2° capítulo

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Pov-clarissa

A varanda da casa de praia é grande e espaçosa. Há quatro redes penduradas para que possamos sentar e conversar, exatamente como fazíamos, papai, Alec e eu nessa manhã quente de início de ano. Cada um em uma. Ao meio dia, o sol já está de ferver a cabeça, mas as sombras das árvores trazem um vento agradável de vez em quando.

Observo meu pai sentado, totalmente à vontade, com as pernas abertas, uma de cada lado da sua rede. Seu cabelo já está quase todo grisalho e as rugas se destacam no rosto cansado pelo trabalho desgastante. Meu pai ama o que faz! Mas sabemos que a medicina ocupa seu tempo, seu sono, sua vida familiar e social. Sempre magro e com poucos hábitos saudáveis, vamos combinar. Ele não é um médico de muitos bons exemplos. É um adorador de xícaras de café, não se alimenta corretamente e o cigarro está sempre entre os dedos enquanto não está trabalhando.
Alec não perde uma oportunidade de implicar com nosso pai sobre seus hábitos e não cansa de ouvir a mesma resposta: "Cuide da sua vida, menino!". E por causa disso, o Dr. Alec-consultor-de-índices-de-mortalidade vive dizendo que esses maus hábitos podem acabar com a vida dele. Meu irmão é chato com saúde, mas ele tem razão. Nosso pai fuma demais!
Ao contrário de papai, Alec dedica seu tempo aos estudos, ao trabalho, à alimentação saudável e à academia. É admirável a sua boa forma, com músculos definidos e uma pele ótima. Não há na cidade em que moramos, uma só menina que não caia de amores por ele. Cabelos e olhos castanhos , alto e com um sorriso de iluminar qualquer lugar que vá. Ele é focado no que quer e está solteiro, sim, mas sozinho nunca, que eu sei. Isso é fato.
O meu cachorrinho, Pingo, está com a gente na casa e deita embaixo da minha rede. Ele se arreganha todo, para que eu esfregue meus pés em sua barriga. Os pelos pretos estão crescidos e cobrem seus olhinhos, já pedindo por uma tosa.
Papai começa a contar uma piada que já ouvimos um milhão de vezes, mas rimos mesmo assim, para não deixá-lo sem graça. A risada dele é sempre mais engraçada do que a própria história. Foi nesse momento, que D. Rabugenta, ou melhor, D. Jocelyn , a minha mãe, entra indignada pela varanda. Estava dormindo e seu rosto está marcado pelos travesseiros. Dos olhos, saem faíscas e parecem, sem motivo algum, estarem mirados para mim.
- Que inferno! Não se pode mais dormir nessa casa!? - ajeita o roupão e me olha enfurecida. - Qual é o motivo de tanta graça?
Meu sorriso morre imediatamente. Como a minha mãe tem o prazer de ser desagradável! Olhamos para ela incrédulos, enquanto o drama particular continua.
- Passarinhos que não param de piar na minha maldita janela, risada estridente de Clarissa , dor de cabeça insuportável... O que mais posso esperar do dia de hoje? - ela fala sem parar, nem um pouco preocupada em ter respostas.
A minha mãe, às vezes, me desperta um sentimento que não gosto de sentir: pena. Como ela consegue ser tão repetitiva e vazia? Eu sei cada uma das suas falas, cada um dos seus dispensáveis comentários maldosos e cada uma das suas acusações em relação a mim. Estou tão cansada dela que nem tenho mais paciência para argumentar. Mas não posso negar que quando minha mãe aponta o dedo para o meu rosto, sinto arrepios pelo corpo. Ela me dá medo.
Ficamos em silêncio e deixamos que expresse sua raiva. Meu pai detesta discussões e Alec, muito menos. Canso de ver meu irmão deixar o prato de comida intocado sobre a mesa porque não aguenta as mudanças de humor dela a troco de nada. Dessa vez, porém, ele se dirige a ela, calmamente, tentando trazê-la de volta ao convívio de pessoas normais que sabem conversar.
- D. Jocelyn ... Que estresse é esse? - sorri forçadamente. - Não acha que já estava na hora de sair da cama? Já é meio dia! Temos mesmo que passar meus últimos dias de férias brigando?
Pronto. Falou e disse o filho querido. Alec deve ter tranquilizante nas palavras porque quase sempre tem efeito imediato nas crises da nossa mãe. Observo a sua postura de raiva se desmontar diante do questionamento do meu irmão.
- Desculpe, filho. A mamãe só está muito cansada e queria dormir mais um pouco. - se recompõe, endireitando o roupão. - Vou tomar uma ducha e aliviar a minha enxaqueca com um analgésico... - vira-se para meu pai. - Não aguento mais essa vida, luke!
Oi? Como assim? Como não aguenta mais essa vida? A vida dela é shopping, cabeleireiro, Spa, festas... Não é o que qualquer mulher gostaria de ter? Eu sou só uma adolescente, mas sinto que o que mais falta na vida da minha mãe é amor. Será que ela ama meu pai? Será que algum dia amou? Nem sei se a conheço, ao ponto de saber do que ela é capaz...
Almoçamos em silêncio uma hora depois da confusão na varanda. Bastiana preparou a minha comida favorita: bife com batatas fritas. Na hora da sobremesa, ouvi o pedido de desculpas forçado de mamãe. Mais um dentre muitos! Quieta eu estava, quieta eu fiquei. Izabele ao lado, parecia se coçar para me dizer suas gracinhas, mas se conteve. Ainda bem. Meu termômetro de paciência já está quase atingindo o seu grau máximo. Bom pra mim e... principalmente para ela. Faz tempo que minhas unhas não cravam aquele braço magrelo. Sorrio discretamente ao imaginar esse meu ato de violência. E tenho que conter uma risada ao lembrar de que ela se acha a gostosona! Sem comentários. Minha irmã, sim, consegue ser mais Patética do que eu. Patética com força.
À tardinha, volto à praia com meu livro nos braços, agora para ver o sol se pôr. Penso em nadar amanhã bem cedo. A água do mar sempre renova minhas energias e eu estou precisando exatamente disso.
Mergulho em minha leitura e viajo pelo mágico universo dos livros. Concentrada assim, nada é motivo para me estressar! O tempo passa e a noite começa a tomar conta do dia. As lâmpadas dos postes e das casas começam a se acender quase que ao mesmo tempo e, aos poucos, as luzes artificiais vão tomando conta da praia. As estrelas estão sobre a minha cabeça e eu me deixo levar pela beleza com que elas me presenteiam. Majestosa agora é a lua, que me convida a lembrar do amor que tenho guardado dentro do peito.
Como posso amar um homem treze anos mais velho que eu? Um homem que sempre me tratou como uma irmãzinha? Alguém que nem sequer deve mais se lembrar de minha existência?
Fico me lembrando da última vez que o vi, há quatro anos. Eu era uma menininha de nove, que o idolatrava. Suas mãos fortes me seguravam pela cintura e me rodavam no ar e eu sempre pedia de novo de novo de novo. E lá estava jace, fazendo todas as minhas vontades.
Guardo sua foto mais recente dentro do meu diário e levo aonde quer que eu vá. Nem preciso fechar os olhos para ver o seu rosto lindo. Os cabelos dourados e lisos, ombros fortes, mãos que me protegiam de tudo e todos e, claro, aquele par de olhos incrivelmente azul.
Seus olhos eram tão bonitos que eu podia fazer uma viagem sem volta neles, beber da imensidão de tons que o azul podia ter: quando ele estava feliz, quando ele estava triste ou preocupado... ou ansioso com alguma coisa. Eu podia, sim, beber desse olhar para sempre. E minha sede nunca passar.
Pode uma menina da minha idade amar desse jeito? Se pode, eu não sei. Mas tudo o que mais quero no mundo é que jace possa me amar e viver esse sentimento comigo no futuro.
Não sei se alguém suspeita desse amor que carrego dentro de mim. Um amor que chega a doer de tão forte. Eu nasci para amar você, jace! Volta para mim, volta correndo para mim.
Olho a lua e as estrelas e faço uma oração silenciosa







Desculpem a demora,imprevistos!
Ksksksks
Oque vocês acham que está por vir?

doce inocência (clace)Onde histórias criam vida. Descubra agora