4 - parte 03

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DISPONÍVEL ATÉ 23/01.

A mão da minha mãe acaricia meu cabelo, enquanto minha cabeça repousa em seu colo. Como sempre, sua voz calma acalma minha alma.

— Há injustiças muito piores na vida, do que seu pai ter um restaurante badalado, filha. Há muitas outras injustiças. Isso não é nada. Deixa que ele tenha a vida dele, o dinheiro dele, isso não nos afeta — diz como se não doesse nela a traição, o abandono, o sufoco que passamos por anos quando ele simplesmente sumiu.

— É o seu dinheiro, não é justo, mãe! Ele ao menos deveria dividir uma parte disso com você, ao menos deveria devolvê-la o que você deu a ele — defendo minha mágoa.

— Mas aí é que está, filha. Eu dei o dinheiro a ele, ele não o roubou. Não foi um empréstimo, foi um favor. Logo, ele não tem que me devolver nada.

— O bom senso diz que sim. E para que você deu a ele todo seu dinheiro? Mãe, às vezes tenho vontade de segurá-la pelos ombros e te sacudir!

Ela demora um tempo a responder, mas quando o faz, não consigo encontrar nada de mágoa, acusação ou rancor em sua voz.

— Eu pensei que ele realizaria seu sonho, faria o curso que tanto queria e voltaria. Pensei que uma esposa na minha condição e uma filha pequena pudessem ser peso demais para ele. Eu era muito jovem e muito iludida, Sabrina. São tolices que cometemos por amor. Mas se não as cometemos, não aprendemos a lição.

— Eu não precisei cometer qualquer burrada por amor para saber essa lição. Seu exemplo me basta.

— Por falar nisso, o que vai fazer a respeito do seu chefe?

— O que eu poderia fazer? — De repente o aperto em meu peito volta e me sinto culpada por tê-lo magoado por nada.

— Se desculpar. Veja bem, você teve a mim para acalmá-la quando chegou em casa.

Pronto! Dificilmente ele foi até o apartamento da mãe ser acalmado. Dificilmente ele foi para qualquer lugar, senão sua casa, remoer tudo o que disse como confessou ter feito na outra vez em que fui grossa com ele. A diferença é que na outra vez ele mereceu.

Contrariada, levanto-me e visto um casaco, pego minha bolsa e ligo para minha melhor amiga.

— Você pode descer até a entrada do hospital e me ouvir por cinco minutos? — pergunto temendo não ser uma noite boa para ela.

— Por que você ainda pergunta? Eu levo o café?

— Claro! O seu, não quero esse sem açúcar do hospital.

— Você traz os pãezinhos então — ordena.

— Ayla, onde vou achar pães a essa hora?

— Se vira! A sessão de emergência é sua. Não funciono com fome.

— Tudo bem.

Volto para dentro de casa enquanto o motorista espera e pego os pãezinhos e bolo que mamãe já havia feito. Esses devem servir.


Enquanto quase congelamos sentadas em um banco frio na calçada, conto a Ayla tudo o que aconteceu desde que ela se mudou para esse hospital, exceto a parte em que acertei a vaca da Louisa, porque não quero ter que explicar o motivo de eu tê-la acertado. Ayla não precisa de nem uma grama a mais de peso além do que está carregando.

— Poxa! Você foi desnecessariamente cruel! — acusa.

— Eu sei disso, não é isso o que quero ouvir.

— Você foi má e muito babaca também.

— Ayla!

— Você tem que saber disso! Tudo bem, vá pedir desculpas a ele — ordena e volta a tomar o café como se tivesse me dito para fechar o zíper do casaco. Seus olhos pousam em mim e ela franze o cenho, fazendo um gesto com a mão para que eu me apresse.

DEGUSTAÇÃO - Quem disse que é amor?Onde histórias criam vida. Descubra agora