Ruinas

531 48 13
                                    

Selena foi ao mar apenas uma vez. Ela lembrava da sensação de ser acertada pelas ondas e continuar tentando nadar, havia aprendido a nadar ainda pequena, em rios, lagos escuros, mas o mar era diferente. Ele lutava de volta com vontade, era preciso ser mais forte do que ele para conseguir avançar e chegar na calmaria. E ainda assim, qualquer vento, poderia mudar tudo. Naquele momento, enquanto ela assistia Otávio caído no chão, desacordado, ela se sentiu novamente como aquela garota de oito de anos de idade que continuava sendo acertada pelas ondas, mas diferente da menina, ela não sabia se teria forças para continuar enfrentando.

-Selena. – A voz de Ulisses a despertou de seus devaneios. Ela ergueu os olhos e encontrou os do homem que amava. A preocupação visível através deles. – Você está bem? – Ele perguntou passando a mão no ombro dela. -Eu não consigo nem imaginar tudo que deve estar passando na sua cabeça agora, mas precisa ajudar o rei. – Ele diz mostrando o corpo imóvel ao seu lado. Eu não sei como ele veio parar aqui, mas...

-Não é ele. – Selena afirmou se aproximando. O rosto de Afonso estava pálido, os lábios brancos. Talvez a magia do feitiço fosse a única coisa mantendo Saulo vivo. – Esse é Saulo. – Ela disse colocando a mão no rosto do amigo. -E eu não sei se posso fazer alguma coisa por ele. Eu nunca curei ninguém, não sei se sou capaz disso, talvez a minha magia não sirva para coisas boas, talvez eu seja ruim, como ele. – Selena diz olhando mais uma vez para Otávio.

Ulisses pega Selena pela mão e acaricia seu rosto, colocando uma mecha do cabelo da arqueira de volta para atrás da orelha.

-Isso não é verdade. Você é boa, justa. Sangue não determina nada. Meu pai era o melhor guerreiro de Montemor quando tinha minha idade, eu sou no máximo medíocre com uma espada na mão, ele é um homem cheio de preconceitos e que acha que a única forma correta de fazer as coisas é a dele, eu gosto de pensar que sou diferente. O que eu estou tentando dizer é que sangue é só sangue. O que importa são os elos que construímos, as escolhas que fazemos. Além disso, eu conheço esse coração. – Ele diz colocando a mão sob o peito de Selena, tocando o colar que fora de sua mãe com a ponta dos dedos. – Eu sei que ele é bom e é por isso que eu te amo.

-Eu não sei o que fazer, Ulisses. Eu não tenho um livro de feitiços, nada, não sei como posso ajudá-lo.

-Você pode fazer feitiços sem isso. Fez agora pouco com Otávio. Apenas se concentre, pense no quanto quer salvá-lo. Apenas tente. E aconteça o que acontecer, eu amo você, certo?

-Certo! – Selena diz. Mas a verdade é que ela não tem certeza de nada naquele momento, talvez Ulisses possa mesmo continuar amando-a depois de tudo isso, mas Selena sabe que aquele momento vai deixar uma cicatriz eterna na forma que ela se vê - Mantenha seus olhos em Otávio. Ele pode acordar.

......................x......................

-Onde está Otávio? – Afonso perguntou apontando a espada para um dos homens de confiança do rei da Latrilha. Ele já o havia visto várias vezes trocando segredos com o rei, era aquele homem que sempre acompanhava Otávio em suas viagens ao conselho ou a outros reinos. O homem fica calado encarando Afonso com seus olhos escuros, então o rei de Montemor entrega a espada a um dos soldados ao seu lado e se agacha de frente ao homem. – Calado você não tem nenhum valor pra mim. E pessoas que não possuem valor passam o resto da vida nas masmorras ou acabam perdendo a cabeça.

-Como seu irmão? – o homem pergunta com um sorriso. Afonso sente uma onda de frustração se transformando em raiva e cerra os punhos. Ele pega uma adaga da bota e coloca o objeto contra o pescoço do homem apertando a lâmina ao ponto de uma pequena linha de sangue surgir.

-Eu posso mudar de ideia e te matar bem vagarosamente. O que acha? Me conte o que sabe antes que isso aconteça.

-Eu não sei onde o rei está, mas sei o que ele fez. Sei como ele e seu irmão armaram juntos para que você deixasse a rainha Catarina sozinha e ela se apavorasse para fugir. A denúncia de compra de mercenário, tudo aquilo, era parte de um plano.

Uma união políticaOnde histórias criam vida. Descubra agora