Você se afasta,
Você é um homem despedaçado,
Você muda de opinião
E morrendo de vontade de apertar sua mão
Eu não espero que você entenda
Apenas continue dizendo para si mesmo
não é vergonha nenhuma— Kaleo, "Hot Blood"
O Palácio da Paixão era bonito por fora, como também era bonito por dentro, mas de uma maneira divergente. Pequeno, se comparado ao Palácio da Luz ou do Vinho, adequado ao status de um deus menor. E, mesmo assim, era infinitamente mais bem feito, rico e belo do que qualquer imperador da Terra almejaria possuir um dia. Não era alguma espécie de falta de luxo que dava-lhe aquela impressão de diferença, era o modo como era apresentado. Enquanto todo o interior do castelo possuía uma aura densa, sensual e pesada, cheia de cores intensas, aromas pungentes e obras de arte devassas; o exterior era estranhamente sóbrio. Ainda possuía linhas curvas, languidas e cores profundas, mas exibiam-se de um modo mais elegante e contido do que libertinamente descarado como lá dentro, um jeito tímido e quase frágil de mostrar aquela beleza arquitetônica. Como se o desafiasse a entrar e ver de perto para ter certeza. E Apolo se perguntou se isso não seria um reflexo metafórico do próprio dono, mas de um jeito invertido...
Certo, talvez estivesse devaneando muito, mas isso era culpa de Eros por deixar-lhe esperando tanto.
Dionísio sempre disse que ele tinha muito apresso pela educação. Apolo pensou, tentando não bater os pés de impaciência, do modo que Hermes fazia e o deixava louco. Começo a duvidar dessa afirmação...
Mal os pensamentos se formavam em sua cabeça e o portão principal, no qual esperava (im)pacientemente a alguns (muitos) minutos, começou abrir-se devagar. Estranhamente devagar. E quando Apolo esperou dar de caras com algum servo displicente, surpreendeu-se ao encarar a face alva e irritantemente perfeita do próprio Eros entre a fresta.
— Se eu lhe deixar entrar... — ele murmurou, fazendo da voz macia quase mímica. — Promete manter meu pescoço inteiro?
Apolo corou antes que pudesse evitar.
Havia acontecido tanta coisa em tão pouco tempo que Apolo já praticamente esquecera-se da última vez que viera ao Palácio da Paixão e como, inesperada e injustamente, havia dependurado Cupido pelo pescoço na sua própria sala de jantar. E é provável que o teria machucado seriamente as não fosse o irmão dele a interferir. Nunca lhe pedira desculpas por isso.
Talvez devesse... não?
— Eu prometo... — foi tudo o que pode responder no momento, o orgulho férreo ainda martelando na cabeça.
Eros deu um pequeno sorriso que Apolo estranhou, porque não tinha sarcasmo nem malícia, apenas uma diversão débil e contida.
— Nesse caso... — ele disse, abrindo de todo o portão. — bem-vindo ao meu humilde lar, Polly.
Dito isso, ele saiu caminhando calmamente para o interior do lugar, esperando que o visitante o acompanhasse. E Apolo agradeceu que estivesse de costas, pois não pode evitar o olhar de surpresa quase rude que manifestou a figura toda do seu anfitrião.
Eros estava... diferente.
Primeiro pela roupa. Pelo amor de Afrodite, aquilo era marrom? Eros não usava marrom! Era sempre rosa, vermelho, púrpura, roxo, lilás, magenta... cores lúbricas e sensuais, mesmo quando delicadas. Aquele tom terracota era até levemente avermelhado, mais muito mais apagado e neutro do que já o imaginara usando um dia, e isso o fez parecer mais pálido. Ou ele estava realmente pálido, Apolo ponderava, lançando um olhar médico a sua pele exposta. O que era muito pouco, diga-se de passagem. Aquela túnica feia, grossa e opaca o cobria até os pulsos. Certo, ela não era feia exatamente. Tinha um corte elegante e extremamente bem feito, a costura delicada e discreta. Ela apenas não... combinava com ele. E dava-lhe a impressão de uma massa corrida que, apesar de impecável e bem aplicada, cobria uma linda obra de arte. Nem seu belo e longo pescoço esguio escapara dela, mesmo que seu cabelo estivesse preso num coque alto e displicente, tirando seu aspecto languido e selvagem.
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Bacanal
Fantasy[Romance gay] [Mitologia grega] [Poliamor] Apolo e Eros se odeiam há quase tanto tempo quanto têm de idade, uma das rivalidades mais antigas do Olimpo. O deus do Sol humilhou o deus do Amor, que devolveu destruindo todos os relacionamentos e amores...