02. Rosas Não Sangram

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A minha mão era aquecida pela palma quente da mão de meu pai, e eu a segurava firmemente enquanto observávamos, em pé e lado a lado, as rosas caindo, uma a uma, sobre a madeira polida

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A minha mão era aquecida pela palma quente da mão de meu pai, e eu a segurava firmemente enquanto observávamos, em pé e lado a lado, as rosas caindo, uma a uma, sobre a madeira polida.

As pessoas pairavam sobre a abertura aberta na terra, jogando sobre ela rosas brancas que caíam sobre o caixão. A cidade sofria uma perda; mais uma entre milhares, mas sempre tem quem se importe, ou quem finge se importar.

Acontece que Elorai era querida por quase todas as pessoas que ela conhecia, pois, segundo o meu pai, ela emanava positividade para todos. Ele também me disse que ela era uma mulher muito inteligente. Talvez ele tenha dito essas coisas apenas para me tranquilizar e para que eu tenha uma boa imagem formada de Elorai, afinal ela era a minha mãe e morreu antes que eu tivesse a chance de crescer com ela para conhecê-la melhor.

Naquela tarde, o cemitério parecia um lugar carregado de energias ruins, e isso afetava todas as pessoas. Elas estavam tristes, e papai estava chorando. Eu também não me sentia bem, mas eu não chorei naquele dia. E enquanto as rosas caíam pela abertura no solo, eu estava atenta na figura que se aproximava entre a multidão.

Ela me encarou com seus olhos castanhos e sorriu para mim com seus lábios carnudos. Um sorriso entre uma multidão de lágrimas e lamentos. Eu sorri de volta, observando cada detalhe da desconhecida: desde sua aparência jovem – mas ainda assim alguns anos mais velha do que eu – até sua pele escura, seus cabelos castanhos e cacheados, e as covinhas que se formavam diante do seu sorriso.

Em suas mãos, ela segurava uma gérbera azul. Eu a observei jogá-la para o interior da cova cavada na terra, e a flor caiu em cima do caixão onde o corpo de minha mãe descansava. Eu me inclinei para observar mais de perto, uma gérbera azul em meio a incontáveis rosas brancas, e antes que meu pai me puxasse de volta para o teu lado, uma gota de sangue surgiu entre as pétalas de uma das flores.

Rosas brancas sendo tingidas com vermelho.

— Papai — eu disse —, as rosas estão sangrando.

Eu o encarei, e ele pairava sobre meu corpo pequeno e jovem, e enquanto eu olhava para cima para encará-lo, via também atrás dele o céu nublado daquela tarde fria de inverno em Londres.

Ele olhou de volta para mim, seus olhos estavam molhados das lágrimas, e disse:

— Rosas não sangram, Louise.

O sangue havia caído de minhas narinas. Meu nariz estava sangrando sem motivo algum. Papai disse que devia ser o frio, e limpou o sangue com um único dedo.

Quando olhei novamente para onde estava a garota do outro lado da cova, ela havia desaparecido. A gérbera também não estava mais ali.

Foi a primeira vez que eu a vi. Não iria ser a última.

Eu voltei a ter as visões dias depois, e na semana seguinte, e elas continuaram pelos anos que se seguiram. Visões dessa garota, de lugares que nunca visitei e de outras pessoas que nunca cheguei a ver, apareciam o tempo todo. Lembranças de coisas que nunca aconteceram de fato. Sonhos acompanhados de uma sensação intensa de se estar sendo atraída para algo ou algum lugar.

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