O Espelho - Parte 6

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Kakashi Hatake era, em essência, um homem sábio demais para seu próprio bem, mas essa característica era hereditária.

Sakumo o ensinou tudo o que sabia: desde como organizar a rotina de trabalho, suportar o caos do reino e não sucumbir à fome e ao cansaço, até todo o conhecimento que tinha e como buscar ainda mais.

Kakashi, aos sete anos, era um pequeno gênio, e foi aí que perdeu o pai. O laudo era de suicídio por enforcamento.

Kakashi tinha certeza de que não fora suicídio coisa nenhuma, e o pior era que o assassino nem tinha tentado esconder as pistas: o sangue em diferentes lugares da casa, o cabelo grisalho preso nas paredes junto com o sangue, os hematomas pelo corpo inteiro.

Kakashi não tinha forças e nem as ferramentas necessárias para buscar um culpado. Era só uma criança.

Durante cinco anos ele recebeu da Coroa um valor irrisório a título de assistência social. O dinheiro não era suficiente nem para o básico e ele perdeu as contas de quantas vezes achou que ia morrer de fome.

Ele sabia que era esquisito. Sabia que pensava coisas diferentes, sabia que conhecia coisas que outras crianças não conheciam, que era mais inteligente que a maioria. E preferia a ignorância. Trocaria tudo por nunca ter visto o corpo do seu pai. Por ter alguém que cuidasse de si, que não o deixasse convulsionar de fome.

Por ter alguém com quem conversar sobre como ele passou semanas lavando e lixando o sangue do chão e das paredes, sobre como ele pensou em cometer suicídio para ir para junto de seu pai até encontrar uma caixa debaixo da cama contendo centenas de bilhetes com a letra esculpida de Sakumo.

Poderia contar como leu todos em uma única noite, e sobre como se sentiu com cada um. Poderia contar o que o fez emoldurar e pendurar o último deles assim que pôde.

Queria contar sobre as coisas que descobriu, sobre os livros que foram deixados para ele ler, sobre a saudade excruciante. A solidão enlouquecedora.

Aos doze anos, começou a trabalhar e se sustentar. Quando finalmente fez amigos, não sentia mais vontade de conversar sobre nada.

Aos dezesseis, estável, sem qualquer resquício de emoção em sua expressão e sem qualquer sentimento em seu coração que não fosse um vazio, Kakashi escutou alguém bater à porta.

Na soleira havia uma cesta, cujo conteúdo estava enrolado em um lençol fino que não venceria a frieza da noite. Kakashi pegou a cesta e a levou para dentro de casa. Com o auxílio de luz de velas, viu que se tratava de um bebê. Kakashi morava em um lugar de difícil acesso na floresta densa, afastado da população, o que demonstrava que a escolha não fora feita ao acaso: alguém quis que fosse ele a ficar com o bebê. Ele, um órfão adolescente.

Precisou fazer a escolha de sua vida naquele momento. Daria para a adoção ou ficaria com ele? Foi quando sol que começara a nascer minutos antes iluminou o bilhete emoldurado como se fosse magia.

"Um dia a luz que vai acender de novo sua vida vai chegar. Não uma luz arrebatadora como o sol, mas soturna como a lua. Espero que você saiba reconhecê-la."

Kakashi encarou o bebê de pele pálida e cabelos escuros. O bebê mais lindo que já viu. Podia ser uma armadilha, mas quando o bebê estendeu a mão para ele, e ele viu aquele símbolo em sua pequena palma, não teve nenhuma dúvida.

E assim, como se por destino ou acaso, ficou com o bebê.

Nunca contou a Sasuke os termos exatos e detalhados sobre a morte de Sakumo, só das inconsistências entre o laudo da morte e a realidade dos fatos.

Sasuke também não sabia por que o deixaram na porta de Kakashi, que na época era só um garoto. Mas ele era grato. Grato porque, diferente do que muitos achavam, o coração de Kakashi era grande. Porque Kakashi mataria e morreria por ele sem pensar duas vezes. Porque Kakashi colocava Sasuke em primeiro lugar para todas as coisas boas e em último para todas as coisas ruins. Porque Sasuke não era do sangue de Kakashi, mas eles tinham o mesmo coração e eram feitos da mesma matéria.

O espelho, a espada e o escudo | SNSOnde histórias criam vida. Descubra agora