Capítulo 29

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Despertei lentamente por conta da claridade que entrava pelas cortinas de tecido fino do motel de quinta. Resmunguei algo, escondendo meu rosto contra as costas de Nicholas, tendo em vista que aparentemente, eu tinha o feito de travesseiro.

Pisquei sonolenta e irritada por acordar justamente pela falta de conforto. O que custa colocar um blackout nesse galinheiro? Suspirei, e me remexi, a luminosidade bateu contra o ferro da algema em cima da mesa de cabeceira me fazendo sorrir.

Demorou um bom tempo pra gente se soltar. Primeiro, porque eu não achava a chave, segundo, porque estávamos nos divertindo por ficarmos presos a nossa brincadeirinha inocente.

O homem abaixo de mim murmurou algo inteligível, fazendo-me questionar como ele conseguia dormir com toda aquela luz.

Eu havia tendo problemas em meu sono, acordava com facilidade, nos últimos dias, meus pesadelos vem e vão, depois do último que tive, ele me vinha sempre a memória, algo dentro de mim, roía, se corroía. As pessoas mortas, muitas. Algumas que eu mesma matei, outras que convivi. Mas ver Charlie e Ivy mortos mexeu comigo, provavelmente por ele ser alguém que me mostrou uma realidade alheia a minha, como era estar com o príncipe que a menina que eu fui sonhou, mas Ivy, tão pequena, coberta de sangue, aquilo sim me deixou atordoada.
A visão me remeteu a Alison, minha irmãzinha, que eu venho protegendo de todas as formas possíveis, a perder a vida em meus braços, isso me assombra tanto que sinto dor.

Senti meu corpo ter uma vertigem ao relembrar. Minha irmã. E Nicholas, mortos, eram os mais frequentes. Os olhos dele, fixos, sem vida, o corpo sob a água avermelhada.

Respirei fundo, afastando essas imagens da minha cabeça, agarrando-me a ele, sentindo a sensação reconfortante de seu corpo quente contra o meu, ergui minha cabeça, e deslizei meus lábios por suas costas, distribuindo beijos pela extensão de sua coluna, podendo o ouvir sorrir contra o travesseiro, enquanto acordava.

Suspirei sentido o nó em minha garganta se esvair, ao ouvir esse som.

— Ainda é madrugada, demônio. — Murmurou, com a voz rouca pelo sono.

— Sinto muito, ursinho. — Sussurrei, e depositei um beijo em sua nuca. — Temos que ir. — Falei, perto de seu ouvido, e ergui meu tronco, sentando na cama, ele enfim abriu os olhos, e se virou de frente pra mim, com certa resistência ao ter que levantar, com o cabelo bagunçado caindo sobre a testa, e uma feição preguiçosa.

Parecia tão inofensivo.

— Você realmente conhece métodos de tortura. — Soltou ele, me fitando de um jeito engraçado, fixamente, meu rosto estava amassado, meus seios estavam a mostra e com certeza meu cabelo estava um verdadeiro caos.

E ele tinha sobre mim, total atenção, não era um olhar sexual, mas contemplativo. E isso, me deixou, sem ação, me fazendo revirar os olhos, mas sorrir em seguida. Eu estava nervosa?

Por que eu estava nervosa com Nicholas me olhando desse jeito?

Ele já havia me visto de todas as formas, me tocado de todas elas. Droga! O que esse bastardo está fazendo comigo?

— Você está vermelha. — Disse ele, do nada, para piorar minha situação.

Eu tinha corado como uma mocinha de romance de época?

— Cala a boca. — Rosnei.

Ele suspirou, e sorriu pra mim, daquele jeito, cheio de intenções, e se sentou ao meu lado, me olhando de esguelha. Ridículo.

— Para Nicholas! — Protestei.

— Não estou fazendo nada. — Disse com um sorrisinho implicante.

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