Capítulo 1

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25 de junho de 2008

        Eu encarava a porta de casa com afinco e determinação, eram oito horas em ponto e a qualquer momento a campainha tocaria. Ele está atrasado, pensei enquanto trocava o peso de um pé para o outro. O tic tac monótono e lento do relógio da parede acompanhava a batida incessante de meus pés.

Não havia mais nada para fazer, na verdade até tinha, mas eu, em meus 12 anos de idade, achava que esperar o carteiro era mais mirabolante do que responder questões de matemática.

Minha esperança, atrelada à  imaginação fértil de uma criança, cogitava a possibilidade de minha carta de Hogwarts estar entre as contas do cartão de crédito de minha mãe.

  —  Vá estudar, pestinha! —  Minha mãe ordenou de forma autoritária ao passar por mim com uma pilha de roupas bem passadas sobre as mãos, exalando o cheirinho doce do amaciante.

  — Mais tarde —  respondi com os olhos ainda presos na porta.

Minha mãe revirou os olhos e se dirigiu para seu quarto, aguçei os sentidos e a ouvi abrindo a porta do guarda-roupas, não que eu tivesse uma super audição, mas era inevitável não ouvir as batidas que ela dava nas portas para fazer o armário pré-histórico colaborar.

  — Ainda vou te quebrar em pedaços! —  gritou em promessa e a campainha finalmente tocou.

Abri a porta pronta para dar uma bronca no entregador sobre a importância de cumprir seus horários, porém assim que o vi desisti da ideia, o velho estava ofegante e um filete de suor deslizava de sua testa à bochecha, ele me entregou um punhado de cartas, acenou de leve com a cabeça e subiu em sua bicicleta, a caminho de outras residências.

Fechei e me afastei da porta meio triste pela cansativa vida que aquele homem aparentava ter, suspirei de leve e sentei no sofá de capa verde abacate — escolha de minha progenitora —  e olhei minuciosamente cada carta. Conta do telefone, conta do cartão, conta do cartão, conta do cartão, outra conta do cartão, convite da Warrior Company.

Convite da Warrior Company?!

Segurei a tal carta com mais força e joguei as demais sobre o sofá. Sim, minha mente brilhante não me pregava peças, o símbolo da empresa - uma mulher com cabeça de pássaro, melhor dizendo, uma valquíria - estava desenhado bem na frente ao lado do nome da companhia. A melhor, maior e mais famosa rede de hotéis do Brasil.

A correspondência estava endereçada à minha mãe, mas eu não aguentaria esperar até que ela terminasse de limpar a casa, sentasse na mesa da cozinha com seus óculos fundo de garrafa e lesse cada uma das cartas com indiferença. Então, tomada pela bendita curiosidade, rasguei o lacre e li:

Senhora Ravena Campos, você ganhou uma semana de férias, com tudo pago, no novo hotel de nossa companhia.

Eu não precisei ler o resto, eles já tinham garantido minha felicidade naquelas quatro primeiras linhas.

—  Mãe! —  gritei.

—  O que é?

—  Eu já sei pra onde quero ir nessas férias!

  — O quê?!

Corri até seu quarto, deixando as emoções aflorarem em minha pele e cegarem meus olhos, o que me fez tropeçar e esbarrar na parede do corredor estreito, mais um machucado para a coleção.

  — Olhe por onde anda! —  Mamãe repreendeu e fechou o armário em um baque alto e assustador.

Ela veio em minha direção, lançou um olhar demorado para o recente arranhão em meu ombro e eu lhe estendi o papel que me fazia saltitar e esquecer o ardor que o corte provocava. Ela tomou o convite de minhas mãos e ergueu uma sobrancelha:

Se Essa Vida Fosse Minha Onde histórias criam vida. Descubra agora