Capítulo 13

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Eu olhei, esfreguei os olhos, pisquei, mas era mesmo verdade.

– Sabia que meu filho se chama Henrique também? E que foi a Maria Alice quem escolheu o nome? É porque ela sempre disse que ia se casar com um menino que se chamasse Henrique. Ela diz que é o nome preferido dela.

Quem precisa de inimigo quando se é filho da minha mãe? Tem coisas que só acontecem pra gente enterrar num túmulo e nunca mais lembrar. Meu Deus, ele não tinha que saber aquilo. E aqueles papéis em cima da mesa por um acaso eram fotos minhas de quando era pequena? Minha mãe não tem "senso de noção". Tinha foto minha pelada, de aparelho, de biquíni... Que desgosto!... Tá, que eu não ligo pra nada do que o Henrique pensa, mas também não exagera.

– Posso interromper as garotinhas?

– Qual é Ma, tô adorando conhecer sua mãe, quer dizer, nossa, porque eu já me ofereci pra ela me adotar.

Ele riu um riso tão sarcástico que, por um minuto, olhei com muito apreço pro jogo de facões da minha mãe e pensei no desenho lindo que eu podia esculpir na cara dele.

– Vaza, garoto! Minha mãe, minha casa. E por falar em propriedades, você está sentado na minha cadeira.

– Boa, isso são modos de tratar o menino? Rapaz bonito, gentil...

– Então quer dizer que seu apelido é Boa?

O Henrique estava pedindo pra gente fazer um número mágico imitando aqueles caras que engolem espadas.

– É que eu acho Ma muito feio, sabe, Henrique? Atrai coisas ruins. Prefiro chamar minha princesa de Boa.

– Ah, princesa... Sempre soube que você tinha algo de bom, mesmo que fosse o apelido.

Aquele olharzinho... teria troco, isso ele podia apostar.

– Então eu vou lá pra fora, tchau!

– Calma filha, eu fiz lanche!

– Dá pro seu novo melhor amigo, quer dizer, filho, né!

– Boa, não fala assim... Podem ir lá pro jardim que eu chamo vocês.

Minha mãe sendo gentil... O Henrique deve ter usado algum tipo de hipnose, porque não tem explicação. Sentei na grama e fiquei assoprando uns dentes de leão que estavam por perto. Eles me davam aquela esperança boba de fazer um pedido. No primeiro dia em que encontrei essas florezinhas diferentes, pedi minha vida de volta, mas agora eu só queria que aquela mudança valesse a pena. Então, no meu maior momento de reflexão, uma bola acertou na minha cabeça.

– AAAI!

– Desculpa, Boa, é que eu sou muito bom de bola. Ele riu até perder o fôlego, o que não era muito difícil.

– Você gosta de rir, Henrique?

– Gosto, por quê?

– Porque se você não parar de ser tão engraçado vou ser obrigada a arrancar todos os seus dentes, e creio eu que rir sem dentes não fica muito bonito.

– Cala a boca, eu sou lindo de qualquer jeito!

– Claro que é! 

– ironizei

– Calma, Boa, não precisa ficar com ciúmes da nossa mãe, você ainda é a princesinha da casa, HAHAHA!

– Me chama de boa mais uma vez que eu...

– Boa!

Fui tentar dar um empurrão nele, mas nós dois caímos, porque ele me puxou e meu sobrenome é Desastre, não podia ser diferente. Confesso que quem viu a cena de fora deve ter percebido duas crianças se atracando para decidir quem ganhou no par ou ímpar, mas não era bem isso que estava acontecendo. Ele me prendeu com força contra a grama, prendeu minhas pernas com as pernas dele e segurou meus braços de um jeito que me senti um gatinho lutando com um leão.

– Me solta!

– Admite que sou um ótimo amigo, se não eu não solto!

– Você não é meu amigo.

Então ele chegou muito perto do meu rosto... Eu conseguia sentir o coração dele batendo e sua respiração me fazia cócegas.

– Admite!

Entrei no jogo dele. Cheguei mais perto, a ponto de praticamente não haver distância entre nós e os nossos narizes se encostarem. Então ele afrouxou a mão, bem coisa de perdedor. Coloquei ele entre mim e a grama. Ninguém me vencia numa lutinha.

– Você nunca ia ganhar de mim! – Dei um soco de leve no queixo dele. – Você ainda tem muito o que aprender, garotinho.

– Eu te deixei ganhar.

– Eu finjo que acredito.

– RÃRÃÃM!

– Oi, é... mãe!

– E os modos, minha filha, e os modos?

– Eu só estava ensinando pra ele que ninguém perde pra mim numa lutinha. – Falei como se eu tivesse 7 anos.

– Isso é verdade, Henrique, a Ma nunca perde. Tendo que brigar pelo controle da TV com três irmãos, ela é quase uma profissional.

– Ah, tia, eu que deixei ela ganhar.

– Aham, acredito! Fiz uma torta e tem suco lá dentro. Vocês vêm comer?

O Henrique nem deixou ela terminar de falar e já saiu correndo feito um desesperado. Quando chegou na porta, ficou parecendo aqueles ratinhos guiados pelo cheiro do queijo. Foi engraçado.

– Minha mãe conquista todo mundo pela boca, cuidado.

– Ela já me conquistou, aliás, já me adotou.

– Isso tudo é vontade de entrar pra família?

– Não me enche, coloca pra mim... essa torta está com uma cara boa.

– Sua mão não vai cair se você se servir.

– Que vingativa.

– Você ainda não viu nada.

– Quer dizer que ainda vou ter chance de ver?

– Você tem o resto do feriado pra me provar que é o oposto do que eu julgo ser. Digamos que ainda faltam 60%.

– E o que eu ganho com isso?

– Uma estrelinha dourada na testa – ri, e completei– Nada, a não ser que amizades passem a ter valor pra você.

– Então quer dizer que agora você é minha amiga?

– Sessenta por cento, Henrique, só 60%.

Nem Todos Os Amores Se Chamam HenriqueWhere stories live. Discover now