— Por que dessa vez decidiu usar "Tess"? — pergunto depois de ver Ellie entrando no que penso ser a cozinha e estar distante o suficiente. Se Therasia se preocupa tanto em falar sozinha na presença de outros vivos, não vou atrapalhar.
— Porque Tess é muito mais comum que nome de ilha grega — diz sem tirar os olhos dos degraus, bastante distraída. Não consigo nem imaginar o que está pensando, mas não parece ser sobre o que estamos fazendo agora. — Muito mais fácil de ser esquecido. E para nossa mentira se manter em pé, acredito que quanto mais vaga for a lembrança dela de mim, melhor.
— Seu nome é grego?
— Nem sei — dá de ombros. Ela tira uma das mãos do bolso do casaco para afastar uma mecha de cabelo do rosto. Olhando para frente, acrescenta: — Aposto que nem pronunciamos certo; eu digo como meus pais acham que se fala. Eles são péssimos com línguas, mas gostam desses nomes estranhos. Ou como dizem, "estrangeiros", "exóticos". Blá-blá-blá. Eu acrescentaria "traumatizantes".
— Se não gosta do seu nome, por que não usa sempre um apelido comum? Tipo eu! "Ed".
— Mas eu ainda vou me lembrar do meu nome — contesta, a voz um pouco desanimado. Sobe os dois últimos degraus de uma vez só para adiar sua chegada ao fim da escada. Ela passa os olhos pelo piso superior com uma expressão interrogativa, enquanto me espera alcançá-la. A insegurança me impede de subir mais rápido.
Quando chego finalmente ao andar de cima também, ficamos parados no topo da escada lado a lado olhando em volta, meio perdidos. Todas as portas do corredor estão fechadas e são exatamente iguais, brancas sem qualquer diferencial. Nenhum de nós sabe qual escolher e tudo o que nos resta é arriscar. Pela falta de instruções, desconfio que Ellie realmente pense que Therasia já tenha estado aqui antes, significando que a mentira funcionou.
A primeira aposta é a porta mais próxima da escada, obviamente. Com um pouco de medo do que possamos encontrar, eu apenas observo de longe Therasia ir até lá. Ela espia o cômodo, mas fecha a porta mais rápido do que abriu.
— Quarto errado — anuncia em voz baixa, seguindo para a porta seguinte do lado esquerdo. — Eu me sinto como se estivesse invadindo sua casa mesmo tendo uma permissão.
Ela encara a próxima porta, dá uma olhada por uma fresta e então se volta para mim, assentindo. Com o sinal, finalmente deixo a escada e me junto a ela. Therasia abre a porta lentamente, ainda incerta da nossa escolha, embora eu acredite que encontramos o quarto certo. A demora da garota em executar um ato tão simples deixa minha curiosidade impaciente e me motiva a entrar primeiro. Eu simplesmente passo através da porta.
Do outro lado, ainda sozinho, apenas vejo um quarto meio vazio e impecavelmente limpo, não um quarto que fora meu. O estranhamento me incomoda. Poucos segundos depois, Therasia entra e fecha a porta atrás de si logo em seguida. Nós ficamos parados olhando o cômodo por um instante em silêncio, é como se estivéssemos esperando alguma coisa acontecer. Qualquer coisa.
Certamente não acontece nada, então, após alguns segundos de pura quietude, dou o primeiro passo. Observo tudo minuciosamente, tenho esperança de conseguir alguma coisa escondida na minha memória enquanto atravesso o espaço até a parede oposta à da porta. Infelizmente tudo ainda me parece desconhecido.
— Não me lembro daqui — admito um pouco frustrado, olhando pela janela fechada ao meu lado. Não há ninguém lá fora além de um homem passeando com seu cachorro do outro lado da rua. O cachorro é tão barulhento — ou o quarto é tão silencioso — que posso ouvi-lo ofegar daqui.
— Vamos achar algo mais significativo então — Therasia diz, indo até a mesa-de-cabeceira. Ela senta-se na cama sem lençóis e começa a vasculhar as gavetas. Ouço o som de canetas rolando e papéis sendo revirados.
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Ensoul
ParanormalO que aconteceria se um dia você acordasse e não conseguisse se lembrar de nada? Se apenas uma pessoa pudesse ajudá-lo? Esta é a história de Ed, um garoto que poderia ser normal - poderia. Mas ser amnésico e invisível nunca esteve na definição de...