24 de abril de 2013
— Bom dia! — Ben disse sorridente, colocando os pães no forno. Nossa relação havia se estabilizado desde seu aniversário, mas não era mais como antes.
Havia uma tensão escondida nas entrelinhas de cada frase que trocávamos, não sabíamos ao certo o que era, mas estava ali, tornando o ambiente pesado e estranho. O ignorei, passei direto por Alice e Geórgia — esta fazendo tranças na loira — e saí de casa, encarando os trilhos no fim da rua. Eu era sempre a primeira a ir à escola.
Beldam é uma cidade pequena, tanto que se faz desnecessário a presença de linhas de transporte público, principalmente porque o trânsito é inexistente e os prédios são perto, exceto por Monte Félix, que ficava a vinte minutos em uma caminhada solitária por um caminho de terra quase devorado por completo pela grama alta. Os trilhos no fim da minha rua ligavam Beldam à cidade mais próxima e mais civilizada. Daqui saiam gado, legumes e verduras e de lá vinham todo o resto.
Devia ser umas seis e alguma coisa da manhã, os raios solares eram fracos e tentavam me animar acariciando minha face. Me direcionei rumo à escola, chutando uma pedra imaginária, quando de repente uma imagem específica preencheu minha mente e forçou minha parada, em frente à igreja, onde o padre varria a entrada. A foto.
A foto da mulher que se parecia tanto comigo, havia me esquecido completamente, mesmo que aquele fosse o pesadelo que me assombrava nos primeiros dias na vida que me deram. Nossa semelhança era macabra e a cada dia que passava só aumentava. Parando para analisar melhor, também havia certa semelhança no homem que a abraçava na foto e Benjamim. Eu sabia disso, lembrava daquela foto com perfeição, cada detalhe, até o anel de ouro e rubi no dedo dela. Assustador, pensei enquanto um calafrio me rondava.
— Está tudo bem, filha? Você está um pouco pálida. — Virei na direção da voz e encarei o padre preocupado, o som da palha da vassoura raspando o chão de ladrilhos interrompido.
— Está, não se preocupe — assegurei e voltei a caminhar. Estava tão acostumada a dizer que estava bem que a mentira passou a sair sem nenhum remorso ou peso na consciência.
Que simbólico, como uma predestinação. Foi isso que Tómas disse quando encontrou a foto, se isso for verdade e eu for uma duplicata da mulher da foto e Ben do marido dela… Não. Tolice. Não pode ser. Eu havia lido em algum lugar que existe uma pessoa idêntica a você em algum lugar do mundo. É isso, apenas coincidência. Repeti esse pensamento em voz baixa, transformando em um mantra que me acompanhou até o colégio.
Depois da aula, decidi ir até Monte Félix, especificamente ao lago. Precisava ficar um pouco sozinha, mesmo que isso me aproximasse do silêncio e me levasse a continuar a linha de raciocínio em que me perdi de manhã. Lá era um lugar pacato, mais que a cidade, fazia um friozinho gostoso e observar o gado pastando era uma ideia melhor do que voltar para casa, ou melhor, o lugar onde me acostumei viver.
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Se Essa Vida Fosse Minha
Misterio / SuspensoFlorence Campos tinha como objetivo primordial se divertir e aproveitar todas as atrações do novo hotel da Warrior Company, mas um suposto ataque terrorista pode levar seus planos por água abaixo e mudar sua vida para sempre. Sendo forçada a se sepa...