Capítulo II

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− Victor, acabei de vir da praia e tirei estas fotos. Queres ver?

− Mostra lá. Puxa! Que espuma é esta?

− Também fiquei confusa... Já viste como o mar está violento? Estamos em pleno verão! Nunca vi tal coisa, aqui.

− Tens razão! Estranho.... Olha querida, vais então começar a arranjar-te para irmos? Eu já fiz a minha corrida no parque e estou pronto.

Meia hora chega-me, para tomar o chuveiro e preparar-me. O Francisco pediu para estarmos lá pelas doze horas. São ainda nove e meia. Temos muito tempo.

− Palavra? De acordo. Vou trabalhar um pouco no PC.

Depois de vários meses de tentativas em fazer funcionar o namoro, tinham chegado à conclusão de que se admiravam muito e se adoravam, mas seria mais saudável para ambos seguirem uma série de novos parâmetros, que até aí nunca tinham experimentado com outros parceiros, como por exemplo, não colocarem um rótulo na relação. Consideravam-se mais do que amigos, porém privaram-se de ter as "rédeas" presas como namorados. Outra ideia que adotaram foi a de viverem em espaços diferentes, encontrando-se quando lhes aprouvesse o que, na realidade, era quase diariamente, dado serem praticamente vizinhos. Finalmente, adotaram de braços abertos o favorecimento da liberdade, ao deixarem que o outro fosse completamente independente para levar a sua vida como bem entendesse.

Como estes três elementos que passaram a levar em conta, a situação de Isabel e de Victor tornou-se um quanto estranha para ambos no início, tão habituados estavam em controlarem e limitarem a vida um do outro. Todavia, não desistiram. Persistiram nesta diligência por sentirem saudades constantes quando não se comunicavam, vendo claramente que o encerramento da relação não podia entrar nos seus planos, embora o tivessem tentado nalguns momentos mais tensos. Alguns meses transcorridos, seguindo esta nova forma de viver em dupla, acabaram por verificar que confiavam integralmente no sentimento forte que sentiam reciprocamente. Esse era o pilar fundamental da relação, sendo irrevogável nos seus corações.

Tinham-se conhecido, por acaso, num lançamento de um livro de um autor amigo de outros amigos. Encantaram-se de imediato pela forma como a conversa fluíra, pois, logo à partida, agradaram-se mutuamente com pensamentos muito idênticos sobre a forma de agir e de usufruírem cada instante. Logo decidiram que iriam passar a fazer parte da vida um do outro, sem grandes impedimentos, tendo apenas os que são normais nos ajustes da personalidade entre pessoas de meia idade e com carácter forte as quais partilham intimamente o quotidiano. Os casamentos e os casos amorosos de ambos, posteriores aos divórcios, tinham contribuído para que ficassem desacreditados de namoros futuros, ansiando e desejando apenas a tranquilidade. Por esse motivo, na altura em que se conheceram estavam sós. Já não eram crianças, mas ainda sentiam o vigor da vida a ferver dentro deles. A atração sexual entre ambos não era tão exuberante como quando mais jovens e com outros parceiros, mas esta suposta falha não representava obstáculo no entendimento do par, pois nenhum deles era mais fogoso do que o outro. Amavam-se, eram irredutivelmente amigos e apoiavam-se nas vicissitudes da vida, num companheirismo que já durava cinco anos. Era comum os amigos repararem no bom relacionamento que ambos tinham conquistado.

Naquele instante, na sala da casa de campo dos amigos, Isabel conversava com uma jovem, da qual recebeu um elogio:

Vocês são um casal fantástico! Nunca se zangam?

Claro que sim! − respondeu, sorrindo e olhando pela grande porta envidraçada que mostrava um deck sobre um rio de forte corrente, onde se encontravam três homens sentados, de copos na mão, rindo e trocando piadas. – As rixas duram pouco.... Cortarmos a comunicação deixa-nos de rastos, por isso tratamos de resolver rapidamente as desavenças. Tanto eu como o Victor sentimos muitas saudades um do outro.

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