

– O vovô é tão devagar!

– Pra aumentar o meu sofrimento! – finalizou Ketlen.

Do outro lado da igreja, também no vitrô, um homem jovem, pouco gordo, cabelos crespos, acompanhava o culto e ouvia atentamente o testemunho. Ele mostrava-se triste, de cabeça baixa, e algo o incomodava, derramando algumas lágrimas. Ele segurava um telefone, e sussurrou algumas palavras:

– Tenho que ligar pra ela, mas não tenho coragem! Senhor, eu te imploro!

Continuou a implorar baixinho, para ninguém o ouvir, e algumas lembranças surgiram em sua cabeça, e nelas uma antiga namorada:

– O que você fez? – Ela o socava, chorando aos berros – Meu pai vai me matar!

– A gente dá um jeito! – gritava ele de volta.

– Ainda não entendeu? Eu estou grávida! A gente só tem quinze, Renato! Quinze!

Aquela lembrança o atormentava, e minava lágrimas em seu rosto. "Preciso ter coragem!", ele repetia.

Também estavam sentados dois homens: um cristão, e um convidado por ele, para participar daquele culto. O testemunhado cutucou o amigo, ironizando:

– Me desculpe Claudinho, mas não dá para acreditar!

– Do que está falando, Valdir?

– Essa história! – desfazia com a cabeça. – Um jovem tão crente assim. Quem ele é, Jesus?

– Há muitos como ele, meu amigo. Basta olhar em sua volta – Claudinho apontou para alguns jovens e o mostrou: – O calor está intenso e o sol como uma fornalha. Acha fácil usar terno? Eles poderiam usar drogas, assaltar, matar, mas trocaram suas armas por bíblias. Poderiam falar palavrões, mas glorificam a Deus. Poderiam se prostituir, mas estão aqui, sentido as virtudes do céu. Sabe o quão difícil é para um jovem ser cristão neste mundo de hoje?

– Tudo bem. Mas e o pai de Johnny? Destratar as pessoas porque não crê em Deus... Acha mesmo que alguém pode fazer isso?

– Essa é bem mais fácil. Basta olhar pra você... – Valdir ficou desajeitado, e calou-se. Claudinho concentrou-se no restante do testemunho. Ainda assim finalizou: – Eu te entendo, também fui assim. Até aquele dia ele me encontrou e me mostrou sua misericórdia.

O irmão que atendia tomou um copo d'água ali mesmo, e continuou a contar. Novamente a igreja voltou seus olhares para ele. Eles prendiam urina, ruíam unhas, trocavam de lugar, sentados ficavam de pé e de pé sentavam-se, e antes de continuar, ele comentou:

– Alguns podem não acreditar, mas eu conheci Johnny, e ele foi o maior exemplo de ser humano que Deus colocou na terra. Um jovem de bom coração, amável, igual não tinha. Também conheci Hermínio, e ele foi a mais irritante e arrogante pessoa em minha vida. Porém uma coisa ele tinha de bom: amava muito seu filho, e este mérito ninguém poderá tirar dele.


★ JOHNNY [DRAMA/CRISTÃO/CCB]Onde histórias criam vida. Descubra agora