Ponto fraco

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Catarina nunca foi boa em perdoar, e havia notado que era pior ainda em esquecer. Mesmo tendo passado uma semana desde o julgamento de Rodolfo, Amália e dos lordes traidores, ela não tinha ao menos a capacidade de olhar para o rosto de Afonso sem se sentir nauseada. Tudo que ela queria era simplesmente conseguir esquecer e seguir em frente, sentia falta do marido, queria estar com o ele. Sentia falta de seu cheiro, de dormir entrelaçada ao corpo dele, de acordar com a barba de Afonso em seu rosto, mas na prática as coisas não era tão simples.

O pouco avanço que tinham feito ao se juntarem para desmascarar Rodolfo havia sido perdido quando o julgamento começou. Catarina queria que os traidores fossem executados, todos eles, sem exceção, mas Afonso não parecia disposto a fazer aquilo com o irmão. A rainha entendia o sentimento, mas disse que no lugar de Afonso teria ela mesma empunhado a espada e separado a cabeça do irmão do pescoço. Afonso, por sua vez, jogou em sua cara o fato de que ela não podia imaginar aquilo de forma concreta porque não tinha um irmão. Talvez ele tivesse razão, mas a vulnerabilidade que Rodolfo representava tinha que ter sido reparada.

Catarina podia citar em ordem cronológica diversas histórias sobre reinos que haviam perdido tudo ou pelo menos sido postos em situações terríveis pela falta de pulso de seus governantes. Ela temia que aquilo acontecesse com Artena enquanto o pai estava vivo e agora temia que acontecesse pela inabilidade de Afonso de aceitar o simples fato de que atos devem ter consequências.

-Qual a mensagem que isso manda para o resto dos lordes? Para todo os súditos? Que somos fracos! - Ela afirmou encarando Selena. Elas estavam, pouco a pouco, reconstruindo o laço de amizade. A arqueira havia justificado suas ações dizendo que havia descoberto pela boca de Rodolfo e que por isso não sabia que se deveria ou não acreditar, mas, principalmente, sabia que o irmão do Rei queria destruir a união dos reinos e não seria ela uma força em favor disso, mesmo que sem intenção. E Catarina realmente podia entender.

-Majestade, me desculpe, mas ainda o olharia da mesma forma se o rei Afonso fosse o tipo de homem que executa o próprio irmão? Banir Rodolfo, oferecer apoio a Lucrécia, é isso que um homem honrado faria. Eles cresceram juntos, Afonso é o irmão mais velho, é dever dele proteger o irmão, toda essa traição já deve estar sendo pesada o suficiente e ainda há a animosidade em vossa relação. O rei anda aflito, sem paciência, assim como vossa majestade. Então repito: acha mesmo, que passado o calor do momento, poderia deitar em paz ao lado de um homem que matou o próprio irmão?

Catarina não disse nada em retorno, em vez disso, ela deixou o salão e foi até o escritório do marido. Estava mais uma vez se sentindo trêmula e com um gelo no estômago, talvez aquele fosse seu novo normal. Assim que a viram os soldados que faziam a proteção do escritório a anunciaram, mas ela passou por eles e encontrou o marido sentado em sua mesa com Cássio a sua frente, provavelmente discutindo algo sobre as finanças de Montemor que finalmente estavam começando a se ajustar. Assim que ela entrou ambos a encararam.

-Cássio, pode nos deixar a sós? - Ela ordenou.

-Claro, majestade. - O conselheiro disse se apressando para deixar o local.

-Aconteceu alguma coisa? - Afonso quis saber curioso. Ele levantou da cadeira e caminhou até a esposa.

-Não. Quer dizer, nada sério. É só que eu percebi uma coisa. -ela disse colocando a mão no braço do marido. -Você é bom. E eu te amo mais do que eu já amei qualquer pessoa e isso me assusta. E é por isso que eu estou tão brava por toda essa história, porque eu não quero te perder Afonso, nem pra outra mulher, nem pra nenhuma guerra estúpida que seu irmão possa gerar.

-Catarina...

-Não, eu ainda não terminei. Eu estou tão brava com você, extremamente brava. Eu odeio o fato de que você deixou Rodolfo viver, mas eu entendo que esse é quem você é, que apesar de tudo você ama seu irmão. E acho que uma parte de mim também está com inveja por você amá-lo, ele é seu ponto fraco, mas eu entendo, eu realmente entendo o que você fez.

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