22. Não deixe que o que te machuca tome conta de você. Se sentir que tudo o que existe é ruim, crie um novo mundo, viva outras vidas, invente novas felicidades. Metáforas a parte, não aceite que as coisas bonitas se foram.
Eu queria escrever.
Mas tudo o que vem em mim é dor, e eu jurei pra mim que não dedicaria outra poesia para ela.
A dor não é um sentimento.
É um estado de espírito.
A dor não é palpável, mas eu posso senti-la me estrangular.
Os braços finos da dor dão três, quatro e cinco voltas em mim.
A dor suga meu ar e minha fome, e eu tento.
Mas a dor rouba a minha força também.
A dor é a minha companhia no frio.
Quando eu tento me abraçar - mas já não consigo.
Quando meu corpo treme, e eu falho - de novo e de novo.
A dor é o que mantém minha cabeça baixa nos corredores - não deixe eles te verem chorar.
Mas dói.
E a dor não é meu maior problema.
Nem a saudade.
A saudade é um tipo diferente de dor, ela queima.
Eu sei que saudade teoricamente não tem textura, mas juro que a minha é áspera quando ela passa pela minha garganta. - como quem volta pro amor que não ama.
Não tenho saudade das pessoas.
Tenho saudade de épocas.
Saudade dos sorrisos que eu dei.
Saudade dos abraços que não me esquentam mais.
Saudade das palavras que eu pensei em dizer, mas não disse.
A saudade me lembra das coisas e as faz sumir da minha mente em segundos.
Como se por um momento tudo estivesse bem denovo.
Mas passa.
E então, nunca aconteceu.
A saudade é o vislumbre que felicidade que eu nunca mais vou ver.
É o que foi - e não volta.
A saudade dorme comigo a noite - depois de horas sussurrando no meu ouvido.
"Acabou".
Mas não, a saudade não é a pior.
O pior é o ódio.
O ódio é a sombra atrás de mim que me impede de dar meu melhor.
É a pedra que me faz tropeçar no caminho pra casa.
O ódio é o vazio no meu peito, as partes minhas tão ocas quando grito que sinto elas tremerem e rangerem.
O ódio arde.
Ainda mais quando é de mim.
Quando eu sinto raiva de mim e as lágrimas descem ardidas nas minhas bochechas, eu o sinto.
Como quem me desafiasse.
Quando eu acordo e não quero acordar, a culpa é dele.
Ele se instala na minha garganta como quem achasse sua casa.
Permanente.
O ódio é o que me lembra que eu sempre vou estar sozinha - e que é isso que eu mereço.
E a culpa.
A culpa é a formiga que não me deixa dormir, contaminando cada parte minha, se mantendo no vazio onde meu coração estaria.
Ela se alimenta.
Ela cresce.
Ela é a mais perigosa.
Enquanto a dor, a saudade e o ódio vieram a mim, eu a criei.
Ela é minha.
E ela não vai embora.
A culpa sempre o acompanha.
Ainda me pergunto como vão haver lugar para os dois se instalarem em mim, mas acho que é mais fácil agora que não sobrou mais nada.
Sem amor, sem paz, sem coragem, o ódio, a culpa e a covardia cabem melhor.
É mais fácil pra eles se eu não lutar, mas quando eu luto é mais divertido.
Pra eles.
Eu quase consigo ouvir eles rirem quando eu finalmente desmonto, de novo.
E mais uma vez ao chão.
A dor no meu pescoço, a saudade na minha garganta e o ódio no meu peito.
Eu grito.
Mas o eco volta pra mim.
Como sempre.
Eu até queria escrever, mas não há mais coisas bonitas para se dizer.
Tudo o que era bonito eu matei.
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Para quem ama e chora
PoetryReunião de textos e poemas juntos a reflexões e conselhos para mentes confusas e/ou em conflitos com a dor. Para todos os que perceberam que a melhor forma de se vingar da dor é escrevendo poesias de amor para ela.