Faz alguns meses que um amigo resolveu me oferecer o seus serviços como revisor. Ele quer começar na área e acredita naquilo que escrevo, não discuto sobre isso, aceito.
Ao ler um dos meus projetos, ele fica realmente frustado com a falta dos laços entre pai, mãe e filhos. E quando eu digo frustado, adicione a palavra possesso. Nossas reuniões acontecem de manhã, enquanto estou me trocando apressada para o trabalho. Desta vez, a reunião virou briga.
Ele já havia me falado que acreditava que este era um ponto a ser revisado no livro, devolvi a primeira revisão, a segunda, a terceira e nada de revisar a parte dos laços.
Foi ai que a briga começou. Ele me diz que eu deveria confiar nele, eu digo que não quero escrever sobre isso. Ele diz que eu deveria entender que um livro é uma obra de arte, mas que eu preciso ajuda-lo a ser mais comercial, eu digo que não mudo o que eu escrevo. Ele me diz que eu deveria deixar de ser burra e neste momento, eu começo a chorar. Até que eu respondo:
Eu sou incapaz de escrever decentemente sobre um relacionamento sadio e amoroso entre pai, mãe e filhos. Incapaz. Eu não sei o que é isso. Eu nunca vivi isso. Eu nunca tive isso. Entendeu agora?
Ele fica em silêncio enquanto eu choro no metro no caminho do trabalho. Então ele me diz:
Te busco hoje para tomarmos um café.A noite, ele vem me buscar e quando entro no carro, ele imediatamente me abraça pedindo desculpas.
Eu falo que está tudo bem. Ele pergunta onde eu quero ir. Eu pergunto se ele realmente quer que eu explique toda a história. Ele fala que tem certeza. Eu digo que vai demorar. Ele resolve parar na nossa cafeteria predileta mas não me deixa sair do carro.
Quando volta, está com o meu cafe favorito e alguns cookies e dispara: vamos ficar dirigindo por ai enquanto você me conta.E é aí que eu desato a falar sobre a relação conturbada com minha família, com minha mãe, irmãos, pai.
Em alguns momentos, ele respira fundo. Em outros, percebo que segura o volante com menos força. Tem momentos em que ele até olha para mim.Quando nos damos conta do horário. fazemos o caminho de volta para minha casa. Estamos do outro lado da cidade. Na volta ele conversa mais sobre assuntos diversos.
Quando chego na porta ele me fala:Ruth, você sabe que ignorar a figura do pai ou da mãe na história, vai complicar quando tentarmos mostrar essa história ao mundo, não sabe?
Eu respondo que sim.
Mas eu quero te prometer uma coisa garota, só vamos vender esse livro, para alguém que aceite não mudar isso. Porque essa parte é sua verdade também.
Eu concordo dizendo Amém.
Quando chego em casa, sou recebida por minha gata. Deitada com ela em cima de mim, eu admito. É dificil ser sozinha assim. Não ter pai ou mãe para ligar e pedir conselhos.Mas ai eu me lembro. Tenho minha tia, minha avó, meus amigos. Na falta dos originais, eles são os "pais" e "mães" que a vida me deu.
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Teorias do Imaginário #Wattys2016
PoesíaTeorias do Imaginário é uma coletânea de poemas, contos, sentimentos e sensações. É a tradução do olhar e sentir de alguém acostumado a andar pela linha que divide a fantasia, a realidade e uma dimensão que ainda não tem nome, alguém que fez um pact...