Capítulo 4

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Essa noite, pela primeira vez desde que me mudei para o Brooklyn, sai na rua. Esperei até a noite, e ainda que estivéssemos no começo de outubro, estava com um grande casaco com capuz que coloquei sobre o rosto. Envolvi um cachecol ao redor do meu queixo e bochechas. Caminhei colado aos edifícios, me virando para que as pessoas não me vissem, me escondendo nas ruelas para evitar me aproximar demais de alguém. Eu não deveria ter que fazer isso, pensei. Sou Jeon Jungkook. Sou alguém especial. Eu não deveria me reduzir a andar à espreitas nos becos, me escondendo detrás dos latões de lixo, esperando que alguém desconhecido grite: Monstro. Eu deveria estar com as pessoas. Ainda assim, me escondi e me agachei e andei às escondidas e por sorte passei despercebido. Isso foi o mais estranho. Ninguém me viu, nem sequer os que pareciam me olhar diretamente. Irreal.

Eu sabia aonde ir. Gin Elliot, da minha sala em Tuttle, ela fazia as festas mais populares na casa dos seus pais no SoHo quando eles estavam fora. Tinha estado observando-a no espelho, sendo que eu sabia que estariam fora este fim de semana. Não podia ir a festa – não como um desconhecido, e desde então não como eu mesmo, como Jeon Jungkook reduzido a nada.

Mas achei que talvez, só talvez, eu pudesse ficar fora da festa e ver as pessoas entrando e saindo. Podia observá-los do Brooklyn, claro. Mas eu queria estar ali. Ninguém me reconheceria. Meu único risco era que se alguém me visse, eu seria capturado, tratado como um monstro, talvez me transformasse em uma criatura de zoológico. Não era um risco pequeno. Mas minha solidão me fez afrontá-los. Eu podia fazer isso.

E ainda assim, as pessoas passavam perto de mim, pareciam me olhar, mas sem me ver.

Eu me atreveria a pegar o metrô? Eu me atrevi. Era a única forma. Encontrei a estação que tinha visto tantas vezes da minha janela, e de novo voltei com a ideia que iam me colocar em um zoológico e que meus amigos iam fazer excursões para me ver, comprei uma ticket de metrô e esperei o próximo trem.

Quando chegou, não estava abarrotado. A hora de pique tinha passado. Apesar de tudo, me sentei separado dos demais passageiros, pegando o pior assento na parte de trás. Olhei pela janela. Ainda assim, uma mulher de um assento próximo se afastou quando eu me sentei. A observei, refletida no vidro, quando passou para meu lado, segurando o fôlego. Ela parecia poder ver meu reflexo animal se tivesse olhado. Mas não olhou, simplesmente continuou, dando balançando contra os movimentos do trem, enrugando o nariz como se cheirasse algo desagradável. Ela foi para a parte mais distante do vagão para se sentar, mas não disse nada.

Então eu entendi. É claro! Fazia calor. Com meu casaco pesado e meu cachecol, parecia um indigente. Isso é o que eles achavam que eu era, as pessoas na rua e no trem. Por isso não tinham me olhado. Ninguém olhava para os indigentes. Eu era invisível. Eu podia caminhar pelas ruas, e enquanto mantivesse o rosto escondido, ninguém repararia em mim. Eu era livre, de certo modo.

Encorajado, olhei ao meu redor. Bastante seguro, ninguém me olhava nos olhos. Todos olhavam para seus livros, ou seus amigos, ou simplesmente... para o outro lado.

Cheguei na rua Spring e sai, não tão cuidadosamente desta vez. Abri caminho pelas ruas mal iluminadas, me ajustando ao cachecol ao redor do pescoço, ignorando a sensação sufocante, e ficando de lado. Meu maior medo era que Cristal me visse. Se ela tivesse cometido o erro de falar de mim para alguém, com certeza, tinham achado brincadeira. E, portanto, ela estaria ansiosa para me apontar, para que soubessem que ela não estava mentindo.

Cheguei ao apartamento de Gin. Lá tinha um porteiro, então eu não podia ir para o lobby. De qualquer modo, eu não queria, eu não queria lidar com a luz, os rostos, o fato de que a festa estivesse sendo celebrada sem mim, como se eu não importasse. Havia um grande jarro na porta. Esperei até que não houvesse ninguém por perto, então me deslizei para baixo, me deixando confortável ao lado dele. Um cheiro familiar encheu o ar, e levantei os olhar para as plantas. Will ficaria orgulhoso de mim.

A festa provavelmente tinha começado por volta das oito, ou mesmo às nove, os últimos estavam entrando. Eu olhava como se a festa fosse um programa de câmera oculta, vendo coisas que supostamente eu não devia ver, garotas tirando a roupa intima das suas bundas, ou tomando uma última dose de algo antes de entrar no edifício, caras falando do que tinham nos bolsos e que usariam mais tarde. Eu podia ter jurado que alguns dos meus amigos olharam para mim, mas ninguém me viu. Ninguém gritou: Monstro! Ninguém nem sequer parecia se importar. Tudo bem, mas ruim ao mesmo tempo. E então ela chegou Cristal. Estava com os lábios grudados nos de Sullivan Clinton, um dos garotos do último ano, em uma grande Pública Exibição de Afeto mostrado ante meus olhos como em um filme para maiores. Eles podiam fazer isso na minha frente porque eu era, mais uma vez, invisível. Comecei a me perguntar se talvez, na realidade, eu não era. Finalmente, entraram.

E assim foi como passou a noite. As pessoas vinham. As pessoas iam. Por volta da meia noite, cansado e com muito calor, pensei em ir embora. Mas foi então quando ouvi uma voz familiar a uns passos acima da minha cabeça.

– Uma festa selvagem, não é? – era Jimin.

Ele estava com outro antigo amigo meu, Kim Hart.

– A melhor – disse Hart. – Melhor ainda que a do ano passado. – Qual foi a do ano passado? – disse Jimin. – Provavelmente eu estou muito cheio de poeira para lembrar.

Eu me agachei ainda mais baixo, desejando que eles fossem embora. Então ouvi meu nome.

– Você sabe – disse Kim. – No ano passado, quando Jeon Jungkook trouxe aquela garota que ele passou a metade da noite com a mão nas suas calças.

Jimin riu.

– Jeon Jungkook, um nome do passado. O bom e velho Jungkook.

Eu senti meu sorriso e esquentei mais ainda no meu longo casaco.

– Sim, o que terá acontecido com ele? – disse Kim Hart.

– Foi para o internato.

– Acho que ele pensava que era bom demais para nós, não é?

Fiquei olhando para eles, especialmente para Jimin, esperando que ele me defendesse.

– Eu não me surpreendia – disse Jimin. – Ele sempre pensou que era bom demais quando estava aqui: o senhor – Meu– Pai-É– Do– Noticiário.

– Que idiota.

– Sim. Eu fico feliz que ele tenha ido embora – disse Jimin .

Afastei o rosto deles. Finalmente, foram embora.

Meurosto, minhas orelhas ardiam. Tudo tinha sido uma mentira – meus amigos emTuttle. Minha vida inteira. O que diria as pessoas se me vissem agora – meodiavam mesmo quando eu era bonito. Ainda não sei como cheguei em casa. Ninguémreparou em mim. Ninguém se importava. Kendra tinha razão em tudo.



Notas Finais!!

Apreciem, e comentem...

BeastlyOnde histórias criam vida. Descubra agora