"O verdadeiro amor é como os fantasmas. Todos falam nele, mas ainda ninguém o viu."
-La RochefoucauldClaire Collins Montmorency
Cambridge, 1837
Dentro da carruagem, Claire inspirou fundo, frustrada. Tinha aproximadamente algumas semanas até a sua viagem para a Northumbria e ela não tinha encontrado nenhum vestido para usar em tal ocasião. A decisão repentina do Conde de Northumberland em fazer um baile por conta da volta de George Collins pegou o restante da família de surpresa.
Um mensageiro chegara às pressas em Whiterose House, em Cambridge durante a aurora, a fim de entregar a carta "urgente" a respeito. Segundo as normas vigentes da aristocracia, era de bom tom que eventos como bailes e saraus fossem avisados no mínimo a seis semanas de antecedência, para que as damas convidadas pudessem arranjar seus vestidos e fazer suas compras.
Claire permitiu-se relaxar por alguns instantes, observando a cidade. Ela amava o ambiente urbano e sua vida caótica.
De repente sentiu uma falta imensa de sua irmã mais velha, Daisy. Na última correspondência que elas trocaram, Daisy dissera que ela poderia aparecer quando quisesse na sua formosa propriedade em Claremont; ela e Andrew não se incomodariam.
Se a Srta. Montmorency pudesse, escolheria simplesmente jogar tudo ao alto e ir para lá. Ou então ir embora a Londres, viver em Dunbeigh Cottage com os primos Josh e Jacob. Mas não, isso era infimamente possível. Claire era simplesmente a aposta da família. Os seus pais tinham a plena convicção de que ela seria a joia da temporada dos saraus. Tais expectativas sobre ela eram tamanhas que ela se sentia sufocada o tempo inteiro, quase não havia espaço para outros sentimentos. Ela era superestimada, pensou.
Ir para longe de toda essa cobrança parecia o mais sensato a se fazer, porém exigia um plano meticulosamente bem feito. A única saída imediata para ela seria, bem... um casamento. Mas Claire queria sentir alguma emoção. Ela não pensava como a prima Victoria, que só se casaria com sua alma gêmea, mas a Srta. Montmorency desejava saber a sensação de se apaixonar por alguém.
Todos falam de amor, mas será que todos o sentem?
Claire ajeitou seus cachos loiros partidos ao meio e alisou seu vestido rosa outra vez, ansiosa. O tecido de algodão era o seu predileto e este era sem sombra de dúvidas seu vestido favorito. As mangas gigot começavam no ombro e se afunilavam no pulso, de modo que ela não sentia frio. E o traje ainda facilitava a sua locomoção, visto que ia até os tornozelos.
-Inspire fundo, Senhorita. -Aconselhou Nancy, a sua dama de companhia.
Nancy era uma presença constante em sua vida desde os seus doze anos e a Srta. Montmorency nutria um carinho afetivo imenso por ela. No entanto, ela gostaria de poder andar sozinha pelas ruas, sem alguém ao seu lado vigiando sua respiração a cada segundo.
-Não é possível. -Claire disse, mexendo as mãos nervosamente.
Ela sentia uma ansiedade incomum em voltar para casa. Ela tinha uma clara consciência dos privilégios que gozava na sociedade, mas sabia que seus limites eram tênues. Ela queria ser livre. Livre de expectativas, amarras e repressões. Liberdade, para Claire Collins Montmorency, significava ser capaz de fazer suas próprias escolhas e ter autonomia para seguir com a própria vida.
No entanto, ela havia nascido mulher. Então toda a sua vida tinha sido minunciosamente moldada pelos seus pais, sem direito à apelação. Qualquer mudança de roteiro seria dolorosamente punida.
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Amor e Ódio
RomanceA Família Collins é uma das mais importantes ao norte da Inglaterra no século XIX e chefia o Condado de Northumberland. Na grande propriedade de North Castle, vivem os irmãos Collins. Annabeth Collins, a caçula da família, é a antítese perfeita do q...