10 de julho de 2008
Os resmungos sussurrados de Roberto me tiraram do sono profundo e tranquilo onde me encontrava, o quarto estava iluminado por luz natural e eu podia ouvir as vozes de meus tios se mesclando ao longe. Joana, como era de seu feitio, estava advogando a meu favor, pelo menos foi o que entendi de acordo com o que ouvi enquanto fingia que ainda dormia.— Por favor, só mais uma chance! — apelou docemente e um suspiro alto e pesado de meu tio passeou pelo quarto.
— Uma chance — respondeu por fim. — Nada mais.
Seus passos foram se distanciando, acompanharam a batida na porta e sumiram no corredor. Continuei em inércia até sentir a cama afundar com o peso de Joana, que tocou meu ombro e puxou delicadamente um cacho meu:
— Sei que está acordada — cantarolou, sem ritmo e sem cadência.— Te conheço há doze anos, o suficiente para saber desse truque.
Sem relutância — e por que deveria insistir se havia sido descoberta? — levantei da cama devagar, sentindo cada músculo despertar e minha visão se acostumar com a claridade. As portas da sacada estavam abertas, permitindo que o sol, e todo o seu esplendor, entrasse e banhasse o lugar com luz quente. O sol poderia tentar ser um pouco menos convencido.
Sentei e encostei as costas na parede, Joana continuou me encarando. Mordeu os lábios, fechou os olhos, estava tensa e inquieta, dava para perceber pela forma que se balançava, de um lado para o outro, movimento impercetível para si. Como ela havia dito, nos conhecemos há doze anos, o suficiente para ela saber quando estou fingindo e mais que o suficiente para eu saber quando ela está ansiosa.
— Então? — instiguei, sempre após uma grande discussão, tomarei como exemplo a discussão da noite anterior, as coisas tendem a melhorar ou piorar.
— Então, eu falei com seu tio e o convenci a te dar uma segunda chance — disparou, sem pausa para respirar e embolando as palavras. Precisei de meio segundo a mais para entender. Segunda chance, foi a parte que mais me interessei. — Mas, porém, todavia, entretanto. Nós não iremos embora se você passar o dia todo de hoje sem incidentes.
É claro, como minha família tem um gosto peculiar por acordos, nesse caso não seria diferente.
— Você vai ficar de castigo hoje, apenas hoje. Se não aprontar nada, sai do castigo e ficamos. — Sorriu, e eu podia jurar que ela estava a um triz de bater palmas. Aquela, para Joana, parecia a melhor solução.
Eu abdicaria de um dia de diversão — porque castigo é, em qualquer lugar do universo, sinônimo de não fazer nada legal, ou seja, caso você ainda não tenha entendido, não aproveitar o hotel — e garantia nossa estadia pelos próximos quatro dias.
Sorri de volta para Joana e indaguei o que faria já que estava de castigo. Ficar no quarto o dia todo não era uma opção.
— Você é a Florence, vai pensar em alguma coisa — respondeu óbvia. Levantou da cama e foi até o armário do outro lado do quarto onde havia guardado nossas coisas, abriu as portas e começou a procurar uma peça de vestuário específica.
Mordi o lábio inferior com força, tanta força que só parei quando o gosto azedo e metálico de sangue agrediu minhas papilas gustativas. Eu havia ganhado uma segunda chance apesar de não merecer, Joana havia me defendido depois de eu quase ter jogado em sua cara que ela era incapaz de ter filhos, porque pelo tom de ódio com que falei a frase “ é por isso que vocês não tem filhos” a tradução perfeita seria “ vocês são incapazes de gerarem vida por serem chatos”
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Se Essa Vida Fosse Minha
Misteri / ThrillerFlorence Campos tinha como objetivo primordial se divertir e aproveitar todas as atrações do novo hotel da Warrior Company, mas um suposto ataque terrorista pode levar seus planos por água abaixo e mudar sua vida para sempre. Sendo forçada a se sepa...