Capítulo 4: Se preocuparam com o que não poderiam prever

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"Cada fracasso ensina ao homem que tem algo a aprender." (Grandes Esperanças - Charles Dickens)

Yarin sonhou que se encontrava na porta da biblioteca e Flora falava que ela nunca mais iria entrar ali porque perderá aquele livro e não devolveu os outros.

Enquanto Theodor sonhou com Amanda, sua ex-namorada. A menina ruiva estava em um jardim belíssimo em pleno dia. Corria até ele de braços abertos gritando: "Você me ama, Theodor? Diz que ama, porque eu nunca vou te deixar!".

O dia amanheceu e ambos passaram as horas pensando no momento em que iriam enfrentar a questão do livro perdido. Por mais que poderia parecer algo simples e sem tanta importância caso relatassem esse problema a outras pessoas. Para eles parecia uma questão quase de "vida ou morte". Tudo porque compartilhavam de uma preocupação com o que pensariam deles.

Yarin sempre se comportou de modo a agradar a todos. Já Theodor queria transparecer como aquele que não se importa com o que diziam sobre ele. Mas no fundo também buscava a aprovação dos outros.

Desse modo, estavam transbordando de ansiedade. Pensando no que iam dizer e qual as reações das pessoas que os ouviriam. Seria decepcionante se tudo desse errado. Como dava de vez em quando. Mas tinham que tentar, porque só assim saberiam o que iria acontecer.

Antes de sair de casa, Yarin pensou que seria melhor contar a verdade para Flora. Em vez de comprar um livro novo e tentar forjar o carimbo com assinatura na contracapa. Tudo para dizer que o objeto pertencia a Universidade Nacional de Seul. Concluiu que seria melhor ser honesta. Pediu coragem á Deus para fazer o certo, por mais que trouxesse consequências desagradáveis. Assim saiu de seu lar um pouco mais confiante. Com um estranho sentimento de paz brotando de seu peito.

Enquanto isso, Theodor estava em frente ao pequeno espelho de seu banheiro, ensaiando o que diria a garota que havia deixado o livro na parada de ônibus. Resolveu que iria à sala dela, pediria para conversarem. Em sua mente, até imaginou as reações que a menina teria.

Claro que Yarin ficaria um tanto assustada em ver aquele desconhecido querendo falar a sós com ela. Mas achou que não se sairia tão mal assim. Poderia não morrer de nervosismo! Caso ela se mostrasse temerosa em recebê-lo, não iria dizer nada relevante. Apenas diria que encontrou aquele livro há poucos dias e que dentro de suas páginas tinham informações de que pertencia a ela.

Pertencer. Essa palavra já fora dita todos os dias entre ele e seu antigo amor. Quando iam se despedir, ela lhe dizia:

– Eu te pertenço.

– E eu pertenço a você.

Usavam esta palavra para que não se esquecessem de que não importa o que iria acontecer enquanto estivessem separados, eles se pertenciam. Esse elo deveria ser o que os mantinha juntos. O que deveria bastar para que confiassem que sempre teriam um lugar para onde voltar: os braços um do outro. Pessoas que se tornam casas. Abraços que são lar.

Theodor fechou os olhos e sacudiu a cabeça. Não poderia continuar preso á Amanda. Precisava superá-la. Assim, no meio daquele nervosismo, claramente se esqueceu de como iria se apresentar a Yarin. Talvez o olhasse incrédula, dando um tapa em sua cara perguntando que maldita brincadeira era aquela. Sairia de perto dele o mais rápido possível.

Então ele voltaria para o seu apartamento, ligaria para alguma pizzaria e assistiria um episodio de seu desenho animado favorito: Naruto. Dando fim a explicação de que não foi por mal que estragou a capa de Grandes Esperanças. Na verdade, havia gostado tanto da história que gostaria de agradecer a ela por ter o esquecido.

– Isso é loucura! – riu para o próprio reflexo.

Theodor tirou coragem não sei da onde e entrou no ônibus rumo a Universidade. O veículo estava lotado. Havia só dois bancos livres no fundo. Esbarrando em algumas pessoas, foi até os assentos livres e acomodou-se. Colocou seus fones nos ouvidos e foi escutando uma música cristã que ouvia quando sentia que precisava de força interior. Também a ouvia porque se lembrava de sua irmã mais nova a cantando na praça da sua cidade antes daquele dia terrível. Sussurrava o refrão baixinho enquanto colocou suas mãos que suavam frio sobre o apoio do banco á frente.

O Livro Perdido de Yarin Davies (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora