Capítulo 8

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Durante toda a aula de Geografia em que os minutos passaram se arrastando, Laura esteve preocupada com o estado de saúde de sua avó. Tentava ser otimista para seu próprio bem, caso contrário enlouqueceria de tanta impotência.

De fato aquele era um hospital muito conhecido, até mesmo alguém ela que não tinha quase nenhum acesso ao mundo exterior sabia. E se sua avó está internada lá, deve estar sendo bem cuidada. Pelo menos estava em condições de lhe escrever.

A turma estava lendo o texto pedido pela professora, mas ela estava lendo e relendo repetidas vezes a carta que havia recebido há poucas horas, tentando encontrar nela alguma pista, alguma salvação, algo que aplacasse a angústia.

Querida Laura,

Recebi seu recado por Carla ontem à noite e me senti muito lisonjeada. Ela me falou muito bem de você, que parece uma mocinha falando ao telefone. Em pensar que na última vez que a vi você era apenas uma garotinha emburrada.  Sinto não poder tido o prazer de falar com você. Sinto muito sua falta, espero ansiosamente por uma visita sua, assim que tiver um tempo nos seus estudos.

Obrigada pelas lembranças em meu aniversário, foi muito considerado de sua parte.

Atenciosamente,

Helena Linton, sua avó.

Algo assim só poderia ser escrito por sua avó. Nunca conheceu ninguém tão sofisticada quanto ela, nem mesmo nas revistas. A demonstração de afeto era um ponto fraco, mas Helena a amava à sua maneira. Pelo menos era o que parecia nos tempos em chegou a conviver com ela.

Parecia estar bem, mas Laura nunca poderia ter certeza disso. Helena era educada demais para preocupar alguém, sempre aparenta estar de bom humor e disposta. Até mesmo no velório de sua única filha não pareceu tão abalada quanto deveria. Foi só aí que Laura, mesmo tendo apenas sete anos, descobriu a fortaleza por trás dos requintes da sua avó.

Era uma pena que depois desse dia elas não se viram mais.

Laura desistiu da carta na oitava releitura. Ela era muito impessoal e não havia nem uma mínima alusão à doença, nem a saúde dela. A única coisa significativa que ali dizia era que seria bem-vinda para uma visita.

Porém sair do colégio era uma missão que ela nunca conseguira completar. Todo o terreno era cercado por muros altos e com cercas elétricas, e o portão principal tinha segurança reforçada que estava sempre de olho em tudo que era importante.  E se Laura conseguisse sair, o máximo que poderia fazer era vagar pelas ruas, já que não tinha nem um tostão. Nem mesmo para um ônibus municipal.

E se era difícil para sair de lá, para entrar era ainda mais impossível. Era registrada toda e qualquer pessoa que entrava na instituição, tendo que dar o nome e um papel com uma autorização para os seguranças que conferiam cada detalhe.

Só de pensar nisso Laura se agitava toda e apertava o lápis que tinha na mão tão forte que quase estava a ponto de quebrá-lo. Não parecia existir nada capaz de tirar aquela angústia de dentro de si. Somente uma coisa conseguiu fazê-la se esquecer por alguns momentos de tudo que se passava a sua volta. E isso era o abraço de Michael.

Ele era realmente um homem bom, e se preocupou com ela. A sensação de estar entre aqueles braços era diferente e difícil de explicar. Não era como a sensação que sentia nos abraços das freiras quando era menor, nem como abraçar seu antigo ursinho e nada comprado a abraçar o travesseiro. O abraço que Michael lhe dera tinha calor, que a fazia se sentir segura. E tinha cheiro de colônia, cheiro de Michael e fazia ela se sentir... Difícil de explicar.

***

Michael passou o resto do dia fazendo ligações demoradas e estressantes para os fornecedores de material de construções, madeireiras e casas de ferragens. Tentando estabelecer o menor prazo possível para a entrega. Apesar de ligações desse tipo o deixassem estressado, estava satisfeito com o curso que estava tomando seu trabalho, era muito importante para ele que dessa vez tudo desse certo. Precisava provar à sua firma, a seus subalternos e principalmente a ele mesmo (e para seu bolso) que era capaz de se reerguer e voltar a ser o profissional competente que foi há uns anos.

AgridoceOnde histórias criam vida. Descubra agora